São Paulo, segunda-feira, 08 de janeiro de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

FINANCIAL TIMES
Quanto maiores os desastres, mais raros
Economistas discutem que tipo de previsão é possível fazer sem errar

SAMUEL BRITTAN
DO "FINANCIAL TIMES"

Winston Churchill disse que um jovem político precisa ter "a capacidade para prever o que vai acontecer amanhã, na próxima semana, no próximo mês e no próximo ano. E depois ter a capacidade para explicar por que não aconteceu". Só a última parte é possível.
Dez anos atrás, observadores bem informados teriam concordado com o seguinte: a inflação é endêmica nas economias ocidentais; o Partido Trabalhista britânico é inelegível; o pleno emprego nunca mais será alcançado; os EUA são uma economia esclerosada, mas o Japão tem o segredo do crescimento. Essa lista foi tirada de um estudo de Bob Tyrrell, recém-publicado pelo Centro de Estudos Políticos: "Things Can Only Get... Different" (As coisas só podem ficar... diferentes). Infelizmente, os cenários de Tyrrell para os próximos anos não parecem muito convincentes.
A questão interessante é por que é tão difícil fazer previsões -e o que podemos afirmar mesmo sem ter uma bola de cristal. Os problemas da previsão se originam na complexidade dos fenômenos. Friedrich Hayek foi virtualmente proscrito por outros economistas por duvidar da possibilidade de se descobrir regularidades simples e quantitativas entre variáveis econômicas -o que os economistas tentaram fazer no último meio século.
O que falta então descobrir? Para Hayek, os economistas, assim como os biólogos, se preocupam com regras e padrões. Um estudante da evolução pode dizer algo sobre as condições em que as espécies evoluem, mas não pode prever quais serão ou quando ocorrerão. Graças aos avanços da física matemática é possível dizer mais sobre esses padrões na natureza e na sociedade. Um guia fascinante é o livro "Equity" (Equidade), de Mark Buchanan.
Já ouvimos algumas teorias sobre o caos e as catástrofes. Buchanan discute um terceiro "c": a complexidade. Ele usa a analogia de um monte de areia. Se for suficientemente íngreme, alguns grãos a mais podem causar um distúrbio; mas sem conhecer a posição de cada grão é impossível dizer onde ou quando ocorrerá. O monte de areia, no entanto, está num "estado crítico" -isto é, vulnerável a distúrbios- que ele acredita ser típico da vida social.
Considere um único grão caindo sobre o monte e desencadeando uma série de distúrbios. As autoridades deveriam ser capazes de retirar um pouco de areia, para reduzir a vulnerabilidade do monte? Infelizmente, não. Para prever o desastre, as autoridades "precisariam ter um conhecimento quase perfeito da posição dos grãos de todo o monte, juntamente com um poder de computação ilimitado para desvendar as consequências da queda de um grão". Assim, não há como dizer antecipadamente quais grãos deveriam ser removidos e para onde.
Não obstante, existe um padrão da "lei de poder" que pode ser aplicado a terremotos e fenômenos semelhantes. Ela diz que a frequência dos distúrbios é inversamente proporcional a seu tamanho. Quanto maiores, mais raros.
A lei de poder mais simples é a lei do quadrado invertido. O terremoto B, com o dobro da força do terremoto A, tem quatro vezes menos probabilidade de acontecer. Para cada cidade dos Estados Unidos como Atlanta, com uma população de 4 milhões, existem quatro cidades com a metade dessa população -por exemplo, Cincinnati. E para cada Cincinnati também existem quatro cidades com a metade dessa população.
Um exemplo diferente está relacionado à riqueza. Descubra quantas pessoas nos EUA têm uma fortuna líquida de US$ 1 bilhão e saberá que quatro vezes esse número de pessoas têm um valor líquido de US$ 500 milhões, e assim por diante. A lei do quadrado invertido não é a única lei de poder. As guerras foram estudadas em relação às mortes envolvidas. Cada vez que se duplica o número de mortes, as guerras se tornam -não quatro vezes, mas 2,62 vezes- menos prováveis.
Não existem leis deterministas da história relativas às causas da guerra: somente as leis de poder que sugerem que as grandes guerras são, felizmente, menos frequentes que as pequenas. Guerras e revoluções "não ocorrem em ciclos simples e não avisam sua chegada por telegrama", da mesma forma que os terremotos. Mesmo a magnitude da próxima alteração da Bolsa é imprevisível. As grandes quebras dos mercados são eventos ordinários, mas raros.
Buchanan tem a modéstia de admitir que a pesquisa está apenas começando. Existem vários problemas de medição e a necessidade de maior reflexão sobre por que essas leis são aplicáveis.
Existem áreas que não estão em estado crítico, nas quais se pode planejar com maior confiança? Existem pelo menos duas na macroeconomia. Existe a previsão em prazo muito curto, digamos 6 a 12 meses, quando o estatístico pode dizer alguma coisa com base nas variações típicas entre eventos já ocorridos, como os aumentos no preço do petróleo ou as explosões salariais.
Também há tendências para cinco anos ou mais. Por exemplo, as autoridades britânicas descobriram que para quase qualquer período a tendência de crescimento anual foi de 2,25%. Mesmo essa tendência é apenas uma possibilidade. É provável que ocorram distúrbios raros que provoquem décadas de crescimento acima ou abaixo da tendência, cujos motivos serão explicados depois do evento.
O estudo da complexidade está na infância, mas pelo menos oferece uma perspectiva de se aplicar métodos científicos aos assuntos humanos sem pretender ter uma bola de cristal mágica.


Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves



Texto Anterior: Financial Times: Nem ação do Fed devolve paz ao mercado
Próximo Texto: Panorâmica: Governo argentino publica decreto de emergência para
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.