PEDRO DANTAS
DA SUCURSAL DO RIO

A cena aconteceu durante a rebelião no educandário Santo Expedito, na última quarta-feira, no Rio. Acompanhado de uma comitiva de missionários, o pastor Marcos Pereira da Silva, 43, ignora o clima tenso da rebelião de menores que cumprem penas até por duplo homicídio e realiza um culto evangélico com os internos.
Um interno de 18 anos morreu durante o motim e outros 19 menores ficaram feridos. Um bombeiro também se machucou. Ninguém fugiu da instituição.
Na cerimônia de exorcismo, ou, como o pastor prefere, de "expulsão de demônios em nome de Jesus", alguns menores caem inertes no chão após o toque de Silva sobre suas cabeças.
Segundo ele, a cena é comum. Silva afirma que controlar rebeliões em delegacias, presídios e internatos de menores é apenas parte de sua missão evangelizadora.
Os adolescentes destruíram e incendiaram parte das instalações do educandário. A onda de violência, segundo os internos, tem relação com os maus-tratos e a superlotação na unidade.
A Secretaria de Justiça irá investigar as causas da rebelião, apurando ligações entre o conflito dos garotos e as manifestações de moradores contra policiais em favelas do Rio, em protesto contra mortes de supostos traficantes.

Vida
A história religiosa do ex-maître e proprietário de restaurantes na zona sul da cidade começou, segundo ele, após um encontro pessoal com Satanás na sala de sua casa, em 1990 .
"Não tinha bebido nada e o próprio Satanás apareceu se transfigurando em dragão, lobo e homem. Ele dizia que ia levar minha alma para o inferno", conta Silva.
Para os parentes, a alternativa era interná-lo em um manicômio, mas Silva optou por um culto evangélico no centro do Rio, onde se converteu aos 33 anos. Desde então, não saiu mais.
A opção pelo trabalho de conversão de criminosos, prostitutas, drogados e homossexuais, que segundo o pastor estão possuídos pelo demônio, aconteceu no ano seguinte à conversão, após a leitura de textos bíblicos.
As primeiras incursões de Silva foram no já desativado presídio da Ilha Grande, conhecido como "Caldeirão do Diabo", onde ficavam criminosos considerados de alta periculosidade.
Em 1991, o já pastor Marcos abriu um abrigo para recuperar todos que "denegriam a palavra de Deus" em sua casa no bairro do Éden, em São João de Meriti (Baixada Fluminense).
Hoje, o abrigo da Assembléia de Deus comporta 100 pessoas. "São 22 varões, 18 mulheres e o restante adolescentes e idosos", contabiliza o pastor.

Personagens
No currículo de convertidos pelo pastor Marcos estão criminosos e artistas famosos, como o ex-trapalhão Dedé Santana e a atriz Kátia D'Ângelo.
"O caso que mais me impressionou foi o de Francisco de Assis, o "Maníaco do Parque". Cheguei no presídio às 6h e só consegui entrar às 17h. Quando cheguei no gabinete do diretor, Deus me revelou que Francisco ia tentar suicídio. Ao orar para aquele homem, muitos demônios se manifestaram e ele caiu", lembra o pastor.
Assis ganhou o apelido de ""Maníaco do Parque" em razão do local onde suas vítimas foram encontradas mortas em São Paulo, no Parque do Estado. A maior dificuldade do pastor é a entrada nas instituições penais. Ele admite que as visitas não autorizadas pelos órgãos do governo são conseguidas com base na amizade com diretores e carcereiros e não raramente diante da insistência dos presos. "Faço um apelo para abrirem mais as portas ao nosso trabalho nos cárceres. Às vezes, nossa comitiva integrada por mulheres passa por revistas humilhantes", lamenta o pastor.


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