São Paulo, domingo, 10 de abril de 2005

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ALIMENTOS

Empresas tentam reduzir teor de açúcar e sal de produtos e apelam a substâncias que enganam papilas gustativas

Indústria prepara novos aromatizantes

MELANIE WARNER
DO "NEW YORK TIMES"

Várias grandes empresas de alimentos e bebidas estão examinando um novo ingrediente na disputa pela preferência dos consumidores atentos à saúde: uma substância química que engana as papilas gustativas, fazendo-as sentir o sabor de açúcar ou sal, mesmo quando eles não estão lá.
A Kraft Food, a Nestlé, a Coca-Cola e a Campbell Soup estão trabalhando em colaboração com uma empresa de biotecnologia chamada Senomyx, que desenvolveu várias substâncias químicas, a maioria das quais não possui sabor, mas, em lugar disso, ativam ou bloqueiam receptores na boca responsáveis pelo sabor.
Com o acréscimo de um dos aromatizantes da Senomyx a seus produtos, os fabricantes podem, por exemplo, reduzir em entre um terço e metade o teor de açúcar numa bolacha ou de sal numa lata de sopa, conservando o sabor doce ou salgado original.
Hoje, por exemplo, uma lata de sopa de frango caseira Campbell's, segundo a empresa, tem mais de 2.300 miligramas de sódio. Esse teor provavelmente seria reduzido para pouco mais de 1.500 miligramas com o acréscimo da substância química (o governo recomenda que o consumo diário de sódio não exceda os 2.400 miligramas).
Diferentemente dos edulcorantes artificiais, os compostos químicos da Senomyx não serão listados separadamente nos rótulos de ingredientes. Em lugar disso, serão agrupados numa categoria ampla, a dos "aromatizantes artificiais", já encontrada nos rótulos da maioria dos alimentos.
"Estamos ajudando as empresas a enxugar seus rótulos", disse o executivo-chefe da Senomyx, Kent Snyder.
Sediada em San Diego, a empresa utiliza muitas das mesmas técnicas de pesquisa aplicadas por empresas de biotecnologia na criação de drogas novas. Executivos dizem que um receptor gustativo ou uma família de receptores na língua ou na boca são responsáveis por reconhecer cada sabor. A empresa afirma que, usando a seqüência do genoma humano, já identificou centenas desses receptores gustativos. Seus compostos químicos ativam os receptores de uma maneira que acentua o sabor de açúcar ou de sal.
Enquanto os especialistas em segurança de alimentos aplaudem os esforços para reduzir o teor de sal, glutamato monossódico e açúcar nos alimentos, eles expressam receios em relação aos compostos, dizendo que é preciso realizar mais testes antes que eles possam ser incluídos em alimentos vendidos aos consumidores.
Mas a Senomyx afirma que seus novos produtos são seguros porque serão usados apenas em proporções minúsculas.
A Kraft, a Nestlé, a Coca-Cola e a Campbell Soup já fecharam com a Senomyx contratos para o direito de uso exclusivo dos ingredientes em determinados tipos de alimentos e bebidas, embora as empresas tenham se negado a identificar essas categorias.
Elise Wang, analista da Smith Barney, disse que a Kraft pretende utilizar o aromatizante doce da Senomyx para reduzir em um terço o teor de açúcar de bebidas em pó como Kool-Aid.
Um porta-voz da Kraft se negou a dar informações específicas sobre a relação da empresa com a Senomyx, mas disse que a Kraft está comprometida com a idéia de reduzir os níveis de sal e açúcar de muitos de seus produtos. A Nestlé e a Coca-Cola também se negaram a comentar.
O produto da Senomyx que realça o sabor salgado possui o potencial de ser uma dádiva para a indústria alimentar. Há anos, cientistas de empresas procuram em vão maneiras de reduzir os níveis de sódio presentes em alimentos processados sem fazê-los perder seu sabor.
O Centro de Ciência no Interesse Público, de Washington, quer fazer com que a FDA (Food and Drug Administration, agência norte-americana que fiscaliza alimentos e remédios) preste mais atenção aos níveis de sódio contidos em alimentos embalados.
Snyder disse que os intensificadores de sal da Senomyx ainda estão em fase de desenvolvimento e levarão pelo menos dois anos para aparecer em alimentos. O produto mais avançado da empresa, disse ele, é um substituto do glutamato monossódico que, no mês passado, conseguiu a aprovação de segurança da Associação de Fabricantes de Aromatizantes e Extratos. Ele prevê que alimentos contendo o produto apareçam nos supermercados no primeiro semestre do próximo ano.

Substituto
Embora médicos e consumidores já reconheçam os riscos do consumo excessivo de sal e açúcar, o glutamato monossódico não é tão largamente visto como aditivo alimentar potencialmente perigoso. Usado como intensificador de sabor, ele é encontrado em batatas fritas aromatizadas, molhos, sopas em pó e produtos à base de carne.
Mark Zoller, cientista-chefe da Senomyx, disse que o produto que vai substituir o glutamato monossódico poderá ser usado também no lugar de outros produtos comumente usados para realçar o sabor de alimentos, como proteína vegetal hidrolisada e extrato de fermento autolisado.
Como os compostos aromatizantes da Senomyx serão usados em proporções pequenas (menos de uma parte por milhão), a empresa poderá passar ao largo do prolongado processo de aprovação da FDA necessário para levar aditivos alimentícios ao mercado. Para conseguir o status de "geralmente reconhecido como seguro" (simbolizado pela sigla Gras) da Associação de Fabricantes de Aromatizantes e Extratos, a Senomyx levou menos de 18 meses, incluindo um estudo de segurança conduzido com ratos, que levou três meses.
Michael Jacobson, diretor-executivo do Centro de Ciência no Interesse Público, confirmou a capacidade dos produtos da Senomyx de reduzir o teor de sal, açúcar e glutamato monossódico de alimentos, mas aconselhou que não seja autorizado o ingresso de um novo composto químico nos alimentos sem que tenha sido submetido a testes rigorosos. "Um estudo de apenas três meses é totalmente inadequado", disse.
Segundo informações registradas na SEC (Securites and Exchange Commission, equivalente americana da CVM), Kraft Foods, Nestlé, Coca-Cola e Campbell Soup, juntas, já pagaram à Senomyx US$ 30 milhões para financiar a pesquisa e o desenvolvimento dos produtos. Quando os aromatizantes forem incorporados a alimentos, a Senomyx disse que cobrará royalties de 1% a 4% sobre as vendas dos produtos.
Embora a empresa ainda vá levar vários anos para começar a apresentar lucros, o preço de suas ações quase dobrou desde que ela abriu seu capital, em junho passado. No último ano fiscal, a Senomyx perdeu US$ 19,7 milhões, ante uma receita de pesquisas de US$ 8,3 milhões.
Elise Wang, da Smith Barney, fez uma projeção segundo a qual os royalties das vendas de produtos alimentícios chegarão a US$ 50 milhões em 2008.


Tradução de Clara Allain

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