São Paulo, domingo, 10 de abril de 2005

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Impostos e crescimento

ANNA BERNASEK

A reforma fiscal, assim como um segundo casamento, é o triunfo da esperança sobre a experiência. Os EUA acabam de passar pelos cortes fiscais mais abrangentes desde a década de 80, mas quase ninguém está satisfeito. O presidente Bush afirma que precisamos de impostos ainda mais baixos para prosperar. Alan Greenspan (presidente do Fed) sugere uma mudança radical para um imposto sobre consumo. E o Partido Republicano visa todo o sistema fiscal.
No centro desse sentimento antiimpostos está a seguinte crença: os impostos são ruins para a economia. E quem discordaria?
Há um problema. Apesar da idéia generalizada de que os impostos prejudicam a economia, ninguém conseguiu sustentar isso. Não que os impostos não tenham efeito. São parte importante do sistema econômico e influenciam quem ganha e quem perde em uma sociedade competitiva. Mas há evidências de que os índices de impostos são um fator importante para determinar a prosperidade econômica do país.
Teoricamente, a questão parece muito simples. Segundo os princípios econômicos básicos, um imposto pode ter um efeito negativo sobre o comportamento, ao reduzir o incentivo para fazer qualquer coisa que seja taxada.
Depois há as evidências. Nos últimos 30 anos, economistas realizaram centenas de estudos para determinar se os impostos prejudicam a economia. Até agora eles apresentaram pouco para condenar os impostos. Depois de rever a literatura sobre o assunto em 1993, dois economistas, William Easterly, da Universidade de Nova York, e Sergio Rebelo, da Northswestern, concluíram em um trabalho conjunto que "a evidência de que os índices de impostos influem no crescimento é perturbadoramente frágil".
Um importante especialista em impostos de hoje, Joel B. Slemrod, da Universidade de Michigan, concordaria. Ele nota que, no século 20, o crescimento da carga fiscal nos EUA e em outros países desenvolvidos acompanhou o aumento da prosperidade.
Isso não pretende sugerir que os altos índices de impostos levam ao crescimento. Nenhum economista defenderá essa tese, embora muitos possam dizer que algumas coisas financiadas por impostos, como educação, pesquisa, saúde e projetos de infra-estrutura, podem contribuir para o crescimento. Mas isso coloca em questão por que, se os impostos são tão ruins para o crescimento, seu efeito não se mostra de modo mais proeminente.
Uma área importante da atividade econômica que parece reagir bastante aos índices de impostos são os investimentos empresariais. Parte dessa reação pode ter mais a ver com as mudanças no ritmo das decisões do que em mudanças no nível de investimentos em longo prazo.
No caso da poupança individual e do trabalho, os economistas estão mais perto de um consenso. Depois de estudo dos cortes fiscais no governo Reagan, a maioria dos economistas concorda que os impostos não influem muito em quanto os americanos trabalham.
Vale a pena lembrar disso quando considerar propostas como um imposto único ou um imposto sobre consumo. Com tanta energia concentrada em reduzir os índices, é importante ter em mente que os impostos não são a antítese da prosperidade.
Mas a reforma baseada na idéia de que os impostos são ruins para a economia é isso: uma idéia não sustentada por fortes evidências. E os custos de ignorar a experiência em favor da esperança podem ser altos: déficits crescentes, infra-estrutura decadente, investimento inadequado em educação pública e pesquisa.
Por isso, na próxima vez que algum defensor da reforma fiscal prometer grandes benefícios econômicos, há motivos para duvidar. Assim como um segundo casamento, um novo sistema fiscal não pode operar milagres.


Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves


Este artigo foi publicado originalmente no "New York Times"

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