São Paulo, Domingo, 21 de Novembro de 1999
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ARTIGO Hormônio de crescimento: fantasia e realidade

EDER QUINTÃO
MARCELLO BRONSTEIN

especial para a Folha Em seu artigo "Revolução científica contra o envelhecimento" (Folha de S.Paulo, 14/11/99) o dr. Tuffik Mattar fornece informações errôneas e sensacionalistas já no título. O hormônio de crescimento (produzido na adeno-hipófise e não na neuro-hipófise, como publicado) é muito importante para o desenvolvimento da criança e do adolescente, e também para o adulto.
Embora a sua ação mais evidente seja no crescimento (daí o seu nome), este hormônio tem várias outras funções, tais como aumentar a massa muscular e diminuir a massa gordurosa, fortalecer os ossos, aumentar a capacidade cardíaca e pulmonar, e mesmo atuar positivamente na esfera mental. A importância deste hormônio na idade adulta é bem demostrada pelo benefício de sua reposição em pacientes carentes do mesmo (em decorrência de doenças na região da hipófise).
Realmente, a melhora física e psicológica destes indivíduos durante o tratamento com hormônio de crescimento é nítida. Assim, adultos normais, mesmo já tendo completado o crescimento, continuam produzindo hormônio de crescimento, em quantidades progressivamente menores à medida que envelhecem.
Considerando-se que a produção do hormônio diminui com a idade, aventou-se a possibilidade de que a administração do mesmo em pessoas idosas poderia ter um efeito positivo na esfera física e mental. Embora seja uma idéia que, se comprovada, traria benefícios à terceira idade, infelizmente ainda não chegamos à fonte da juventude...!

Idosos


Não existem atualmente evidências científicas de que idosos apresentem rejuvenescimento ou, muito menos, tornem-se longevos com o emprego do hormônio ou de substâncias que estimulem a sua produção ou efeitos, como foi alardeado no artigo assinado pelo dr. Tuffik Mattar.
Adicionalmente, o hormônio de crescimento pode precipitar o desenvolvimento de diabetes ou mesmo de doenças malignas, principalmente no idoso, naturalmente mais propenso a estas moléstias. Outra impropriedade colocada no artigo é de que a "somatomedina" (na verdade, existem várias) ativa a produção da hipófise. Na realidade, a somatomedina C (ou IGF-1), é produzida (principalmente no fígado) por meio de estímulo pelo hormônio de crescimento, e por sua vez inibe, e não ativa, conforme consta na matéria, a produção do hormônio pela hipófise.
Sem nos alongarmos em outras impropriedades do artigo, como a que se refere à somatostatina, gostaríamos de deixar registrada, como professores universitários, a nossa preocupação com o teor não-científico daquele artigo, e colocar bem claramente a nossa posição: o emprego do hormônio de crescimento, ou de substâncias geradas por meio dele, não deve ser incentivado numa população leiga, naturalmente fascinada pelo sonho do rejuvenescimento e longevidade. Somente estudos realizados em centros científicos de alto padrão, com controles adequados, poderão mostrar no futuro se existe algum subgrupo de idosos (por exemplo, os debilitados ou incapazes de locomoção) que se beneficie do tratamento com hormônio de crescimento, ou com substâncias que estimulem a sua produção ou possuam os seus efeitos.
Desta forma, enquanto não se comprove cientificamente a eficácia de drogas candidatas à fonte da juventude, a alimentação e atividade física adequadas e o controle de fatores de risco como fumo, diabetes, colesterol e pressão arterial elevados persistem sendo as melhores recomendações para uma vida saudável e prolongada.


Eder Quintão, 66, é professor titular de endocrinologia da Faculdade de Medicina da USP
Marcello D. Bronstein, 54, é professor livre-docente, chefe da Unidade de Neuroendocrinologia, disciplina de endocrinologia, no Hospital das Clínicas da USP


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