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INTEGRAÇÃO
Possível entrada do país no bloco regional será decisão política, mais de apoio a Chávez, e não econômica
Venezuela quebrará a lógica do Mercosul
CLÁUDIA DIANNI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A adesão da Venezuela ao Mercosul como membro pleno, conforme anunciado pelo presidente
Hugo Chávez na Cúpula Ibero-Americana de Salamanca (Espanha), na semana passada, é uma
decisão política e não segue a racionalidade econômica dos processos de integração regional.
Se realmente entrar para o Mercosul, a Venezuela será o primeiro
país a participar de duas uniões
aduaneiras, já que o país faz parte
da CAN (Comunidade Andina),
com a Bolívia, a Colômbia, o
Equador e o Peru. Portanto terá
problemas com a diferença entre
a TEC (Tarifa Externa Comum)
aplicada em cada bloco.
Segundo a Folha apurou com
diplomatas brasileiros e andinos,
o anúncio é um gesto político de
apoio a Chávez, que está isolado
na CAN, já que Colômbia, Equador e Peru negociam acordos com
os EUA há mais de um ano.
As negociações dos andinos
com os Estados Unidos devem ser
concluídas até dezembro, quando
a entrada da Venezuela no Mercosul deverá ser anunciada, durante o encontro de Cúpula do
bloco, em Montevidéu (Uruguai).
"Chávez sempre manifestou interesse em ser membro pleno do
Mercosul, mas essa foi a primeira
vez que recebemos uma proposta
formal e vamos analisá-la. Há
vontade política para integrar a
Venezuela ao Mercosul porque isso vai ao encontro do projeto de
integração da América do Sul",
disse o embaixador José Eduardo
Martins Felício, subsecretário-geral da América do Sul.
Ele não quis comentar o acordo
dos andinos com os EUA nem
eventuais problemas políticos
que tal aproximação poderia gerar com os americanos, críticos
do governo venezuelano e o principal alvo dos freqüentes ataques
verbais proferidos por Chávez.
Os defensores de Chávez afirmam que o Mercosul acerta em
acolher a Venezuela porque os
EUA estariam tentando isolar o
país, um de seus principais fornecedores de petróleo, por causa do
estilo ameaçador de Chávez e do
controle que ele exerceria sobre as
instituições.
Os críticos afirmam que Chávez
está mais interessado em investir
os petrodólares que o país tem recebido, com a explosão do preço
do óleo nos últimos meses, na
compra de apoio na região do que
em reduzir a pobreza na Venezuela. Para esse grupo, o discurso
antiamericano de Chávez seria
um bode expiatório para consolidar um governo autoritário.
Neste ano, Chávez bancou cerca
de 70% dos custos da Telesur, um
canal de TV comunitária em conjunto com a Argentina, Uruguai e
Cuba, segundo publicou a revista
"The Economist". Ele também
comprou mais de US$ 400 milhões em títulos da dívida argentina e planeja comprar um velho
reator nuclear argentino.
Chávez montou a Petrocaribe,
para vender petróleo mais barato
aos países do Caribe, e propõe
criar a Petroandina, em parceria
com os vizinhos andinos, e a Petrosur, com Brasil e Argentina.
Para os críticos, os investimentos são exemplos da compra de
apoio. Para os defensores, são
ações para integrar a América Latina e promover a sonhada "Revolução Bolivariana" de Chávez.
Tarifas
Para Felício, as dificuldades que
o provável futuro sócio do Mercosul terá por causa da diferença entre as tarifas "é um problema da
Venezuela, que terá de resolver
com seus parceiros na CAN".
"Os países do Mercosul farão a
sua parte, que é analisar a proposta, receber a Venezuela e, se preciso, conceder algumas exceções
para que o país se ajuste.
O problema está justamente nas
exceções. De acordo com o diretor da Cepal (Comissão Econômica para a América Latina) no Brasil, Renato Baumann, o maior entrave do Mercosul são as exceções
à TEC. Ao incluir outros países e
abrir mais exceções, o Mercosul
poderá ir na direção contrária à
sua proposta -a de consolidar a
TEC para fortalecer o bloco.
"Ainda não há detalhes sobre
como será a adesão da Venezuela.
Se for um gesto político, não sei
como isso será ressaltado, já que a
Venezuela é membro associado
do Mercosul e, portanto, tem participação nos foros políticos do
bloco. Esse status não confere circulação de mercadorias livre de
impostos, mas apenas com preferências, e não prevê adesão à TEC.
A Secretaria da Comunidade Andina, em Lima, não comentou a
proposta da Venezuela, porque
ainda não recebeu detalhes.
Em tese, a TEC é um conjunto
comum de tarifas de importação
adotados pelos sócios do bloco
para as importações de terceiros
países. Essa proteção garante
acesso privilegiado no mercado
dos sócios, já que entre eles não há
tarifas e as importações de fora do
bloco são mais caras, ou seja, é
uma reserva de mercado.
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