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FISCALIZAÇÃO
Executivos foram inabilitados e 28 fiscais vasculham as operações da instituição, suspeita de burlar regras
BC investiga Rural e pune três diretores
WLADIMIR GRAMACHO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O Banco Rural, que ganhou notoriedade como agente financeiro
do esquema PC Farias, não teve
muito o que comemorar na virada do ano. Três de seus principais
dirigentes receberam pena máxima do Banco Central (BC) por haverem burlado regras bancárias.
E, desde 4 de dezembro, um batalhão formado por 28 fiscais está
vasculhando todas as operações
da instituição, sob a supervisão da
diretora de Fiscalização do BC,
Tereza Grossi.
A punição do BC atingiu o vice-presidente-executivo, José Augusto Dumont, o secretário-geral,
Holton Brandão, e o diretor de
Controle, Plauto Gouveia.
Os três foram inabilitados para
o exercício de cargos executivos
no mercado financeiro por oito
anos. Segundo o BC, entre 95 e 97,
eles fraudaram as regras de recolhimento de compulsório para
elevar a rentabilidade do banco.
Recolheram recursos de clientes
utilizando uma distribuidora de
títulos e valores mobiliários para
fugir do compulsório, que bloqueia 45% dos depósitos para serem repassados ao BC e trava negócios e ganhos que o banco poderia ter com esse dinheiro.
Por uma idiossincrasia legislativa, a Lei 4.595, que trata dessas
punições, prevê suspensão da pena em caso de recurso. Como todos eles recorreram, permanecem em seus cargos até que o
Conselho de Recursos do Sistema
Financeiro Nacional, o "Conselhinho", julgue o caso. Não há prazo
para esse julgamento.
No exercício de suas funções, os
três vêm ocupando parte de sua
agenda com o atendimento ao
grupo de fiscais do BC, que utiliza
um andar inteiro na sede do banco, em Belo Horizonte.
Trata-se de uma investigação de
rotina, que desde 1997 regularmente se faz nos bancos instalados no país para evitar novos colapsos, como os do Econômico e
do Nacional. Em "burocratês",
chama-se IGC (Inspeção Geral
Consolidada).
No caso do Rural, a apuração de
rotina tem pelo menos um objetivo específico. Um dado na contabilidade da instituição tem intrigado o comando do BC e parte do
mercado financeiro. Nos próximos dias, o banco deve anunciar
que sua rentabilidade no ano 2000
foi superior a 30%. Um dos melhores resultados do setor.
No Bradesco, por exemplo, a
rentabilidade no primeiro semestre de 2000 foi de 13,7%, menos
que a metade da do Banco Rural.
Num gráfico, os sucessivos lucros desenham uma linha fortemente ascendente. No primeiro
semestre de 1999, foram R$ 44 milhões. No segundo semestre do
mesmo ano, R$ 53 milhões. E no
primeiro de 2000, o último dado
conhecido, R$ 65 milhões.
"A rentabilidade é muito alta e
chama a atenção. O lucro vem das
operações de crédito, que sempre
são sujeitas a um risco muito alto", diz o especialista Alberto Borges Matias, da ABM Consulting,
que analisou a contabilidade do
Rural a pedido da Folha.
Por outro lado, o mesmo balanço revela que o banco tem dinheiro livre para cobrir possíveis perdas. Com o patrimônio líquido
que tem, R$ 370 milhões, poderia
fazer muito mais negócios do que
faz sem ter de burlar os limites
impostos pelo BC.
Esse é um dado que revela solidez financeira, lembra o consultor. Mas também há outros. É em
busca deles que estão os fiscais do
BC, já há um mês. O relatório da
inspeção deve ficar pronto até o
Carnaval, no fim de fevereiro.
Irregularidades
O Rural é uma instituição média, com 61 agências em 31 cidades e 25 mil clientes e 1.627 funcionários. Desde o início da década, quando o Rural foi flagrado
como principal agente financeiro
do esquema PC Farias (contas-fantasmas foram abertas numa
agência em Brasília, para serem
movimentadas pela secretária
Rosinete Melanias), o banco tem
se envolvido em denúncias.
Há investigações em curso que
atingem a instituição no Ministério Público e na Polícia Federal.
No Congresso, a CPI do Narcotráfico criticou o banco por dificultar
o acesso a informações sobre movimentações financeiras de alguns de seus suspeitos.
Irregularidades que ganharam
espaço no banco durante os longos anos em que os controles internos de algumas áreas não funcionavam e de outras nem sequer
existiam. E as punições do BC
eram revistas pelo "Conselhinho", como ainda são.
Só no ano passado, dois julgamentos desse órgão, formado
majoritariamente por representantes do mercado financeiro,
derrubaram sanções determinadas pela fiscalização do BC.
Em abril, ao julgar recurso do
Rural, esse conselho reduziu a
menos da metade multa aplicada
pelo BC por envolvimento do
banco em fraudes no mercado de
câmbio, entre 1987 e 1989, também praticadas por outras instituições. A pena caiu de US$ 12,9
milhões para US$ 5,6 milhões.
Em setembro, o "Conselhinho"
decidiu arquivar processo em que
o BC condenava a ação de quatro
dirigentes por concederem empréstimos "em desacordo com a
boa técnica bancária".
Depois das várias turbulências
enfrentadas pelo Rural, o dono do
banco, Sabino Rabello, 80, decidiu trazer do mercado financeiro
executivos experientes para tentar mudar a imagem da instituição e garantir seu funcionamento.
Recentemente, foram eleitos 15
executivos e controladores como
diretores estatutários do banco. O
que quer dizer que, em caso de intervenção, eles podem responder
com seu próprio patrimônio para
cobrir possíveis desfalques.
"Perpetuar o banco" é atualmente o maior desejo de seu dono. Reservado e avesso a festividades sociais, Rabello concluiu no
ano passado uma reforma societária em que assumiu o controle
total do banco, que também tem
como acionistas seus dois irmãos,
Ajax e Sebastião.
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