São Paulo, domingo, 20 de maio de 2001

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CRISE DE ENERGIA

Estudo inglês mostra relação entre iluminação e violência; para pesquisador, periferia seria a maior vítima

Corte de luz estimula a criminalidade

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Um corte de 50% na iluminação pública da cidade costeira de Brighton, na Inglaterra, como parte das medidas de emergência diante da crise do petróleo nos anos 70, provocou substancial aumento do crime.
Em janeiro e fevereiro de 1974, o número de arrombamentos à noite naquela cidade de lazer dobrou. Os furtos de veículos aumentaram 59%, e multiplicaram-se os casos de vandalismo.
Essa pesquisa é citada pelo coronel reformado da Polícia Militar paulista José Vicente da Silva, pesquisador do Instituto Fernand Braudel, a título de mostrar que a escuridão é uma ameaça tanto para as melhores famílias britânicas como para as brasileiras.
"Se houver apagão nas vias públicas, a violência recrudescerá", alerta o especialista. "E se houver apagão na periferia, é ela que vai sofrer mais", afirma.
O caso de Brighton, mencionado em estudo de Kate Painter, pesquisadora do Instituto de Criminologia da Universidade de Cambridge, é um dos raros levantamentos sobre os efeitos de apagões encontrados na literatura sobre iluminação e criminalidade.
Em geral, as pesquisas procuram avaliar se a melhor iluminação das ruas é boa arma para inibir o crime. E não são conclusivas.
Em julho de 1977, o Departamento de Justiça norte-americano concluiu que não há evidências estatísticas de que a melhor iluminação das ruas influi no nível dos crimes. Um relatório de 500 páginas apresentado ao Congresso dos Estados Unidos em 1997 chega à mesma conclusão. E admite que esses levantamentos não determinam em que medida os criminosos também usam a iluminação para levar vantagem.
Ao analisar 15 pesquisas realizadas na Inglaterra, Painter identificou oito casos em que houve declínio da criminalidade. Em dois, contudo, observou-se um ligeiro aumento dos crimes.
Há situações em que as ocorrências são reduzidas, mas depois retornam aos níveis anteriores.
No início dos anos 90, a Prefeitura de Diadema, em São Paulo, realizou um programa de melhoria da iluminação das ruas, levando esse serviço até as favelas.
Os resultados foram imediatos: em 1991, houve redução de 22,7% nos casos de roubo, em relação ao ano anterior. Os homicídios também caíram. Mas, sem a conjugação de outras medidas preventivas, a criminalidade voltou a disparar nos anos seguintes.
"É quase impossível planejar e implementar medidas efetivas contra o crime se as causas básicas não forem conhecidas", afirma Duco Schreuder, um especialista holandês em iluminação pública e criminalidade.
O princípio parece valer para o crime cometido às claras e para os facilitados pela baixa luminosidade. Schreuder cita que a prática do vandalismo incide diretamente sobre os equipamentos de iluminação pública, que são destruídos sem motivo aparente.
"Quando há escuridão, é maior a possibilidade de que venha a ocorrer o vandalismo", concorda o coronel José Vicente, do Instituto Fernand Braudel.
"Nos casos de saque, o estímulo à desordem é contagioso, principalmente porque a escuridão dificulta o reconhecimento", diz.
Na hipótese de apagão, ele considera ambientes propícios ao crime os locais próximos a shoppings centers. José Vicente defende o planejamento conjunto das polícias estaduais, Militar e Civil, municipais e os serviços de vigilância privada.
As pesquisas sobre iluminação e criminalidade nos Estados Unidos mostram situações em que a melhor iluminação das ruas desloca os criminosos para regiões próximas menos iluminadas.
Em São Paulo, de acordo com o pesquisador do Fernand Braudel, os roubos costumam ser um fenômeno localizado: "O bandido da zona norte não se desloca para outra região, pois não sabe o esquema da vítima preferencial nem conhece as vias de fuga".
"O crime é distribuído desigualmente", diz. Ele propõe unificar o comando da ação (como a centralização dos sistemas de chamadas telefônicas de urgência, tipo 190) e descentralizar o diagnóstico, nos casos de apagão.
"A unidade básica é o distrito policial. Ninguém é capaz de fazer um melhor perfil do crime e monitorar a ação policial conjunta do que o delegado e o comando da companhia de policiamento de cada distrito", diz o especialista.


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