São Paulo, domingo, 23 de outubro de 2005

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BOAS NOTAS

Menos endividadas, companhias brasileiras nunca estiveram tão bem posicionadas, dizem agências de classificação de risco

Empresas atingem sua melhor avaliação

MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL

As empresas brasileiras nunca foram tão bem avaliadas. Pelo menos não as que se sujeitam ao crivo das agências de classificação de risco. No último trimestre, elas passaram por uma onda de melhora nas notas atribuídas aos seus papéis, resultado previsível dado o crescimento das receitas, a elevação dos lucros e a redução no endividamento.
É difícil traçar um histórico das notas do conjunto de empresas avaliadas. O universo das companhias que estão dispostas a pagar para passar pelo escrutínio das agências cresceu. Não há histórico para uma boa parte delas. Mas, observa Ricardo Carvalho, diretor de corporates da Fitch Ratings, "dadas as condições que temos hoje, talvez seja o melhor momento das empresas".
Carvalho agregou o resultado de 50 empresas avaliadas pela agência. Os resultados: o Ebitda (sigla em inglês para lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização) do grupo cresceu de forma sustentada desde 2000. Chegou, em junho de 2005, a R$ 136 bilhões anualizados. A relação entre o caixa das empresas e a dívida de curto prazo, que era de 0,67 em 2002, chegou, neste ano, a 1,29. Traduzindo: o caixa é mais do que suficiente para pagar as dívidas de curto prazo.
Caiu a relação entre a dívida e o Ebitda, ao mesmo tempo em que o pagamento de juros ficou relativamente menor.
"As empresas têm a mais forte posição de caixa dos últimos cinco anos", afirma Carvalho.

Condições robustas
As empresas, diz o analista, têm "condições de liquidez mais robustas", ou seja, mais dinheiro sobrando para enfrentar dificuldades. "Algo que é importante em um país sujeito à volatilidade", ressalta o diretor da Fitch. A dívida em dólares diminuiu, o que torna as empresas ainda menos vulneráveis às oscilações do câmbio, completa.
Aloisio Campelo, coordenador de pesquisas econômicas da FGV (Fundação Getulio Vargas), lembra que a melhora não está restrita ao universo de empresas analisadas pela agência. Pesquisa da instituição com análise do balanço de 195 empresas brasileiras também detecta redução do endividamento e do pagamento de juros e aumento da rentabilidade e da receita das companhias.
A receita, medida pela mediana da amostra de empresas, aumentou 10,9% do primeiro semestre do ano passado para o deste ano. A rentabilidade subiu de 10% para 12%. O pagamento de juros caiu de R$ 16 bilhões para R$ 10 bilhões no mesmo período. "As empresas estão com mais recursos próprios", diz Campelo.
"As empresas estão mais integradas ao mercado internacional. A economia está mais estável. Dentro desse cenário, o retorno do investimento é razoável, ele melhora, e os "ratings" também têm que melhorar", diz Ingo Plöger, gerente de investimentos da Apex (Agência de Promoção de Exportações e Investimentos).
Por um lado, os resultados das empresas melhoraram. Por outro, sobra dinheiro no mercado de crédito internacional. O resultado só poderia ser uma melhora generalizada nas condições de financiamento. E, também, da avaliação de risco das companhias.
Logo após anunciar melhora da nota atribuída aos papéis do governo brasileiro, a Moody's elevou, na semana passada, as notas da CSN e da Votorantim Overseas Trading, subsidiária do Grupo Votorantim. A perspectiva para a Vale do Rio Doce foi alterada de "estável" para "positiva".
A Fitch, uma semana antes, divulgara uma lista com mais de uma dúzia de empresas cujos papéis emitidos em moeda estrangeira passavam a ter perspectiva positiva ou nota elevada. Pouco antes, a Standard & Poor's anunciava que os papéis da Vale passavam a ser classificados como "títulos com grau de investimento". Mas a qualidade do crédito, seja para empresas ou países, melhorou em todo o mundo emergente, relata a S&P. No trimestre passado, 2% das instituições analisadas pela empresa sofreram rebaixamentos, a menor taxa desde o segundo trimestre de 1996. O número de elevações supera o de redução nas notas há nove trimestres.
"As perspectivas no curto prazo para a qualidade de crédito ainda são positivas, com mais emissores do mercado emergente com viés positivo do que negativo, ao contrário do que ocorre no mundo desenvolvido", observa Diane Vazza, da S&P.

Especulação
Quase metade das 28 elevações do mundo emergente ocorreu no universo de empresas e países que a S&P chama de "segmento especulativo". Segmento, aliás, do qual fazem parte o Brasil e a maior parte das empresas brasileiras. Na América Latina, Brasil e México respondem por metade dos emissores analisados pela agência. Foi justamente o avanço na qualidade de crédito nos dois países que levou à melhora na região. O Brasil, revela o relatório, é o país com o maior número de emissores da região que podem se beneficiar de elevações do "rating".
Em relatório da semana passada, a Moody's mostrou que a melhora foi generalizada no terceiro trimestre deste ano. O número de elevações anunciadas pela agência no período foi 62% maior do que o de rebaixamentos. A taxa é maior do que a registrada no segundo trimestre, de 52%. A região em que ocorreram relativamente mais melhoras de notas foi justamente a América Latina, onde as elevações superam em seis vezes o número de quedas no rating.
A previsão da Moody's, no entanto, é que o ritmo de melhora deve diminuir a partir dos próximos trimestres. "De maneira geral, há mais revisões de rebaixamento ou de perspectiva negativa do que de elevação ou perspectiva positiva", diz Praveen Varma, vice-presidente da agência, em relatório divulgado há duas semanas. Mas, boa notícia para o Brasil e para os demais países emergentes, há diferenças grandes entre as regiões. A América Latina é a região em que, diz a Moody's, o número de empresas ou países que podem ter sua nota melhorada é maior do que o dos que podem ser rebaixados.


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