São Paulo, domingo, 28 de maio de 2000


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NARCOTRÁFICO

Em depoimento secreto à CPI, traficante diz que policiais foram à sua procura no Paraguai e agrediram seu filho

Beira-Mar acusa PF de tentar matá-lo


SERGIO TORRES
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

Em depoimento secreto à CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) do Narcotráfico, o traficante Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, 32, acusou policiais federais de terem ido ao Paraguai para matá-lo.
Segundo o traficante, a tentativa de homicídio teria ocorrido na cidade paraguaia de Pedro Juan Caballero, na fronteira com o Brasil, há cerca de 18 meses.
De acordo com o relato de Beira-Mar, gravado pela CPI, uma equipe de homens da PF (Polícia Federal) esteve na casa em que morava, em Pedro Juan Caballero, com o objetivo de matá-lo.
O traficante teria escapado da morte porque não estava em casa, segundo o depoimento.
"Eles estavam armados com silenciador para me matar dentro de casa", disse Beira-Mar aos deputados da CPI e aos policiais federais que o ouviram por telefone, durante 90 minutos, no dia 24 de março deste ano.
A íntegra do depoimento reservado de Fernandinho Beira-Mar foi obtida pela Folha.
O traficante afirma que, como não o encontraram, os agentes teriam espancado seu filho mais velho, Davidson, com 10 anos de idade na época.
Alessandra Costa, irmã de Beira-Mar e presa desde o início deste ano sob a acusação de envolvimento com a quadrilha de traficantes, também teria sido agredida pelos policiais.
O traficante acusou o agente Celso Figueiró, da PF, de ter chefiado a equipe que teria ido a Pedro Juan Caballero para matá-lo. Figueiró foi o policial que o prendeu em Belo Horizonte, em junho de 1996.
Os policiais federais teriam entrado no Paraguai pelo município de Ponta Porã, no Mato Grosso do Sul. As cidades de Ponta Porã e Pedro Juan Caballero são separadas apenas por uma avenida.
"Ele (Figueiró) foi a minha casa e a invadiu com a "poliçada". Torturou minha irmã Alessandra, pegou meu filho de 10 anos e arrebentou no pau", disse Fernandinho Beira-Mar à CPI.
Além dos supostos espancamentos e torturas, os policiais federais teriam roubado pertences do traficante.
"Ele (Figueiró) levou quase tudo o que tinha de valor dentro da minha casa", disse Beira-Mar.
Informado da presença de policiais em sua casa, Beira-Mar conta que entrou em contato com um promotor de Justiça do Paraguai, que teria intercedido junto à polícia brasileira para soltar Alessandra e Davidson. O traficante não disse o nome do promotor à CPI do Narcotráfico.
Com veemência, o traficante alertou deputados e policiais federais, durante o depoimento, que não aceita o que chamou de perseguições contra a sua família.
"Sou um cara homem, sou correto, não faço pilantragem com a família de ninguém. Sou um cara de palavra, cumpro o que eu faço e sou bandido", disse ele.
Essa foi a primeira vez em que Fernandinho Beira-Mar vincula policiais federais a irregularidades nas investigações sobre seu paradeiro.
Por causa de denúncias de Beira-Mar e de gravações telefônicas, a Secretaria de Segurança do Estado do Rio já afastou de serviço sete policiais civis, acusados de envolvimento em extorsões contra o traficante.
Os policiais civis, em ocasiões diferentes, teriam viajado ao Mato Grosso do Sul e ao Paraguai para tirar dinheiro de Beira-Mar.
"Tive de dar uma casa de R$ 500 mil, vários apartamentos, carros. Já perdi a conta dos muitos milhões que paguei à polícia do Rio", disse Beira-Mar no depoimento à CPI do Narcotráfico.
O traficante demonstra no depoimento preocupação com a situação das irmãs, Alessandra e Débora. As duas foram presas este ano, acusadas de participar da quadrilha de traficantes liderada pelo irmão.
No depoimento, Beira-Mar procurou condicionar o fornecimento à CPI e à PF de informações sobre o narcotráfico a benefícios concedidos às irmãs.
"Minhas irmãs não podem pagar pelos meus erros", disse Fernandinho Beira-Mar, acrescentando não estar "ameaçando a família de ninguém".
"Deixaram fazer sacanagem com a minha família. Isso é o que eu estou mostrando para eles", afirmou o traficante.

Histórico
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro condenou na segunda-feira passada três membros da quadrilha do traficante Fernandinho Beira-Mar, por tráfico de drogas.
Alda Inês dos Anjos Oliveira, ex-mulher e integrante da quadrilha de Beira-Mar, foi condenada pelo Tribunal de Justiça a oito anos de prisão.
Sua participação na quadrilha foi considerada "relevante" pela juíza Therezinha Maria de Avellar Duarte, da 1� Vara Criminal de Duque de Caxias.
Ela chegou a confessar em depoimento ao Ministério Público seu envolvimento no tráfico liderado pelo ex-marido.
O doleiro Khaled Nawaf Aragi também foi condenado a oito anos de reclusão. Segundo a sentença, ele era responsável pela lavagem de dinheiro do tráfico.
O terceiro, condenado a seis anos de prisão, foi Cláudio de Sá Neves, conhecido como Dedão.
Responsável pelo envio de carros roubados para o Paraguai, operação que era intermediada por José Carlos Bandeira Crespo. Crespo foi preso no ano passado por tráfico de drogas.
Neves trocava os carros por cocaína. A droga era, então, vendida nos morros do Rio de Janeiro.


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