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EDUCAÇÃO
Pesquisador de políticas educacionais defende que "provões" deveriam gerar punições ou bonificações para escolas
Avaliações são quase inócuas, diz especialista
FÁBIO TAKAHASHI
DA REPORTAGEM LOCAL
Para haver uma melhoria na
educação básica brasileira, os exames aplicados aos estudantes deveriam ser utilizados para gerar
punições ou bonificações para as
escolas. Essa política de resultados é defendida por Eduardo de
Carvalho Andrade, pesquisador
de políticas educacionais no país e
nos Estados Unidos.
Nas últimas semanas, os estudantes foram avaliados pelo governo federal por meio de dois
exames, a recém-criada Prova
Brasil e o Aneb, antigo Saeb.
O primeiro é aplicado a todos os
alunos de 4� e 8� séries do ensino
fundamental do país, envolvendo
cerca de 5 milhões de estudantes,
ao custo de R$ 55 milhões. Essa foi
a primeira edição da prova, que
visa mostrar as dificuldades de cada escola do país.
Já o Aneb é feito por amostragem em classes de 4� e 8� séries do
ensino fundamental e do 3� ano
do ensino médio. A prova, que
custou R$ 4 milhões, foi mantida,
apesar da criação da Prova Brasil,
para que se possa manter o acompanhamento da evolução dos resultados da educação no país -o
exame começou em 1990.
Como é por amostragem, a prova não consegue dar um diagnóstico de cada escola. As comparações só podem ser feitas nos âmbitos federal e estadual. Além desses exames nacionais, governos
estaduais e até municipais também aplicam suas provas.
A implantação desses exames é
positiva, afirma Carvalho, por dar
um diagnóstico do ensino. Mas
eles são insuficientes: apenas com
pressão as escolas melhoram.
Formado em economia pela
PUC-RJ até o mestrado, Andrade,
38, pesquisou políticas educacionais em sua tese de doutorado na
Universidade de Chicago, finalizado em 1998 -assunto que vem
estudando até hoje. Leia abaixo os
principais trechos da entrevista.
Folha - Como o senhor avalia os
exames do ensino básico no país?
Eduardo de Carvalho Andrade -
Atualmente, você coloca um teste
e não há uma cobrança. Por que
os resultados vão melhorar? Apenas identificar o problema é pouco. O professor e a escola respondem a incentivos. Um primeiro
passo para melhorar esses "provões" seria divulgar amplamente
os resultados. Atualmente, existe
uma percepção dos pais de que as
escolas públicas no Brasil vão
bem (pesquisa do governo federal
divulgada neste ano mostra que
os pais dão nota 8,1 para a organização da escola, em uma escala de
0 a 10). Mas, se o pai verificar que a
nota do colégio do seu filho está
abaixo da de um colégio próximo,
ele começa a questionar: "Essa escola é boa mesmo?".
Folha - E o que deveria ser feito
com os resultados dos exames?
Andrade - Os estudos feitos nos
EUA mostram que simplesmente
adotar um exame traz um impacto próximo a zero. É preciso passar para um sistema mais agressivo. Há experiências norte-americanas que vão nessa direção. Um
exemplo é o Texas. Primeiro, a escola tem de explicar ao Board
Education, equivalente à secretaria de Educação, por que os resultados no exame nacional estão
ruins. Também precisa submeter
a esse órgão um plano de desenvolvimento. Em última instância,
se ela não melhorar, é fechada, e o
aluno tem o direito de pedir transferência para outra escola, ganhando uma bolsa para isso.
Por outro lado, há bonificação
para os bons resultados. Para isso,
a escola deve atingir metas de
qualidade, como ter pelo menos
90% dos alunos aprovados. Essa
escola, então, é comparada a outras com perfis parecidos. As que
tiverem as melhores evoluções
ganham prêmios anuais, que variam entre US$ 500 e US$ 5.000
[R$ 1.150 e R$ 11.500]. A escola
tem autonomia para utilizar esse
valor da forma que quiser.
Folha - Houve melhora em Estados que aderiram a esse sistema?
Andrade - Existe um organismo,
o Consortium for Policy Research
in Education, que acompanha isso. Eles montaram uma escala de
0 a 5 que mede o "school accountability" de cada Estado, que é a
capacidade de a escola influenciar
a performance dos seus alunos.
Zero significa que nem avaliação o Estado possui. Cinco significa presença do exame e um acompanhamento forte no resultado. O
estudo mostrou que a cada dois
pontos avançados nessa escala,
aumenta entre 7% e 8% o número
de alunos que passam a ter um nível de conhecimento adequado
em matemática e em inglês no
exame nacional. Com a implementação da Prova Brasil, hoje estaríamos na escala 1, ou seja, temos um teste, mas não há cobrança. Para subir dois pontos e chegar, seria necessário haver uma
cobrança moderada nas escolas.
O colégio ruim não seria fechado,
mas perderia uma espécie de selo
de qualidade que boas escolas recebem. Também seria necessário
cobrar o aluno,que só avançaria
se passasse na prova federal, estadual ou municipal.
Folha - Mas um sistema desse não
pode aumentar a evasão, já que o
aluno reprovado tende a desistir?
Andrade - Para evitar isso, alguns Estados americanos, como a
Carolina do Norte, levam em conta não só o desempenho dos alunos na prova mas também índices
de evasão e de repetência. Para
evitar a saída dos alunos da escola, alguns Estados e municípios
brasileiros adotaram a progressão
continuada (São Paulo é um
exemplo), em que o aluno só é reprovado após o término de cada
ciclo (em geral, de quatro anos).
Sou cético com relação a você passar o aluno sem que ele efetivamente saiba. Isso cria um desestímulo aos outros que querem estudar. Não acho que uma forte cobrança tenha de ser imposta de
uma hora para outra. Mas, no dia
que isso acontecer e haver um alto
nível de repetência, haverá uma
grande cobrança da sociedade.
Folha - O Brasil tem condições de
adotar um sistema com bonificação
e punição para as escolas?
Andrade - Provavelmente os sindicatos de professores não vão ficar felizes, mas é claro que a implementação não seria a curto
prazo. A criação dos "provões" é
um passo, mas não pode parar aí.
E não sei se aqueles que implementaram os exames se interessam em fazer os próximos passos.
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