São Paulo, domingo, 23 de outubro de 2005

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OLHAR EXTERNO

"Acesso à arma deve ser facilitado aos pobres"

IURI DANTAS
DE WASHINGTON

Autor do polêmico livro "Mais armas, menos crimes", o professor de Direito da Universidade de Chicago John R. Lott tem uma sugestão no mínimo curiosa para o governo brasileiro sobre o controle de armas na sociedade: em vez de banir o comércio, facilitar às pessoas mais pobres o acesso aos artefatos. Isso provocaria queda nas taxas de homicídios e crimes, segundo ele.
Depois de levantar suspeita sobre os números oficiais de mortalidade por armas de fogo, Lott insistiu em entrevista à Folha que o governo quer transferir a sua responsabilidade sobre segurança pública para um debate desnecessário, quando deveria centralizar esforços em melhorar as polícias e o cumprimento da lei.
 

Folha- O senso comum diz mais armas, mais mortes.
John Lott-
O Brasil certamente não mostrou essa relação. Só existe cerca de 3,5% que legalmente possuem armas no país. É muito pouco. Não há tantos países no mundo com uma taxa baixa como essa, mesmo assim, o Brasil tem uma das maiores taxas de mortalidade. No seu país, parece que quanto menos armas legais, mais assassinatos. Na Suíça, temos uma taxa de 70%. Nos Estados Unidos, 45%. Não consigo pensar em um país europeu com taxa menor que a do Brasil.

Folha- É razoável pensar que banir o comércio de armas vai reduzir as mortes?
Lott-
Temos muito poucas pessoas que têm armas no Brasil. E as que têm são relativamente afortunadas, para custear o registro, manutenção e todo o resto. Os mais pobres, que também são mais vítimas de violência, não têm recursos para manter armas. O governo deveria facilitar o acesso dessas pessoas. Nos Estados Unidos, a Pesquisa Nacional de Vitimização mostra que uma mulher tem 2,5 menos chance de sofrer violência se estiver armada. E os homens, 1,4 vezes menos.
A classe média brasileira tem menos chance de sofrer crimes. Vivem em bairros com muros, protegidos. Os mais pobres não pode pagar um guarda-costa, são os que mais se beneficiariam em ter uma arma para se proteger.

Folha- O referendo é inócuo?
Lott-
O governo na verdade quer transferir a sua responsabilidade. O que resolve é aumentar as penas de prisão, elevar as restrições, fortalecer o cumprimento da lei. Em 13 anos, o Brasil criou oito diferentes leis para controle de armas na sociedade e, durante todo esse período, as mortes por arma de fogo cresceram sem parar no país. Mais polícia, menos crime.

Folha- Depois da entrada em vigor do Estatuto, as mortes violentas caíram.
Lott-
Não acredito nesses números. Para as mortes terem caído cerca de 8% de julho a dezembro, seria preciso ter tido uma queda muito, muito grande. E isso é quase impossível de acontecer.


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