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OPINIÃO ECONÔMICA
O subsídio à agricultura
MAILSON DA NÓBREGA
Com a recente investida da
bancada ruralista em prol do
perdão de dívidas bancárias de
agricultores, muitos se perguntaram se não havia uma certa
razão na demanda dos devedores. Afinal, se a agricultura é
subsidiada em todo o mundo,
por que não aqui?
No artigo de sexta-feira passada, critiquei os ruralistas e sua
proposta. Recebi mensagens de
elogios e irados protestos, incluindo agressões pessoais. É natural. O tema se presta a visões
emocionadas e impressionistas,
principalmente pela desinformação quanto à forma pela
qual outros países subsidiam a
agricultura.
Dessa vez, até o PT entrou na
onda, aliando-se ao deputado
Ronaldo Caiado, um dos mais
agressivos membros da bancada
e histórico adversário dos petistas. Pegou mal. O partido tentou
consertar o estrago de imagem
afirmando que seu objetivo era
beneficiar os pequenos e médios
agricultores.
Em entrevista à jornalista Dora Kramer ("Jornal do Brasil",
21/8/99), o deputado José Genoino (PT-SP) disse que seu partido
buscou "uma saída para a crise
da agricultura", além de "estender o diálogo do PT aos agricultores e a setores que tradicionalmente foram mobilizados pela
direita".
Genoino procurou ainda dar
um certo conteúdo ético ao seu
apoio ao perdão ao afirmar que
o PT "exigiu que ficassem de fora os devedores contumazes e os
que desviaram o dinheiro dos
objetivos do crédito".
Essa versão "light" tenta provar que o PT não teria embarcado em um trem de privilégios
nem votado com os ruralistas
apenas porque eles estavam
contra o governo.
A exclusão dos grandes devedores na sua versão da anistia
não elide o fato de o PT ter participado de uma articulação para
extrair benefícios do Tesouro.
Mesmo que seu apoio se restrinja a uma categoria menos favorecida, a atitude não é menos
criticável.
Poucos duvidam da necessidade de conceder algum alívio nas
dívidas de pequenos e médios
produtores adimplentes. Mas
muitos se esquecem, inclusive o
PT, que mesmo assim a idéia da
anistia é defeituosa.
Há milhares de agricultores
que não se beneficiariam de nenhuma das versões da anistia.
São os que se endividaram com
fornecedores de insumos, indústrias de beneficiamento e até
com agiotas.
Na verdade, no afã de cortejar
segmentos antes mobilizados
pela direita, o PT entrou nessa
história de perdão de dívidas
com a velha visão de que agricultura se subsidia essencialmente com crédito rural do governo ou com anistias.
Qualquer um sabe que a agricultura é subsidiada em todo o
mundo. Há inúmeras e justificáveis razões para isso. Nos EUA,
calcula-se que metade da renda
agrícola é explicada por distintas formas de subsídio governamental.
Na União Européia (UE), cerca de 50% do orçamento comunitário (já foi 65%) se destina a
programas de apoio aos agricultores, basicamente para sustentar níveis relativamente elevados de preços. É frequente a
compra da produção e a formação de grandes estoques, conhecidos como "montanhas" de
queijo, manteiga, carne etc.
Sucede que a Política Agrícola
Comum da UE beneficia todos
os produtores, e não apenas os
que têm acesso ao crédito rural.
Seu papel é eliminar incertezas
na comercialização, evitar os
efeitos das oscilações de preços
sobre a renda dos agricultores e
criar barreiras à competição externa (o Brasil é um dos prejudicados por tais ações).
Em viagens de estudo e em
contatos com autoridades, agricultores, especialistas e instituições financeiras, conheci de perto outras políticas agrícolas,
particularmente as dos EUA,
Canadá, Austrália, França, Inglaterra e Japão. Em nenhum
desses casos o subsídio creditício
foi erigido como centro das políticas agrícolas, como aconteceu
no Brasil.
O crédito rural a taxas de juro
inferiores às de mercado pode
ser encontrado em casos limitados, como os da "Farm Credit
Agency" (EUA) e do "Credit
Agricole" (França).
As políticas agrícolas modernas objetivam aumentar a produtividade, estabilizar a renda
do produtor rural e reduzir os
riscos a que está sujeita a atividade. O crédito subsidiado jamais será o instrumento adequado para gerar todos esses resultados.
A agricultura não precisa de
defensores de perdões nem do
retorno ao antigo crédito subsidiado, até porque isso não é justificável. Precisa, sim, de uma
política agrícola sensata e viável, associada a um novo sistema de crédito rural, para incentivar de forma sustentada o setor, aumentar sua produtividade, reduzir incertezas e juros e
promover os pequenos.
Felizmente, estão nascendo as
condições para construir mecanismos duradouros e confiáveis
de financiamento à agricultura,
o que comentarei em próximo
artigo.
Mailson da Nóbrega, 57, ex-ministro da
Fazenda (governo José Sarney), sócio da
Tendências Consultoria Integrada, escreve
às sextas-feiras nesta coluna.
E-mail: mailson@palavra.inf.br
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