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Estado financiou privatização e inibiu investimento privado
MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Empresas privadas na disputa
para conquistar clientes. A livre
concorrência pressiona os preços
para baixo. O interesse das empresas por novas oportunidades
de negócio gera investimentos em
distribuição e geração de energia.
Esse era o cenário ideal do governo quando desenhou o novo
modelo do sistema elétrico. Modelo que desenhou e ajudou a financiar, em parte, por meio de
empréstimos do BNDES a investidores e empresas que compraram
estatais, recursos obtidos no Fundo de Amparo ao Trabalhador.
Não deu certo. O modelo funcionaria, segundo o raciocínio de
quem o criou, se todas as empresas que atuam no sistema fossem
privatizadas. Nenhuma empresa,
por exemplo, poderia ter grande
capacidade geradora e distribuir
energia. Caso o fizesse, poderia
manipular o mercado.
O governo conseguiu privatizar
a maior parte das distribuidoras
(empresas que entregam a energia ao consumidor). Mas a privatização das geradoras emperrou.
Mais de 70% da energia gerada no
país é produzida por estatais.
As maiores empresas do setor
são federais: Furnas, Chesf, Eletronorte. Três grandes estaduais
não foram vendidas: Cesp (SP),
Cemig (MG) e Copel (PR).
Os planos de privatização começaram a ser delineados em
1998, quando a lei 9.648/98 determinou que todas as estatais do setor elétrico deveriam ser cindidas
e vendidas. A cisão era necessária
para evitar que o comprador ficasse com empresas que controlam geração, distribuição e transmissão de energia, o que lhes conferiria muito poder de mercado.
Foram criadas uma agência para regular o setor, a Aneel, e uma
empresa privada para monitorar
todo o sistema elétrico, o ONS
(Operador Nacional do Sistema
Elétrica). O ONS monitora diariamente o consumo de energia no
Brasil. Se falta luz no Sudeste e sobra no Norte, ele faz as transferências necessárias de energia.
A Aneel deveria ser uma agência independente cuja função seria zelar pelo bom funcionamento
do sistema elétrico, agindo para:
1) garantir o equilíbrio da oferta
e procura de energia elétrica;
2) dar concessões para construção de usinas, redes de distribuição ou transmissão;
3) fiscalizar as empresas;
4) regular o mercado de forma a
impedir que empresas cometessem abusos contra o consumidor;
Hoje, o governo controla praticamente todos os preços do setor
de energia. Com o novo modelo,
os controles serão eliminados
gradativamente. Hoje já existem
dois preços no Brasil: o da energia
"velha" e o da "nova". A energia
velha é aquela gerada pelas usinas
que já existiam quando começou
a implantação do novo modelo.
Na maioria ainda estatais, essas
usinas só terão o preço liberado a
partir de 2003 quando, espera o
governo, elas já serão privadas.
A energia "nova" é aquela gerada por novas usinas, implantadas
por investidores privados ou pelas estatais. Essa energia, cuja venda ainda não foi contratada, pode
ser vendida no mercado.
Para isso o governo criou o
MAE (Mercado Atacadista de
Energia), espécie de Bolsa de Valores onde empresas podem comprar e vender energia elétrica.
A intenção era que o MAE servisse de sinalizador e regularizador para o mercado. Assim, se começasse a faltar energia, os preços
subiriam no MAE. Isso seria um
sinal para investidores de que seria um bom negócio investir em
usinas, pois eles poderiam vender
energia a preços atrativos.
Com a entrada de novas usinas,
a oferta de energia subiria: os preços voltariam a se normalizar.
O governo, no entanto, não investiu em geração enquanto tentava, sem sucesso, privatizar suas
empresas. A Aneel não definiu regras claras para o setor e as empresas privadas não investiram.
Resultado: a escassez de energia
atropelou todos os planos de implementação do novo modelo.
Especialistas alertam que entregar as geradoras para a iniciativa
privada poderia ser um tiro no pé.
Os novos donos simplesmente
não investiriam porque prefeririam aproveitar e vender energia
cara em épocas de escassez. É a
chamada especulação de espera.
Eles aconselham o governo a seguir o modelo dos EUA: o país expandiu a oferta de energia com investimentos privados em termelétricas, que hoje geram a maior
parte da eletricidade consumida
nos EUA. As grandes hidrelétricas
do país continuam estatais.
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