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Decreto "antiinvestimento" pode ser revisto
Se plano der certo, governo vai reavaliar proibição à contratação de energia para novas fábricas, diz Pedro Parente
VALDO CRUZ
DIRETOR-EXECUTIVO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O ministro Pedro Parente, que
coordena a Câmara de Gestão da
Crise de Energia Elétrica, o "ministério do apagão", declarou que
o governo vai usar o "bom senso"
para analisar casos excepcionais
no programa de racionamento
lançado anteontem.
"Não somos dogmáticos, não
somos estritamente rígidos na
norma. Vamos ter toda a abertura
para avaliar questões especiais",
afirmou o ministro.
O ministro informou que o governo vai analisar a possibilidade
de rever a medida que proibiu a
contratação de energia para novos projetos industriais. Segundo
ele, se o programa de racionamento de energia apresentar sinais positivos, essa regra será uma
das primeiras candidatas à revisão.
Alguns pontos do programa
ainda estão indefinidos, como as
regras para a implementação do
corte de energia dos consumidores que não cumprirem a meta de
redução de consumo de energia
elétrica e os parâmetros que as
distribuidoras deverão seguir para as pessoas que não ocupavam
no ano passado o imóvel em que
residem hoje.
Parente fez questão de dizer, porém, que o corte de energia elétrica dos consumidores não é somente uma ameaça.
"É muito importante ficar claro
que quem não cumprir a meta estará sujeito ao corte." Segundo o
ministro, a alternativa a esses cortes seria "cortar todo mundo todo
dia".
Coordenador do "ministério do
apagão", o ministro da Casa Civil
criticou os políticos de oposição
que estão prometendo não cumprir as medidas do programa de
racionamento de energia.
Segundo Parente, eles estão demonstrando que têm "um tipo de
visão extremamente míope" e
continuam apostando no "quanto pior, melhor".
Os prefeitos petistas Marcelo
Déda (Aracaju) e João Paulo (Recife) ameaçam não seguir as regras definidas pelo governo Fernando Henrique Cardoso para reduzir o consumo de energia elétrica no país.
Parente reclamou também daqueles que estão ameaçando entrar na Justiça contra o programa.
"Infelizmente, entrar na Justiça
virou esporte nacional."
Parente gasta mensalmente cerca de R$ 200 pela conta de luz. Para seguir as regras que ele mesmo
definiu, disse que está providenciando a instalação de um sistema
de aquecimento a gás em seu
apartamento.
A seguir, trechos da entrevista
concedida à Folha anteontem à
noite.
Folha - O plano tem gerado algumas reações contrárias, como alguns prefeitos de oposição dizendo
que não vão respeitar as regras...
Pedro Parente - Bom, em primeiro lugar, gostaria de dizer que
para benefício do país essa não é
uma posição generalizada nem
sequer majoritária. O que notamos é um interesse muito grande
de participar e de contribuir. Em
segundo lugar, demonstra exatamente um tipo de visão extremamente míope, de pessoas que não
conseguem afastar o interesse
partidário do interesse nacional
maior. Estão naquela de que se é
ruim para o país, é ruim para o
governo. Eu acho que deveriam
fazer uma distinção. Não necessariamente o que o governo quer é
ruim para o país. Portanto essa visão precisaria melhorar um pouquinho.
Folha - Essas pessoas estão pensando mais no interesse individual
do que no coletivo. É isso o que o sr.
quer dizer?
Parente - Nós não estamos aqui
discutindo uma coisa que diz que
corta ou não corta. Nós estamos
discutindo como cortar, porque
corte tem de ter. Nós temos três
alternativas de corte. Um corte
generalizado, em que todos pagam. Ou um corte que dá condição à sociedade de contribuir,
buscar se administrar, para fazer
esse corte da melhor forma possível. Ou, por último, acontece o
corte porque o sistema pifa, entra
em colapso, o sistema cai. Nós
achamos que devemos dar à sociedade, às empresas, às famílias o
direito de tentar administrar isso.
Eles [oposição" não se preocupam com isso porque continuam
com a tese do quanto pior, melhor.
Folha - O ministro do STF Marco
Aurélio de Mello disse que a sobretaxa é uma forma de confisco...
Parente - Não sou um especialista na matéria, não ousaria contestar Sua Excelência. Seria um confisco se não fosse destinado aos
próprios consumidores. O que estamos fazendo é uma tarifa adicional que é devolvida aos próprios consumidores. Não estamos
vendo nessa situação nenhum
confisco. Mas temos a certeza de
que se a matéria for ao Supremo
teremos condições de fazer uma
boa defesa e Sua Excelência terá
condições de se manifestar nos
autos.
Folha - O governo não está preocupado com uma enxurrada de
ações na Justiça?
Parente - Veja, a situação que
nós vivemos hoje é grave. Procuramos não esconder isso da população. É preciso que seja entendida dessa forma também pelos órgãos da Justiça. Acreditamos que
isso vai acontecer. Liminares,
ações na Justiça, isso é uma coisa
que infelizmente virou um esporte nacional, acontece numa forma
muito além do que seria razoável.
Mas temos enfrentado situações
como essas, temos defendido as
posições do governo, perdemos
algumas, ganhamos a maioria.
Então, achamos que temos base
jurídica suficiente para enfrentar
essa situação.
Folha - Onde o governo errou para a situação chegar ao que estamos vivendo?
Parente - Olha, como já dissemos, não vamos entrar nessa discussão. O grupo não foi criado para explicar o passado, e sim para
tentar equacionar o futuro da melhor forma possível. Então, sem
fazer trocadilho, discutir o passado é perder energia.
Folha - O racionamento pode ser
estendido até março do ano que
vem?
Parente - Não se prevê isso, não.
O que temos de previsão, pelas
discussões, é que esse racionamento duraria até o início do próximo período de chuvas, em novembro ou dezembro.
Folha - E os impactos sobre a economia, crescimento do país, inflação, desemprego. Como vocês estão avaliando?
Parente - O máximo que a gente
consegue dizer neste momento é
que, ao permitir que cada empresa, cada família, possa administrar seu próprio corte, essa é a melhor forma de minimizar os impactos sobre crescimento, sobre
emprego. É o máximo que a gente
consegue.
Folha - As companhias vão ter estrutura para cortar energia de todo
mundo que não cumprir a meta de
redução? Muita gente não deve
atingir essa meta pelo menos no
primeiro mês.
Parente - Como eu disse, vamos
ter uma discussão no âmbito da
Câmara [de Gestão da Crise de
Energia Elétrica" na próxima semana para definir algumas diretrizes. Tais como: o corte vai ser
no dia em que recebe a conta, alguns dias depois. É compreensível que não tenhamos chegado a
esses detalhes, porque trabalhamos nesse programa de racionamento praticamente dois dias e
meio. Até porque não se consegue
antecipar todas as particularidades que existem na vida real. A
nossa disposição é dizer: "Olha,
não somos dogmáticos, não somos estritamente rígidos na norma, vamos ter toda a abertura para avaliar questões especiais, excepcionais". E vamos fundamentalmente usar o bom senso.
Folha - O governo pode flexibilizar o corte nesta primeira fase?
Parente - Não quero antecipar
nada, porque vai ser uma discussão que será feita na câmara. Agora, é muito importante ficar claro
que quem não cumprir a meta estará sujeito a um corte. Essa é a situação. Eu sempre digo, "procure
entender, não é que eu quero lhe
cortar, não é que o governo é
ruim". Nós estamos dizendo que
a gente precisa que isso dê certo,
precisa da colaboração para que a
gente não venha a cortar todo
mundo todo dia.
Folha - E quanto à regra que impede contratações de energia para
novos projetos industriais e comerciais? Há uma pressão para que seja revista. O governo pode mudá-la?
Parente - Olha, nós fizemos a
chamada freada de arrumação.
Precisávamos botar o pé nisso.
Não fazia sentido ligar mais gente
no sistema, pendurar mais demanda, quando ela não dá para os
que já estão lá. Agora, se a gente tiver uma evolução favorável, sentir que as coisas vão bem, não teremos nenhum problema em rever essa norma. Então, sem dúvida nenhuma, nós pensaremos em
fazer. Mas é preciso termos sinais
favoráveis. De graça, sem mais
nem menos, não. Agora, essa [regra" certamente é uma das candidatas à revisão.
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