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Equilibrio

A sombra da vigorexia

Adolescentes pegam pesado na muscula��o arriscando a sa�de mental e f�sica

AMANDA LOUREN�O COLABORA��O PARA A FOLHA

A rotina do estudante carioca M.V., 15, inclui muscula��o seis vezes por semana e pesquisa di�ria na internet sobre exerc�cios e suplementa��o alimentar. Tudo para ficar maior e mais forte.

O adolescente pesa 78 quilos e tem 1,81 m. "N�o acho que 15 anos seja muito cedo para malhar. Quanto mais eu treinar, mais facilmente chegarei � meta." A meta, no caso, � aumentar o di�metro do seu bra�o de 39 cm para 55 cm.

A p�gina de M.V. no Facebook � igual a de muitos meninos dessa idade: cheia de fotos de corpos musculosos, frases motivacionais e chacotas com "frangos" ou "fil�s de borboleta" (jovens sem os m�sculos estufados, t�picos de quem vive em academia).

Estudo feito com 1.307 adolescentes e publicado no jornal americano "Pediatrics", em novembro de 2012, constatou que 90% deles se exercitam para ganhar m�sculos. A enquete foi feita em Minesota (EUA), mas os dados podem ser extrapolados todo o pa�s, diz a pesquisa.

At� a�, tudo bem. A quest�o, mostram estudos internacionais e locais, � que a insatisfa��o dos meninos com seus corpos est� em alta e, � claro, ligada � malha��o exagerada. Exemplo: em pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina com 641 jovens de 11 a 17 anos, 54,3% dos garotos se declararam insatisfeitos com sua imagem.

O educador f�sico Marcus Zimpeck observa a tend�ncia em academias paulistanas: "V�rios adolescentes que querem ganhar corpo exageram, mas nem se d�o conta".

NO ESPELHO

O hebiatra (m�dico especializado em adolesc�ncia)Alberto Mainieri, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, concorda: "H� um crescente exagero n�o s� na frequ�ncia do esfor�o muscular como na intensidade. N�o s�o mais casos isolados". Segundo ele, o excesso de treinamento nessa fase da vida � perigoso e pode caracterizar vigorexia.

"� um v�cio que vai aos poucos interferindo na vida social", afirma Zimpeck. O instrutor acha que o transtorno est� subdiagnosticado.

Quem tem o dist�rbio nunca se satisfaz com o corpo que tem e treina obsessivamente. "Muitos pesquisadores consideram a vigorexia um subtipo de dismorfofobia", diz o psiquiatra Celso Alves dos Santos Filho, do Programa de Aten��o aos Transtornos Alimentares da Unifesp.

A dismorfofobia � uma altera��o na autoimagem. No espelho, a pessoa se enxerga de forma negativa, o que n�o condiz com a realidade.

� o que relata o estudante G.P., 17: "Todo mundo diz que estou bem assim: ganhei 12 quilos de m�sculos em oito meses, mas, quando me olho, n�o gosto do que vejo. Em algumas fotos at� me acho mais forte, mas depois olho melhor e vejo que ainda falta muito". Ele pesa 70 quilos e quer chegar aos cem. "Mas, se ainda estiver ruim, subirei a meta para 109 quilos", diz.

G.P. admite que pensa nos treinos em tempo integral e que os amigos reclamam do seu novo h�bito. Ele se sente culpado se n�o puder malhar. "Se falto, penso que vou perder muito peso e n�o vou atingir nunca minha meta."

A vida social de G.P. tamb�m foi alterada pelos treinos: "S� volto para as baladas quando ficar mais forte".

O surgimento do transtorno nessa faixa et�ria � favorecido pelas altera��es f�sicas e psicol�gicas que ocorrem. "Adolescentes sentem necessidade constante de aceita��o, at� da apar�ncia. N�o � � toa que dismorfofobia e vigorexia t�m in�cio nessa fase", diz o psiquiatra.

A psicanalista Dirce de S� Freire, membro do C�rculo Psicanal�tico do Rio de Janeiro, v� nessa dedica��o ao f�sico uma demonstra��o de autodom�nio: "O adolescente abra�a a teoria de que o corpo pode ser moldado numa tentativa de controlar a pr�pria vida, j� que n�o pode controlar seu entorno".

O diagn�stico de vigorexia � dif�cil. A fisiatra Isabel Chateubriand, coordenadora da Reabilita��o do Hospital S�rio-Liban�s, diz atender pacientes com les�es causadas por excesso de muscula��o em um quadro claramente vigor�xico: "Explico ao jovem que est� treinando errado e tem transtorno de imagem, mas ele n�o aceita. O m�ximo que faz � mudar temporariamente o treino at� resolver o problema espec�fico da les�o que o fez buscar ajuda".

As consequ�ncias desses excessos s�o dif�ceis de prever. "A curto prazo n�o identificamos os malef�cios no corpo, pois aos olhos da sociedade o paciente � saud�vel, faz esporte. Se n�o fizermos os exames certos, nem saberemos que h� altera��es, j� que adolescentes t�m uma reserva de energia muito grande", diz Chateubriand.

D. D., 15, montou uma academia em casa e prepara suas s�ries sozinho: "N�o preciso de instrutor. Qualquer d�vida, consulto a internet", argumenta ele, que treina h� um ano, quatro vezes por semana, mas s� exercita a parte superior, por causa de uma cirurgia para retirar um tumor na t�bia, feita aos 11 anos.

A m�e de D. D. diz se preocupar com o filho: "Os jovens de hoje querem ficar muito musculosos. Acho perigoso ele tomar suplementos, mas D. n�o me ouve". A dieta proteica que ele segue foi escolhida com base em informa��es recolhidas da internet.

METROS DE T�RAX

Alguns dos adolescentes entrevistados para a reportagem pretendem participar de campeonatos de fisiculturismo, como I.C., 17, que acabou o segundo grau e quer estudar educa��o f�sica.

Ele treina os sete dias da semana e conta que seus pais n�o aprovam isso: "Eles dizem que se eu ficar maior vou ficar feio, mas discordo. Ficarei como me sentir bem; meu objetivo � chegar aos dois metros de t�rax", provoca.

O desejo de ganhar m�sculos em pouco tempo, passando por cima da gen�tica, leva jovens a recorrerem a anabolizantes, � l�gico --apesar de o tema ser tabu, mesmo para entrevistados protegidos pelo anonimato: "Desculpe, n�o falo sobre isso", diz I.C.

Zimpeck alega que a maior parte dos adolescentes que diz querer ser atleta de "bodybuilding" n�o sabe onde est� se metendo: "Desconhecem como � dif�cil ser fisiculturista, ainda mais no Brasil, onde n�o se ganha para isso".

G. P. nunca pensou em ser fisiculturista. Seu interesse � ficar mais atraente mesmo: "Acho legal chegar na escola bem grande e os colegas comentarem. Eu me sinto mais seguro. � um sacrif�cio, mas acho que vale a pena".

Para Chateubriand, adolescentes obcecados por m�sculos cumprem o papel social imposto a eles: "S�o fruto das nossas cren�as, est�o sendo coerentes. � preciso mudar o conceito de exerc�cio, de est�tica para sa�de".


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