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LEÃO DESARMADO
Para secretário, legislação dá muitas chances ao contribuinte
Leis tributárias amarram as mãos da Receita, diz Rachid
Lula Marques - 31.mar.05/Folha Imagem
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Jorge Rachid, secretário da Receita, que quer processo mais ágil |
FÁTIMA FERNANDES
CLAUDIA ROLLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Para o secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, um dos principais problemas enfrentados pela sua secretaria é a lentidão dos
processos administrativos, que
podem demorar até quatro anos.
"Gostaríamos de diminuir o
prazo dos contenciosos [litígios
entre os contribuintes e o fisco].
Em determinados processos, o
contribuinte pode questionar o
delegado da Receita Federal, pode
pedir a impugnação do débito à
Delegacia da Receita Federal de
Julgamento, pode ir para o Conselho de Contribuintes e para o
Conselho Superior de Recursos
Fiscais do Ministério da Fazenda.
Não satisfeito, pode ainda buscar
a Justiça e começar tudo de novo
na primeira instância."
O contencioso administrativo,
segundo Rachid, está previsto em
lei e é um direito do contribuinte.
"Mas gostaríamos de abreviá-los
em algumas situações, como nos
processos de até R$ 50 mil, para
podermos cobrar com maior agilidade os processos de valores
maiores."
Em reportagem publicada no
último domingo pela Folha, procuradores e promotores de Justiça afirmam que as leis que tratam
de crimes tributários e a demora
nos processos administrativos
emperram o combate às fraudes.
Rachid prefere não falar sobre
essas leis. "Temos de cumpri-las."
Diz, porém, que a Receita quer
corrigir distorções que ocorrem
nos processos administrativos
dentro da própria Receita.
"A medida provisória n� 232
contemplava mudanças para agilizar os processos administrativos. Isso é importante, pois são
quase R$ 80 bilhões de créditos
em litígio", afirma. Essa mudança
estava prevista na nova redação
dada pelo artigo 10 da MP ao artigo 62 do decreto n� 70.235/72.
As autuações em 2004 somaram
cerca de R$ 79 bilhões, incluindo
impostos, multas e juros. Historicamente, segundo Rachid, cerca
de 22% desses valores (no caso
dos R$ 79 bilhões, seriam R$ 27,38
bilhões) são pagos ou parcelados
pelos contribuintes. Esse percentual chega perto de 50% quando
são incluídos os valores encaminhados à Dívida Ativa da União
(cobrança judicial).
A seguir, os principais trechos
da entrevista com Jorge Rachid.
Folha - Para o Ministério Público,
as leis que tratam de crimes tributários estimulam a sonegação. O sr.
concorda com essa afirmação?
Jorge Rachid - O que posso dizer
é que cada instituição tem seu papel. A missão da Receita Federal é
arrecadar tributos. E nós temos de
buscar eficiência e agilidade na
cobrança dos créditos tributários.
Não queremos só autuar [as autuações no ano passado somaram
R$ 79 bilhões, incluindo impostos, multas e juros]. Nós queremos que esses R$ 79 bilhões se
convertam em pagamento. Encaminhamos ao Ministério Público
até o ano passado cerca de 22 mil
representações fiscais para fins
penais. São cerca de 5.000 a 6.000
representações encaminhadas
por ano. Pela lei n� 9.430, de 1996,
o contribuinte tem o direito à extinção da pena no momento em
que paga o débito.
Folha - Procuradores dizem que a
legislação fiscal acaba estimulando a impunidade. Na lei do Paes (lei
10.684), por exemplo, o empresário pode quitar seus débitos de forma integral e se livrar de punições,
mesmo após ter sido condenado
pela Justiça. Como o sr. vê isso?
Rachid - Isso [a lei] foi discutido
no Congresso. O ordenamento
jurídico é esse. Minha missão é
cumprir a legislação e acelerar o
processo de cobrança. Se há crime
tributário, enviamos representação ao Ministério Público. E o papel do Ministério Público é examinar a denúncia. Fizemos grandes trabalhos com o Ministério
Público do Rio Grande do Sul.
Folha - A Receita perde com a morosidade dos processos administrativos e criminais?
Rachid - Nós podemos falar de
recursos administrativos. O contencioso administrativo está previsto em lei. Nós gostaríamos de
abreviá-lo em determinadas situações. Aliás, isso constava na
MP n� 232 [retirada do Congresso
no mês passado]. Os processos
com crédito tributário de até R$
50 mil correspondem a 40% do
total de processos que estão no
Conselho de Contribuintes. E esses 40% representam menos de
0,19% do total dos créditos em litígio, de quase R$ 80 bilhões, que
estão no conselho. Queremos agilizar isso para podermos cobrar
os valores maiores.
Folha - Como funciona o processo
administrativo na Receita?
Rachid - O contencioso administrativo contempla duas instâncias. A primeira é formada por
julgadores da Receita: são oito julgadores. A segunda é formada
por conselhos paritários: quatro
representantes da Fazenda e quatro dos contribuintes. Isso está
previsto em lei. Os processos de
pequeno valor, de até R$ 50 mil, a
exemplo do que ocorre no Tribunal de Impostos e Taxas [TIT] do
Estado de São Paulo, nós gostaríamos que houvesse mais rapidez.
Em média, o processo demora
quatro anos. Quanto mais curto
for esse prazo, melhor para o país.
Folha - O que é preciso para agilizar os processos administrativos
na Receita Federal?
Rachid - Para encurtar os prazos
é preciso mudar uma legislação
de 1972 [decreto n� 70.235]. Em
determinados processos, o contribuinte pode questionar o delegado da Receita Federal. Não satisfeito, pode pedir a impugnação
do débito à Delegacia da Receita
Federal de Julgamento, composta
por oito auditores. Não satisfeito,
pode ir para o Conselho de Contribuintes, que é paritário e, dependendo da matéria, ir para a
quarta instância, que é o Conselho Superior de Recursos Fiscais
do Ministério da Fazenda. Não satisfeito, pode ainda buscar a Justiça e começar tudo de novo em
primeira instância.
Folha - Quanto foi recuperado da
evasão fiscal nos últimos anos?
Rachid - É só ver a arrecadação,
que cresceu cerca de 11% no ano
passado, mais do que a economia.
Só que em lugar nenhum do
mundo se consegue identificar
qual foi a parcela da sonegação. O
que acontece é que as pessoas tomam mais cuidado na hora de
apresentar a declaração de renda
porque o vizinho foi pego. Em
2003, instituímos a Declaração sobre Operações Imobiliárias [Dimob], para imobiliárias e construtoras. Nós observamos mudanças no comportamento desses
contribuintes, pois tivemos mais
recolhimento de IR sobre ganho
de capital [o ganho de capital na
venda de um bem é tributado em
15%]. Identificamos que pessoas
tinham uma série de imóveis e
não declaravam [o recebimento
de] aluguel. Mas nem tudo isso é
fraude. Pode ser fraude ou não.
Folha - Das autuações de quase R$
79 bilhões em 2004, quanto de fato
deve voltar para os cofres públicos?
Rachid - Historicamente, observa-se que, ao longo de 24 meses,
em torno de 22% dos valores autuados são pagos ou parcelados.
Esse percentual chega perto de
50% se somados os valores inscritos na Dívida Ativa da União [cobrança judicial]. Em regra, os menores valores são pagos, e os
maiores são levados ao Judiciário.
Folha - Esse percentual de 22%
não é muito baixo para o retorno
das dívidas com a Receita?
Rachid - Existe um processo
constitucional. O contribuinte
tem direito de recorrer administrativa e judicialmente. Em nenhum lugar do mundo se atinge
100% [do valor autuado]. Muitos
países não chegam a recolher nem
esse percentual de 22%. Sem dúvida, seria melhor se conseguíssemos agilizar a cobrança interna e
aumentar o percentual.
Folha - O Ministério Público diz
que recebe as representações da
Receita que estão quase para prescrever. Assim, eles não podem fazer mais nada...
Rachid - A legislação diz que só
podemos encaminhar as representações fiscais para fins penais
depois de concluída a fase administrativa. Essa lei é aplicada no
país e nos Estados. A nossa posição é buscar arrecadação, coibindo a prática da evasão fiscal.
Folha - Para procuradores, o entendimento do STF de que não há
crime tributário antes de esgotado
o processo administrativo da Receita ou das fazendas estaduais
também favorece a impunidade. O
que o sr. acha disso?
Rachid - Decisão do STF é decisão do STF. Tenho de cumprir a
lei. Não vou opinar sobre decisões
do Supremo Tribunal Federal.
Folha - Quais são os planos da Receita para combater a sonegação?
Rachid - Existe um conjunto de
medidas já tomadas que estão em
curso. Temos informações sobre
movimentação financeira de contribuintes, como uso de cartão de
crédito, além de mais de 200 convênios para troca de informações.
Folha - A Receita tem outros planos em estudo?
Rachid - Também começamos a
monitorar os 10 mil maiores contribuintes do país, que representam 82% da arrecadação. Com isso, será possível liberar a força de
trabalho para atuar em outras
frentes. A Declaração de Débitos e
Créditos Tributários Federais
[DCTF] terá de ser apresentada
mensalmente por esse universo
[antes, a cada três meses] desde
janeiro deste ano. Internamente,
processos com mais de R$ 10 milhões de crédito também têm tratamento diferenciado.
Folha - O que a Receita tem a dizer aos contribuintes que sonegam
ou pagam com atraso os débitos
porque se beneficiam da lei?
Rachid - Tomem cuidado. Estamos próximos de todas essas operações ilícitas. Estamos trabalhando com um serviço de inteligência. É isso o que buscamos na fiscalização. Conforme detectamos
a situação, vamos coibir a evasão.
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