São Paulo, domingo, 20 de maio de 2001

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EXPOSIÇÃO QUE ABRE NESTA QUINTA MESCLA ARTISTAS NOVOS E PREMIOS HISTÓRICOS

Aperitivo de 2002

Divulgação
"Transit", trabalho de Regina Silveira, que consistirá na projeção de uma mosca em prédios de SP, durante a mostra dos 50 anos


DO FREE-LANCE PARA A FOLHA

A mostra que será aberta nesta semana no terceiro andar do Pavilhão Bienal (na quarta, para convidados; na quinta, para o público) anuncia uma comemoração e ao mesmo tempo ajuda a apagar a memória de uma derrota recente.
"Bienal: os Primeiros 50 Anos -Uma Homenagem a Ciccillo Matarazzo" não é uma nova edição da mundialmente celebrada Bienal de São Paulo, adiada sucessivamente para 2001 e 2002.
De dimensões mais modestas, a exposição com 34 propostas (veja mapa na pág. 16) em artes plásticas, design e arquitetura, todas de artistas brasileiros, faz uma espécie de preparação conceitual para a 25� edição, no próximo ano.
"Esta mostra foi pensada em função da nova data da Bienal. Porém, é tradição fazer exposições de qualidade nos anos intermediários, ou então a Bienal de Arquitetura. Algumas se tornaram até mais importantes que a mostra oficial, como "Tradição e Ruptura'", diz Carlos Bratke, presidente da Fundação Bienal.

COISAS PASSADAS
Apesar do que sugere o título, "Bienal 50 Anos", montada ao custo de R$ 3,5 milhões, tem mais caráter de balão de ensaio do que perfil retrospectivo.
Em seu espaço de 5.000 m2, apenas 700 m2 correspondem a um núcleo histórico, com 50 obras premiadas no evento. "Ao apresentar mais novidades do que coisas passadas, quisemos homenagear Ciccillo Matarazzo e ressaltar a vocação prospectiva que a Bienal deve ter", diz Bratke.
A proposta geral é integrar as linguagens das artes plásticas, design e arquitetura para sublinhar o caráter eminentemente urbano da arte contemporânea (discussão que vai permear também a 25� Bienal). As curadoras da maior seção, a de artistas plásticos, usam o título "Rede de Tensão" para expor "uma nova sensibilidade", que conectaria, no interior da megalópole, todas as linguagens, tribos e geografias do mundo atual.
Para dar conta desse "brainstorm" foram estabelecidas três curadorias, uma delas em parceria. Maria Alice Milliet, crítica e historiadora de arte, e Daniela Bousso, diretora do museu Paço das Artes, escolheram 20 artistas plásticos e trabalhos, em sua maioria inéditos, algumas vezes elaborados para a arquitetura onde serão vistos ("site specific").
Os praticantes de pintura, desenho, gravura e escultura tradicional deverão provar o gosto do limbo. No lugar dessas técnicas, há muita videoinstalação, instalação multimídia e fotografia, linguagens onipresentes nas últimas edições das principais mostras de arte do planeta.
Entre os artistas convocados, apenas cinco ou seis têm reputação consagrada, como Miguel Rio Branco, Ana Tavares e Rosângela Rennó. Outros consolidam carreira, e um terceiro grupo é praticamente apresentado ao público.
O trabalho emblemático do evento chama-se "Transit", uma "intervenção" da veterana Regina Silveira que projeta a figura de uma mosca gigantesca sobre as paredes de diversos edifícios em toda a cidade.


EVENTO, QUE CUSTOU R$ 3,5 MILHÕES, FUNCIONA COMO AQUECIMENTO PARA A 25� BIENAL


MATÉRIA VIVA
É aconselhável que o visitante se habitue a topar com nomes pouco conhecidos ou externos ao circuito principal de arte do país -como José Guedes (de Fortaleza) e Elyeser Szturm (Brasília). A experiência se repetirá no próximo ano, já que a seção brasileira da 25� Bienal será "inteiramente composta de novos", como adianta o curador Agnaldo Farias.
Sobre os semi-estreantes, a curadora Daniela Bousso afirma: "Hoje não é mais preciso ficar martelando o trio Hélio Oiticica, Lygia Clark e Mira Schendel. Passamos 15 anos nisso. Queremos mostrar uma matéria viva, coisa que nosso mercado de arte ainda incipiente raramente considera".
A partir do dia 28, haverá uma mostra simultânea no Paço das Artes, com 14 trabalhos (entre eles, instalações dos grupos Camelo, de Recife, e Casa Blindada, de SP). Lá, haverá oficinas de dança e música, além da projeção de um curta sobre a noite paulistana, dirigido por Sérgio Roizenblit.
Na curadoria de design, Marili Brandão chamou sete grupos e artistas para compor instalações que apresentam "fragmentos narrativos da realidade urbana". Nessa definição cabem do lixo -ambiente com caçamba idealizado pelo grupo de grafiteiros e tipógrafos Caminho Suave- ao luxo -os objetos falsamente utilitários da dupla Luciana Martins/ Gerson Oliveira.
O curador Pedro Cury propõe nove ambientes na disciplina arquitetura, buscando integração com as propostas vizinhas dos artistas plásticos e designers. Nessas instalações o espectador ficará de frente com "o drama de sua vivência na grande metrópole".
O núcleo histórico da exposição privilegia os estilos abstratos que tornaram a Bienal um fato novo na história das artes no Brasil. O recorte é proposto pela curadora Helouise Costa com uma seleção de 50 peças premiadas na mostra entre os anos de 51 e 63.
Essa datação corresponde ao período em que as obras premiadas eram automaticamente transferidas para o Museu de Arte Moderna de São Paulo, formando um acervo que depois seria doado por Ciccillo Matarazzo à Universidade de São Paulo e a seu novo Museu de Arte Contemporânea.
Além dos prêmios regulamentares do evento, ou "grandes prêmios", em que a Bienal adquiria a obra do artista, havia diversos outros, oferecidos por empresas e até por particulares.
Não existe documentação completa sobre as premiações na Bienal, o que exigiu da curadora um trabalho de pesquisa. Porém ela pôde se valer da documentação em torno de uma mostra do mesmo gênero realizada em 85, no próprio MAC, com curadoria de Maria Alice Milliet.
"A Bienal foi o grande foro da discussão sobre o abstracionismo no Brasil", diz Helouise. "Algumas obras premiadas na Bienal de 51, como "Unidade Tripartida", do suíço Max Bill, deram grande impulso à escola geométrica que se iniciara anos antes no país", observa a curadora.
A seleção do núcleo histórico está dividida em dois estilos abstratos: o geométrico ou construtivista dos primeiros anos da década de 50 e o abstracionismo informal, mais lírico e às vezes expressionista, que ganharia força extraordinária no mundo inteiro de 55 em diante.
Nesse último segmento, é de se estranhar a ausência do nipo-brasileiro Manabu Mabe, que exerceu grande influência sobre dezenas de pintores de alto nível. A razão dessa lacuna é que o MAC-USP não possui obras desse artista premiadas em Bienais. Entre os destaques da seção, há obras de Victor Brecheret, Maria Martins, Sophie Arp, Lygia Clark, Alexander Calder, Jesus Soto, Arthur Luiz Piza e Omar Rayo.
No mesmo espaço climatizado está montada a Linha do Tempo, parede de 50 metros com fatos históricos e artísticos, além de premiações e destaques em Bienais de 1951 a 2001. O desenho tridimensional dessa instalação é de Chico Homem de Melo.
(ALVARO MACHADO)


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