São Paulo, Sexta-feira, 27 de Agosto de 1999
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CIÊNCIA
Genética confirma dieta antienvelhecimento

MARCELO LEITE
especial para a Folha

O envelhecimento é uma ferida que não se fecha, mas pode ser tratada com... dieta. Batizada como "restrição calórica", a única terapia aceita contra a degeneração do organismo começa a ser explicada com alta tecnologia genética.
"No nível das moléculas, o envelhecimento normal se parece com um estado de agressão ("injury') crônica", resume Tomas Prolla, um dos autores de trabalho na revista norte-americana "Science" de hoje que tem tudo para tornar-se um clássico.
Em primeiro lugar, a equipe capitaneada por ele e Richard Weindruch, da Universidade de Wisconsin em Madison (EUA), descobriu ou confirmou alguns processos químicos básicos do envelhecimento. A questão vinha sendo objeto de intenso debate.
Depois, mostrou que a restrição calórica consegue cortar muitos elos na corrente da decadência fisiológica. Apesar de ter eficácia reconhecida, não se sabia como a parcimônia alimentar prorroga a expectativa de vida.
Por fim, Prolla e Weindruch lançaram mão dos "DNA arrays" (chips de DNA). Essas matrizes de ácido desoxirribonucléico -a molécula-alfabeto do código genético- estão revolucionando a interpretação de genomas, bibliotecas de genes reunidas no núcleo de cada célula.
O chip de DNA permite detectar quais genes estão sendo mais solicitados num organismo e, mais que isso, medir essa atividade.
Cada gene conhecido do organismo -no caso da pesquisa de Wisconsin foram 6.347 genes de camundongo, entre 5% e 10% do total da espécie- é colocado em um lugar determinado no arranjo, 20 cópias para cada um. Quando o material genético extraído do animal entra em contato com a placa, "gruda" naqueles pontos que contêm a mesma sequência, deixando uma marca.
Funciona como um gabarito de prova. Um laser faz a leitura, identificando quais locais e quantas cópias foram ativados.
O material genético posto sobre a placa é RNA, ácido ribonucléico. Ele tem a função de levar a informação dos genes (DNA) para os setores da célula que fabricam as proteínas necessárias ao organismo. Muitas cópias de uma dada sequência de RNA são um sinal de que o gene e a proteína correspondentes estão em alta.

Poluentes químicos
O time de Wisconsin comparou RNA de cobaias com 5 e 30 meses. Mostrou que nas mais velhas há intensa produção de proteínas relacionadas à poluição química gerada pelo próprio funcionamento do organismo. São poluentes como radicais livres, que danificam células e genes -a agressão contínua a que se referiu Prolla.
A célula passa a funcionar imperfeitamente, o que reduz a disponibilidade de energia. A técnica do "DNA array" revelou que são muito menos exigidos nos ratinhos de meia-idade aqueles genes envolvidos na geração de energia.
Prolla e Weindruch não estacionaram aí. Compararam também camundongos de 30 meses submetidos a dieta normal e a outra de baixas calorias (24% a menos). Descobriram que o regime é capaz de suspender inteiramente um terço do padrão de ativação/ desativação de genes associado com envelhecimento (além de suprimir parcialmente outro terço).
No centro de tudo parece estar o processamento de proteínas. Quanto mais proteína se ingere, mais poluição química, que por sua vez danifica outras proteínas.
Com o acelerado envelhecimento da população, que não é mais prerrogativa de países ricos, essas descobertas interessam ao filão de mercado voltado para a qualidade de vida de idosos. Tanto é que Prolla e Weindruch já encaminharam pedido de patente para o uso dos chips de DNA na pesquisa da velhice.



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