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CORRIDA PELA OMC
Para professor da London School of Economics, papel de Seixas Corrêa é só prejudicar candidatura de uruguaio
Brasileiro não é melhor para OMC, diz analista
CLÁUDIA DIANNI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Dez anos depois da criação da
OMC (Organização Mundial do
Comércio), o Brasil tem um entre
os quatro candidatos a presidir o
organismo internacional até
agosto de 2009, na eleição que começou nesta semana e termina no
fim do mês. Mas, na opinião do
especialista Razeen Sally, o embaixador Luiz Felipe de Seixas
Corrêa não é a melhor opção para
o cargo.
Na avaliação de Sally, que é diretor da Unidade de Comércio Internacional da London School of
Economics, "o papel da candidatura de Seixas é prejudicar" o uruguaio Carlos Pérez del Castillo.
Segundo ele, Castillo é o único
com condições de conduzir a Rodada Doha de liberalização comercial, prevista para ser concluída no fim do ano, mas ameaçada
pelas numerosas divergências entre os 148 países-membros.
Filho de pai inglês e mãe cingalesa (do Sri Lanka), o especialista
de posições liberais é cético quanto ao sucesso de Doha e defende
que os principais países da OMC,
entre eles o Brasil, tomem as decisões. Da Tailândia, ele concedeu a
seguinte entrevista:
Folha - Neste mês, a OMC vai escolher o novo diretor-geral entre
três candidatos de países em desenvolvimento e um europeu. Qual
é a melhor opção?
Razeen Sally - Eu acho que o melhor candidato para dirigir a OMC
atualmente é o uruguaio Carlos
Pérez del Castillo. Ele é muito respeitado internacionalmente, tem
muita experiência como negociador comercial e credibilidade
quanto a coordenar diferentes
posições. Ele foi muito eficiente
como chefe do Conselho Geral da
OMC em um ano muito difícil,
que foi 2003, quando houve o encontro ministerial de Cancún.
Folha - Ele é melhor em termos
técnicos ou políticos?
Sally - Eu acho que ele é a melhor
opção se a OMC quiser o melhor
servidor civil internacional. Mas
Pascal Lamy é o peso político. Essa é sua vantagem. Mas também
há fraquezas na candidatura de
Lamy. A principal delas é que ele
está associado às indefensáveis
posições da União Européia,
principalmente sobre agricultura.
Ele teria que provar que é capaz
de ir além das posições que defendeu tão fortemente e mostrar que
pode ser neutro e conciliar diferenças.
Folha - E os outros?
Sally - Provavelmente, o mais
fraco é o candidato das Ilhas Maurício, Jaya Cuttaree. Suas posições
estão comprometidas pelo fato de
que o país que ele representa defende preservar suas próprias
preferências.
Com relação ao embaixador
Seixas Corrêa, eu diria que o Brasil sempre tem embaixadores de
peso e é um participante cada vez
mais importante na OMC. Mas
não estou seguro de que ele é o
melhor candidato para liderar a
OMC. Eu acho que a importância
da sua candidatura é prejudicar as
chances de Pérez del Castillo.
Lamy pode ganhar pontos porque há divisão na América Latina.
Se houvesse um único candidato
latino-americano, e eu acho que
Pérez del Castillo tem as melhores
credenciais, ele ganharia.
Folha - O governo brasileiro acha
que Pérez del Castillo não é adequado porque ele teria jogado do
lado dos países ricos em Cancún.
Sally - Eu ouvi essa avaliação,
mas acho que é um ponto de vista
equivocado. Ele teve que enfrentar uma situação muito difícil e
parece ter tentado fazer isso sem
tomar partido. Então, na minha
opinião, o papel do Brasil nessa
eleição é tentar evitar que Pérez
del Castillo seja o diretor e isso pode deixar o campo livre para
Lamy, que é muito inteligente,
mas não acho que é a pessoa certa.
Folha - Não seria justo a OMC ser
sempre dirigida por um representante de um país em desenvolvimento, já que o FMI é tradicionalmente comandado por europeus, e
o Banco Mundial, por americanos?
Sally - Essa é a maneira como as
coisas têm sido feitas tradicionalmente. Claro que é aceitável que o
diretor da OMC deveria ser mais
freqüentemente de um país em
desenvolvimento. O atual diretor,
o tailandês Supachai Panitchpakdi, é o primeiro. Mas não acho
que esse deve ser o principal critério, mas sim a melhor pessoa para
o cargo.
Folha - A OMC toma decisão por
consenso e por isso as rodadas comerciais são tão lentas. O próximo
diretor deveria propor mudança
nesse sistema?
Sally - Não acho que isso seja
uma prioridade. Acho que podem
ser adotadas algumas mudanças
modestas para acelerar. Por
exemplo, preparar melhorar as
reuniões ministeriais (como a de
Seattle e a de Cancún, que falharam por falta de consenso). O
mais importante é que os principais participantes, e isso inclui o
Brasil, tenham vontade política e
usem sua capacidade para ter um
papel pró-ativo e instrutivo na
OMC, o que significa colaborar
com os demais membros e fazer
as escolhas políticas difíceis. Isso
seria uma política realmente intergovernamental.
Folha - Mas muitos países em desenvolvimento reclamam que a
OMC deveria ser mais democrática.
Sally - Se a OMC quer funcionar,
tem que reconhecer a realidade
política e econômica. E a realidade é que há cerca de 50 países, 30
se considerarmos a UE como um
país, que representam cerca 90%
do comércio internacional e investimentos estrangeiros diretos.
Há uma noção de que a OMC
deveria incluir as ONGs, o que é
uma má idéia. Essa é a receita para
que a OMC seja capturada por todo o tipo de interesses organizados e haja ainda mais gargalos. A
OMC deve ser essencialmente um
clube de governos responsáveis.
Folha - A União Européia finalmente concordou com uma gradual liberalização agrícola. Acha
que isso vai mesmo acontecer?
Sally - Essa é uma questão-chave. Se não ocorrer, a negociação
vai ficar bloqueada. E isso depende agora de os países em desenvolvimento fazerem concessões.
A UE já fez concessões, embora
sob condições e para os subsídios
à exportação. O mais importante,
porém, é tomar decisões com relação aos subsídios domésticos e
às tarifas de importação. Mas essa
não é uma via de mão única. Há
sérias concessões a serem feitas
pelos principais e mais avançados
países em desenvolvimento, como o Brasil.
Folha - Em que áreas o Brasil deveria ser mais flexível?
Sally - Primeiro em agricultura,
aceitando as propostas. Acho que
o Brasil pode mostrar que o G20
[grupo de países em desenvolvimento] pode colocar muito mais
na mesa de negociação em termos
de liberalizar seu próprio mercado. Assim, o Brasil poderia exercitar uma boa liderança.
Folha - Os críticos dizem que o livre comércio reduz salários, e os
defensores, que ajuda a manter a
estabilidade, controlando a inflação. Estamos fadados a ter baixos
salários ou inflação?
Sally - Geralmente, o que funciona para melhorar os índices de
crescimento e a redução da pobreza é ter políticas macroeconômicas razoáveis e estáveis e políticas e instituições que favoreçam o
mercado. O papel da OMC é o de
dar assistência para facilitar esse
processo. Esse argumento de que
o livre comércio reduz salários é
bobagem.
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