São Paulo, domingo, 19 de março de 2000


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FUNDOS DE PENSÃO
Fundação dos funcionários do BB corre o risco de ter de vender bens para pagar aposentadorias
Previ teme a corrosão do patrimônio



"Temos um fluxo de caixa que permite pagar benefícios com sobra, mas logo não será mais suficiente"


FELIPE PATURY
da Reportagem Local

A Previ, o poderoso fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, pode deixar de ser o maior investidor do país em 2005. Hoje, tem R$ 32 bilhões de patrimônio distribuído nos negócios mais importantes do país. Em cinco anos, pode ter de começar a usar esse dinheiro para pagar aposentadorias dos associados.
O capitão da mudança é Luiz Tarquínio Ferro, que passou 18 dos seus 39 anos no banco. No fim de 1998, foi alçado ao comando da Previ. Seu antecessor, Jair Bilachi, deixou o cargo por ter concedido empréstimos ruinosos à Encol.
Ferro empenhou-se em tirar a Previ do noticiário, mas perde a luta. Briga pelo futuro da CSN e da Vale do Rio Doce, das quais é sócia. No caso Embraer, a Previ foi personagem da saída de Werner Brauer do Ministério da Aeronáutica. Tudo isso está nas mãos de Ferro.

Folha - A Previ continuará sendo o maior investidor do país?
Luiz Tarquínio Ferro
- Se se mantiver apenas como administradora do fundo de pensão do Banco do Brasil, pode perder a liderança. Os contribuintes vão-se aposentar e os recursos migrarão dos investimentos atuais para aposentadorias e pensões.

Folha - Em quanto tempo isso pode acontecer?
Ferro
- Em quatro ou cinco anos. Nesse tempo, vamos ter de mudar a ênfase do fundo. A importância dos dividendos crescerá, se comparada com as contribuições dos associados. Os dividendos serão mais importantes para pagar os benefícios. Nesse cenário, crescerá a importância relativa dos investimentos que nós já temos.

Folha - Quer dizer que o patrimônio começa a cair em 2005?
Ferro
- Depende da valorização dos nossos investimentos. O que se pode dizer é que em quatro ou cinco anos vai-se inverter a conta. Hoje, temos um fluxo de caixa que permite pagar benefícios com sobra. Daqui a pouco, nosso fluxo de caixa não será mais suficiente.

Folha - Não é possível prever o que vai acontecer com o patrimônio do fundo?
Ferro
- Ainda não temos uma visão precisa sobre em que momento ele começará a cair. Vai depender do Regime Geral da Previdência, que não está definido. Sabemos que os investimentos e a arrecadação previdenciária não serão suficientes para manter o patrimônio intacto, mas não quando isso vai acontecer.

Folha - Acabou a era dos investimentos? É um impasse?
Ferro
- Há outro cenário. A Previ poderá administrar fundos de pensão de terceiros, desde que não concorra com o Banco do Brasil. Acho que a Previ tem experiência e pode ser uma boa referência para terceiros.

Folha - Sem concorrer, vai vender planos para quem?
Ferro
- Prefeituras. O banco pode ser o vendedor, e nós, os administradores. Um município pequeno pode contratar alguém com experiência para montar um fundo de pensão. Temos de arrumar uma forma que seja harmônica, mas acho que tem espaço para as duas instituições.

Folha - A Previ comprou a Celpe (elétrica de Pernambuco) há um mês. É uma contradição para quem fala em pagar passivo.
Ferro
- Não, é estratégia. Já tínhamos a Coelba (BA) e a Cosern (RN). Vamos saneá-las, juntá-las numa holding e lançar ações dessa holding em três anos.

Folha - E como vão as negociações do setor siderúrgico?
Ferro
- Paradas. Com o Carnaval e a saída do (Andrea) Calabi (do BNDES), parou um pouquinho. Vamos discutir o assunto, agora, com o (Francisco) Gros (presidente do BNDES).

Folha - O senhor está saindo chamuscado pela reestruturação do setor siderúrgico?
Ferro
- Não. O problema é que são três instituições grandes (Previ, Vicunha e Bradesco), que nem sempre têm os mesmos interesses. Já estivemos nesse processo (a disputa pela CSN) em todas as hipóteses: ficando com os sócios atuais, sendo compradores ou saindo do negócio. A Previ se dispôs, sob condições, a fazer qualquer coisa para pôr fim à situação conflituosa. Isso não deve demorar, mas não falo em prazo.

Folha - A Previ quer a parte de Benjamin Steinbruch na CSN?
Ferro
- No ano passado, havia uma especulação de que o Vicunha seria vendedor. Eu os procurei e disse que a Previ poderia comprar sua parte. Nunca chegamos a fazer proposta. Só dissemos que queríamos contribuir com a reestruturação.

Folha - E aceita vender?
Ferro
- Isso depende de alguns elementos. Primeiro, o que aconteceria com a Casa de Pedra. É uma mina da CSN que poderia concorrer com a Vale. Ora, também quero defender o valor de nossa participação na Vale. Outra condição é desfazer o cruzamento acionário entre a Vale e a CSN. Casa de Pedra, participações cruzadas e preço: uma situação infernal. É ruim para a Vale.

Folha - A disputa pela siderurgia tomou um caráter pessoal entre o senhor e Steinbruch?
Ferro
- Não. Esse seria o pior dos mundos. Hoje, há uma situação de impasse em que as decisões estratégicas da siderurgia são tratadas pelo conflito de interesses. Mas isso acontece por causa de participações cruzadas. A Previ é sócia, por exemplo, da CSN e da Usiminas, duas empresas que competem entre si.

Folha - A Previ negociou o controle da Embraer na associação com os franceses?
Ferro
- Não há hipótese de transferirmos o controle para estrangeiros ou causar problemas ao Ministério da Defesa. Não temos a intenção de vender a Embraer. Só que, com a associação, ganhamos tecnologia militar e o mercado da Ásia. Não adianta ter só um bom projeto de aviação regional, que é o que tínhamos. É motivo de muita satisfação, mas não é o suficiente

Folha - Seu diretor de investimentos, Dercy Alcântara, foi afastado por causa de uma decisão da venda de ações do Itaú?
Ferro
- Quem nomeia ou pede a volta do diretor é o Banco do Brasil. E em nenhum momento o banco atribuiu a saída dele ao problema do Itaú. As ações subiram depois que vendemos, mas a decisão foi tomada três meses antes. Outra coisa: as ações foram a leilão. Se o preço era tão bom, por que outros não compraram?

Folha - As eleições de diretores estão interferindo nos assuntos da Previ?
Ferro
- Na condição de condutor do processo, prefiro não me pronunciar. Além disso, nunca passei por um processo eleitoral aqui e acho que a campanha ainda não começou.

Folha - Mas dois diretores da Previ são candidatos e divergem em público.
Ferro
- A referência deve ser ao Vítor Paulo (diretor de participações) e ao Arlindo Oliveira (diretor de planejamento). Nós temos diretrizes e políticas de investimento subscritas por todos os diretores. Se um dos diretores está preocupado com uma decisão do colegiado, deve devolver o problema à diretoria e apresentar uma solução.

Folha - O senhor é candidato?
Ferro
- (Risos) Não sou elegível. Sou indicado pelo banco. Enquanto acharem que eu sou necessário para tocar esse negócio aqui, fico. Eu gosto.



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