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REPRODUÇÃO HUMANA
Apenas 54 fertilizações in vitro foram feitas no ano, quando a previsão inicial era de 40 por mês
Centro do HC de US$ 1,5 mi está subutilizado
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
O centro de reprodução humana do Hospital das Clínicas, que
custou US$ 1,5 milhão aos cofres
públicos e tem capacidade para
atender 2.000 casais inférteis por
ano, está subutilizado e passa por
uma grave crise de gestão.
Criado em fevereiro de 2003
com verbas do governo do Estado, até hoje o centro, que leva o
nome do governador Mário Covas (morto em março de 2001),
não tem dotação orçamentária
própria e trabalha com déficit de
profissionais e insumos.
Desde 2003, o centro realizou
131 fertilizações in vitro (FIV). Do
total, 54 foram feitas neste ano,
uma média de cinco por mês. A
previsão inicial era de 40 mensais.
Segundo a coordenação do serviço, há uma fila de 600 casais
aguardando o tratamento.
Mas o número não reflete a demanda. Dez dias após a inauguração, que contou com a presença
do governador Geraldo Alckmin,
o local tinha uma fila de 8.000 casais inférteis. Do total, 52% eram
mulheres acima de 40 anos.
Mas, no ano passado, argumentando que seria necessário priorizar os "casos viáveis", o HC começou a dispensar as mulheres acima de 40 anos -faixa etária em
que as chances de gravidez caem
para 5%-, apesar de o comitê de
bioética da instituição ter vetado o
limite de idade.
O caso da bancária Márcia, 39, é
um exemplo. Paciente da clínica
de ginecologia do HC, no último
dia 21 ela foi informada de que
não poderia se inscrever no centro de reprodução porque o limite
de idade era de 38 anos. "Ainda
fui obrigada a escutar que não valia a pena investir em mim. Me
senti um lixo", desabafa Márcia.
O mesmo ocorreu em outubro
com a diarista Aparecida Potente,
42, que esperava desde 2001 a
chance de fazer uma FIV no serviço (leia texto nesta página).
Nilson Roberto de Melo, responsável pela clínica ginecológica
do HC, afirma desconhecer a
orientação dada à paciente, mas
confirma que a situação do centro
"está muito confusa".
O recém-nomeado diretor do
centro de reprodução, Miguel
Srougi, professor titular de urologia do HC desde junho, não esconde o descontentamento. "Está
um caos", resume. Para ele, o centro tem vícios de origem "quase
incontornáveis" e precisará ser
repensado para se tornar viável.
A superintendência do HC foi
questionada, por e-mail, sobre a
crise, mas se limitou a enviar os
números dos atendimentos.
O problema esbarrou, até 2004,
em uma briga política entre as clínicas de urologia e de ginecologia,
coordenadas então por Sami
Arap e José Aristodemo Pinotti,
respectivamente. Hoje, aposentados, ambos negam o conflito.
Sami Arap foi o mentor do centro de reprodução. Na época, havia um outro serviço de reprodução humana no HC, chefiado por
Pinotti. O local, com uma fila de
2.000 casais, estava praticamente
parado por falta de verbas.
Com a criação do centro, a direção do HC decidiu que as filas seriam unificadas e a gestão do local
ficaria um ano a cargo da ginecologia (Pinotti) e outro sob coordenação da urologia (Arap).
As divergências foram muitas.
A equipe de Sami Arap, chefiada
pelo urologista Jorge Hallak, defendia o estabelecimento de critérios técnicos para atender o casal
infértil, como o limite de idade da
mulher. Acima de 40 anos, as
chances de gravidez são de 5%, há
maior risco de aborto e má-formações. "Como os recursos públicos são limitados, a idéia era
priorizar os casais com mais
chances de gravidez", diz Hallak.
Ele também defendia que o centro atendesse pacientes privados
como forma de subsidiar os casais
do SUS, já que o governo federal
não custeia a FIV. Cada ciclo do
tratamento custa ao HC R$ 3.800.
Já Pinotti entendia o contrário.
Chegou a enviar cartas para todas
as inscritas no programa garantindo que seriam atendidas independentemente da idade e foi
contra atender particulares.
"Desde a origem, esse centro esbarrou em interesses pessoais e
políticos. É uma realidade triste e
perversa. Mexeu-se com o que há
de mais delicado no ser humano,
que é o sentimento da maternidade e da paternidade", diz Srougi.
Sua proposta é submeter a situação do centro a uma equipe de
empresários e administradores
para que opinem sobre a melhor
forma de geri-lo. "Precisamos
aprender como atuar no caos."
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