São Paulo, Segunda-feira, 20 de Dezembro de 1999


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CRISE
Profissionais desempregados irão passar seu primeiro Natal como vendedores de produtos nas ruas
Falta de empregos cria "neocamelôs"

da Reportagem Local

A crise econômica e o aumento do desemprego criaram uma nova classe de trabalhadores: os "neocamelôs", aqueles que tinham um emprego fixo ou uma atividade formal e deverão passar o primeiro Natal como vendedores de produtos nas ruas.
É o caso de Laerte Fidelis da Silva, 27, ex-eletricista da Eletropaulo, despedido em 1998 após a privatização da empresa.
Ele diz que fez um acordo com a ex-empresa pelo qual recebeu R$ 1.750, mais seis meses de cesta básica e outros benefícios.
Depois disso, Laerte passou cinco meses procurando emprego e, como não conseguiu, começou a vender óculos, bonés e tênis nas ruas de São Paulo.
Como eletricista, ele ganhava R$ 712 e, há quatro meses como camelô, sua renda passou a variar com o movimento de clientes, entre R$ 600 e R$ 800.
Laerte terminou um curso para eletricista residencial e espera encontrar um novo emprego com carteira assinada. "Prefiro subir em poste ou descer em bueiro a trabalhar na rua."

Dívida alta
Wilson Camargo da Silva, 30, já foi um bem-sucedido microempresário que revendia sucata industrial. Hoje, vende biscoitos em frente a uma universidade em São Paulo.
"De R$ 10 mil por mês, vi meu salário cair para R$ 1.000 depois que virei ambulante", diz ele.
A firma de sucata foi à falência há dois anos, depois que o sócio começou a desviar material, conta Wilson.
A vida da família Camargo da Silva mudou muito desde que Wilson foi para as ruas trabalhar como ambulante. A filha mais velha, que cursava inglês e francês, começou a trabalhar numa ótica. A mulher está procurando emprego em salões de beleza.
O vendedor de doces chega à porta da universidade às 10h e volta para casa às 22h. "Só nos finais de semana fico em casa porque não tenho outro ponto", diz.
Wilson quer voltar a trabalhar com carteira assinada mas não consegue arranjar emprego porque tem título protestado em diferentes cartórios da cidade de São Paulo. "Devo mais de R$ 100 mil e não tenho como pagar."
Ele fez um curso de instalação de PABX e está tentando conseguir uma nova colocação. No Ano Novo, Wilson vai estar vendendo cerveja na festa da avenida Paulista para reforçar o orçamento familiar.

Casamento
Adilson Saraiva Cavalcanti, 29, perdeu seu emprego de estoquista em uma metalúrgica há mais de um ano.
Ele e a noiva, Deli Regiane, 23, trabalham há oito meses em um trailer vendendo pastéis, sucos, refrigerantes e sanduíches.
A jornada de trabalho continua praticamente a mesma (das 7h às 17h), mas o salário diminuiu. Adilson ganhava R$ 480 como estoquista. Agora, ele e a noiva dividem escassos R$ 300.
"Meu irmão é nosso sócio, mas ele não ganha nada porque nós precisamos economizar para o casamento", diz a noiva.
O casamento está marcado para fevereiro e o casal pretende continuar morando com os pais dela, já que ainda não tem condições de alugar ou comprar uma casa.
Adilson está tentando arranjar um novo emprego. O ex-estoquista parou de estudar na 8� série do primeiro grau e desde então não fez outros cursos.
"Tenho procurado emprego todos os dias, mas está muito difícil porque as empresas exigem conhecimentos que eu não tenho."

Crescimento
Em São Paulo, mais de 1,5 milhão de pessoas trabalhavam nas ruas em outubro de 1999, segundo o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), um aumento de 79,2% desde que a pesquisa começou a ser realizada, em 1985.
Naquele ano, 8,7% dos ocupados da região metropolitana de São Paulo exerciam algum trabalho nas ruas, segundo a pesquisa do instituto. Em 1998, esse número subiu para 12,9%.
Segundo o Dieese, o número de autônomos sem equipamento próprio (classificação que inclui camelôs) passou de 1,526 milhão para 1,550 milhão entre dezembro de 1998 e outubro de 1999, com aumento de 1,5%.
Sérgio Mendonça, economista do Dieese, diz que o grande salto no aumento do nível de emprego no setor autônomo ocorreu na década de 90. (RSS)


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