São Paulo, domingo, 23 de outubro de 2005
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Micro/Macro Monstros do passado
MARCELO GLEISER
Quando olhamos para o céu, vemos as estrelas próximas o suficiente para detectarmos sua luz com nossos olhos. Se nos limitássemos a essa visão do cosmos, seríamos bastante míopes. Com telescópios, instrumentos que coletam a luz muito mais eficientemente do que nossos olhos, podemos ver objetos muito mais distantes. A galáxia mais próxima, Andrômeda, está a aproximadamente 2 milhões de anos-luz daqui. Quando olhamos para ela com um telescópio, vemos como era há 2 milhões de anos, quando o gênero Homo dava seus primeiros passos na África. O astrônomo extragaláctico é um viajante no tempo, procurando por objetos cada vez mais longínquos, tentando reconstruir o passado do Universo. Hoje, sabemos que o Universo teve um passado. Sabemos que existe há 13,8 bilhões de anos. Esse fato, junto com o fato de a luz ter uma velocidade finita, significa que temos um horizonte, uma fronteira além da qual não podemos enxergar. Dada a idade do Universo, nosso horizonte fica a 13,8 bilhões de anos-luz. O que existe além desse horizonte? Não sabemos. Mas suspeitamos que apenas mais Universo, mais galáxias e estrelas. Feito numa ilha: sabemos que além do horizonte o mar continua. Com telescópios ultrapotentes como o Telescópio Espacial Hubble, astrônomos são capazes de ver os primeiros objetos que se formaram no início da história cósmica. Começando com a nossa casa: a Via Láctea é uma galáxia grande, com 100 mil anos-luz de diâmetro e em torno de 300 bilhões de estrelas. Sua idade, a julgar por suas estrelas mais velhas, é calculada em 10 bilhões de anos. Ou seja, nossa galáxia se formou quando o Universo tinha uns 3,8 bilhões de anos. Uma das questões mais importantes da astronomia é como e quando as galáxias se formaram. Até recentemente, o mecanismo que explica a formação de galáxias seguia o esperado: pequenas flutuações na distribuição de matéria (principalmente hidrogênio) condensavam-se e cresciam devido à própria gravidade, agregando mais matéria no processo. Adicionando-se rotação, as partes mais densas formaram as primeiras estrelas, que, brilhando intensamente, causaram novas instabilidades, que formaram outras. O mecanismo é do menor para o maior: uma galáxia como a nossa demora para evoluir. Observações recentes parecem contradizer isso: galáxias gigantescas, monstros cósmicos maiores do que a Via Láctea, parecem já ter existido em abundância quando o Universo tinha 1 bilhão de anos. Apesar de ser cedo para concluir que os modelos de formação de galáxias estão errados, fica uma lição de como funciona a ciência: se os dados contrariam a teoria, ela deve ser revisada, por mais bela que seja. Marcelo Gleiser é professor de física teórica do Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro "O Fim da Terra e do Céu" Texto Anterior: Cérebro em movimento Próximo Texto: Ciência em Dia - Marcelo Leite: Embriões desarmados Índice |
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