São Paulo, segunda-feira, 08 de janeiro de 2001

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RIO
Ministério Público apura danos causados pelo abandono de 400 toneladas de produto tóxico na área rural de Duque de Caxias
Inquérito apura contaminação ambiental

ISABEL CLEMENTE
DA SUCURSAL DO RIO

O Ministério Público Federal no Rio de Janeiro instaurou um inquérito para tentar solucionar um dos maiores escândalos ambientais já registrados no país, que se arrasta há 45 anos.
A Cidade dos Meninos, uma extensa área rural do município de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, e seus moradores convivem, desde 1956, com um ambiente contaminado por HCH (hexaclorociclohexano), inseticida popularmente conhecido como "pó-de-broca".
Esse produto, altamente tóxico, persistente e potencialmente cancerígeno -segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde)-, já era proibido nos Estados Unidos em meados dos anos 50, quando 400 toneladas dele foram abandonadas a céu aberto em Duque de Caxias, após a desativação da fábrica do Instituto de Malariologia, vinculado ao antigo Ministério da Saúde e da Educação, que produzia o inseticida.
O inquérito do Ministério Público visa apurar os danos causados ao meio ambiente e às mais de 2.000 pessoas, entre adultos e crianças, que moraram (ou moram) ali, e chegar a um TAC (Termo de Ajuste de Conduta) com os órgãos públicos envolvidos.
O termo, que já está sendo elaborado, deve ser assinado por Ministério da Saúde, Feema (Fundação Estadual de Engenharia em Meio Ambiente), Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), Prefeitura de Duque de Caxias e outras instituições.
"Não há explicação razoável para a área contaminada e as pessoas estarem lá até hoje", disse a procuradora da República Gisele Porto, responsável pelo inquérito.
O TAC substitui um processo e, por ele, os responsáveis se comprometem com ações, investimentos e cronograma para a solução. O debate sobre o caso foi retomado no final do ano passado e já chegou ao gabinete do ministro José Serra (Saúde).
O caso tem sido tratado como prioridade, segundo a diretora do Departamento de Ciência e Tecnologia em Saúde do Ministério da Saúde, Beatriz Tess.
Um primeiro TAC foi assinado em 1993, mas não foi cumprido sob a justificativa de que o Ministério da Saúde não havia repassado os recursos necessários.
"Constatei omissão total ou ações sem resultado. Não pode haver mais atraso", afirmou a procuradora, que tomou conhecimento do caso no final de 1999.

Situação é pior
A única tentativa de acabar com a contaminação agravou a situação, segundo pesquisadores da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e da PUC-Rio e a própria Feema.
Em 1995, a empresa paranaense Nortox, a pedido do Ministério da Saúde, adicionou cal virgem ao HCH e espalhou a mistura pelo solo para desativar o inseticida.
A mistura, porém, gerou subprodutos tão ou mais tóxicos que o "pó-de-broca", segundo os engenheiros Tomaz Langenbach, do Instituto de Microbiologia da UFRJ, e Tácio Mauro Pereira de Campos, coordenador do Projeto HCH da PUC-Rio.
"O problema foi espalhado", afirma Langenbach. Hoje a área foco está estimada em 40 mil m2. "Há menos moléculas de HCH, sem dúvida, mas há mais produtos tóxicos indo para o ar."
Procurada pela Folha, a Nortox não quis se manifestar. Dos autos do inquérito consta um laudo em que a empresa se defende, apontando redução de HCH em cerca de 86%, após a aplicação. O serviço foi prestado de graça.


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