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LUÍS NASSIF
AmBev e a prova do pudim
O caso AmBev (a compra da
Antarctica pela Brahma) envolve
dois aspectos distintos: a intenção
da companhia de ganhar escala
para participar do jogo do mercado internacional e o receio da
concorrência de que a competição
seja destruída no mercado interno.
Ambos os aspectos são relevantes. É importante para o país dispor de uma companhia com dimensão internacional; e é igualmente importante a preservação
das condições de competição e
preços para o mercado interno.
Por isso mesmo, parecer competente sobre a fusão é o que procura conciliar os dois objetivos, não
o que prejudica qualquer um deles.
O tom arrogante e pouco político dos controladores da AmBev
contra o parecer da Secretaria de
Direito Econômico (SDE) -que
inviabilizaria a fusão- impede
que se perceba adequadamente
que, em grande parte, eles têm razão.
O caso da compra da Kolynos
pela Colgate -ambas, de capital
estrangeiro- foi exemplar. A
Colgate alegava que a compra era
fundamental para sua sobrevivência, para conquistar competitividade no mercado internacional devido às condições de produção da fábrica brasileira. A concorrência alegava tentativa de
controle do mercado interno. O
parecer do Conselho Administrativo de Direito Econômico (Cade)
foi pela aprovação da aquisição,
condicionada à retirada do mercado por cinco anos da marca líder, a Kolynos. As duas preocupações foram contempladas.
Esses mesmos cuidados devem
ser utilizados no caso AmBev.
Nessa atoarda de argumentos de
lado a lado, vamos imaginar
duas hipóteses: 1) Os planos da
AmBev para o mercado externo
são irrealistas, e visam ocultar
suas intenções de controlar o mercado interno. Ou 2) os planos são
realistas e, com capital da Coca
Cola, a Kaiser estaria tentando
torpedear a aliança da AmBev
com a Pepsi, para lançamento internacional do guaraná.
A maneira de resolver a pendenga é a prova do pudim. Tomem-se medidas que, sem inviabilizar a fusão, impeçam o controle do mercado interno pela
AmBev. Se suas intenções são efetivamente a conquista do mercado externo, a fusão será mantida.
Se, pelo contrário, for a conquista
do mercado interno e o aumento
de preços do produto, inviabilizando essa manobra a fusão das
duas empresas automaticamente
deixará de ser interessante para
elas.
Argumentos
No campo dos argumentos, a
Kaiser sustenta que não existe
mercado internacional de cervejas, e que o predomínio é sempre
de marcas locais -logo, as alegações da AmBev não se sustentariam. A AmBev explica que estratégias internacionais não se limitam a exportações, mas a acordos
operacionais de engarrafamento
e distribuição -e que seu produto para conquistar o mercado internacional é um refrigerante.
No plano dos preços, a AmBev
sustenta que vai ter ganhos de
produtividade que permitirão redução de preço. E que sua intenção é conquista de market share
-ou seja, de fatias de mercado.
A alegação da Kaiser é que, conquistado o mercado, sem competidores para refreá-la, a AmBev
passaria a praticar preços altos.
A AmBev sustenta que não há
fidelização a marcas e que o fator
preço é o elemento decisivo na escolha do consumidor. Mas o mercado de cervejas tem barreiras de
entrada reais: a rede de distribuição, a consolidação dos pontos de
venda, especialmente em um país
de dimensões continentais. Portanto, essa competição não é tão
transparente assim.
A arte do parecer do Cade vai
consistir em definir regras, recomendações ou imposições que assegurem a manutenção da competição no mercado, mas sem inviabilizar a fusão. Inclusive porque, a essa altura, significaria o
fim ou a venda da Antarctica a
grupos estrangeiros.
Tubaínas
Poderia se aproveitar o momento para SDE, Cade e demais
órgãos de defesa da concorrência
analisarem os métodos dos dois
rivais -AmBev e Kaiser/Coca
Cola- contra os fabricantes menores, especialmente a ofensiva
contra as tubaínas. Seria uma bela maneira de começar a viabilizar mais concorrência.
E-mail: lnassif@uol.com.br
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