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AMAZÔNIA
Peruanos e bolivianos são contratados sem obter equivalência do diploma; para CRM, eles podem estar despreparados
20% dos médicos do Acre são clandestinos
EDUARDO SCOLESE
DA AGÊNCIA FOLHA, EM RIO BRANCO
De cada cinco médicos que hoje
trabalham no interior do Acre,
um está em situação irregular e
não poderia exercer a profissão.
Um levantamento realizado pelo
CRM (Conselho Regional de Medicina) mostra que pelo menos 25
estrangeiros trabalham em postos
de saúde de prefeituras ou nos
hospitais do Estado sem o registro
obrigatório da entidade.
Esses médicos -na maioria peruanos e bolivianos- são considerados clandestinos pelo CRM
pois foram contratados sem revalidar seus diplomas em uma universidade brasileira.
Só com a revalidação eles conseguiriam o registro do CRM e poderiam trabalhar no país.
O CRM encaminhou aos Ministérios Públicos Estadual e Federal,
no final do ano passado, documentos que comprovariam o risco que os pacientes acreanos estariam correndo. O CRM afirma
que os médicos sem registro podem estar despreparados para o
exercício da função.
Em Cruzeiro do Sul -segunda
maior cidade do Acre- todos os
médicos contratados pela prefeitura são peruanos e nenhum possui registro do CRM. Contratado
há três anos e até hoje sem registro, o peruano Carlos Luis Boggio
Diez, 34, diz que "em consultas
simples, não há risco de ocorrer
erros médicos que comprometam a saúde dos pacientes".
Já no Amazonas, a estimativa é
que cem médicos estrangeiros estejam atuando de forma ilegal em
municípios carentes (leia textos
nesta página).
De acordo com o último levantamento do CFM (Conselho Federal de Medicina), existem hoje
294 médicos ativos cadastrados
no Acre, sendo 188 na capital e 106
no interior. Além dos 106, outros
25 seriam clandestinos.
As prefeituras do Acre oferecem
um salário mensal médio de R$
2.500 e o Estado, de R$ 3.400 a R$
6.000. Segundo médicos ouvidos
pela Agência Folha, um médico
recém-formado no Peru e na Bolívia recebe, em média, cerca de
US$ 600 (cerca de R$ 1.100).
Os administradores apresentam dois argumentos para a contratação dos estrangeiros: a falta
de profissionais brasileiros interessados em trabalhar no interior
do Estado e a autorização do Ministério do Trabalho, que concede
a eles o visto temporário de permanência no país.
O estrangeiro admitido na condição de temporário só pode
exercer atividade remunerada no
país durante quatro anos. No caso
dos médicos, além do visto, é preciso obter o cadastro na entidade.
Parte dos recursos que as prefeituras usam para o pagamento dos
salários dos médicos, incluindo os
que estão irregulares, vem do Ministério da Saúde, por meio do repasse das verbas do Programa
Saúde da Família.
De acordo com o CRM, o cadastro do ministério indica que os
médicos estrangeiros, mesmo os
sem registro do CFM, estariam
aptos a exercer a profissão. Essa
falha impede que a entidade controle os profissionais que estão
atuando irregularmente.
Idioma diferente
O CRM aponta outros problemas na atuação dos médicos estrangeiros que dificultariam o
exercício da profissão. Uma delas
é que os profissionais formados
em universidades de outros países estão acostumados com remédios incomuns no Brasil.
Outro problema apontado pela
entidade é o idioma pois alguns
pacientes não entendem as observações feitas, em espanhol, durante uma consulta rápida.
Nas unidades de saúde no interior do Acre, cada médico atende
uma média de 60 pessoas por dia.
A recomendação do CRM é que
atendam, no máximo, 15 pacientes por dia.
Em caso de erros médicos, os
responsáveis que não estiverem
suas situações regularizadas serão
julgados pela Justiça sem receber
respaldo do CRM.
"Os países investem na formação dos médicos e, quando eles
estão formados e prontos para
auxiliar a sua população, preferem trabalhar em um país que
não precisou desembolsar nada
para formá-los", diz o assessor jurídico do CRM, Miguel Ortiz.
Não há como controlar de forma ostensiva a atuação dos estrangeiros irregulares que atuam
no interior do Estado, segundo
ele, principalmente devido às dificuldades de acesso às cidades. No
Acre, há locais em que só se pode
chegar de barco ou por meio de
aviões de pequeno porte.
Segundo o CRM, o Ministério
Público Estadual teria como autuar as prefeituras por crime fiscal, pois elas não podem remunerar pessoas que estejam com suas
situações irregulares. A assessoria
do ministério informou que após
o recesso, os documentos enviados pelo CRM serão analisados.
Teste de equivalência
Para regularizar sua situação no
Brasil, os médicos estrangeiros
têm de fazer testes de equivalência
nas universidades nacionais para
revalidar o diploma.
Só depois de aprovados é que
podem fazer a inscrição no CRM
do Estado em que desejam exercer a profissão.
Para fazer o teste, o médico deve
-em primeiro lugar- estar em
situação regularizada no país,
com o visto temporário adquirido
no Ministério do Trabalho.
Nas universidades, os estrangeiros fazem um teste de língua portuguesa e outro para testar seus
conhecimentos técnicos na área.
A prova, segundo o CRM, tem o
objetivo de identificar se os conhecimentos do estrangeiro é
equivalente ao de um médico formado no Brasil.
O conselho afirma que essas exigências não visam preservar o
mercado para o médico nacional,
e sim resguardar a integridade do
paciente, que tem o direito de ser
atendido por alguém que possua
o conhecimento científico suficiente.
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