São Paulo, domingo, 20 de maio de 2001

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Periscópio

Prevenção química do câncer

José Reis
especial para a Folha

Em "Science" (vol. 259, pág. 633), Brian E. Henderson e colaboradores escreveram sobre a quimioprevenção hormonal do câncer feminino. As estatísticas mostram que o uso de anticoncepcionais orais durante os últimos 30 anos acarretou grande declínio na incidência dos cânceres de ovário e endométrio (revestimento interno do útero), fato que era previsível. Embora não haja registro de ação semelhante sobre o câncer mamário, é possível desenvolver alternativas que protejam contra os três tipos de tumor. Já está em andamento um ensaio clínico para verificar essa possibilidade. Além disso, outros agentes quimiopreventivos, como o tamoxifen, estão em ativo estudo para esse fim.
Nos Estados Unidos, mais de 20% dos novos cânceres relacionados com hormônios ocorrem em homens. Em mulheres, esse índice chega a 40%. Como os hormônios endógenos afetam diretamente o risco desses tumores, a ministração de anti-hormônios, que reduzem o teor de divisão do tecido importante em cada caso, passou a ser intensamente focalizada nas pesquisas de prevenção do câncer. Entre eles estão os anticoncepcionais orais, os agentes estimuladores dos hormônios hipofisários que libertam gonadotrofina (substância que age sobre os órgãos reprodutores), os progestonais (produtos sintéticos semelhantes à progesterona, o hormônio da reprodução), o tamoxifen e o finasteride, que age no câncer da próstata.
Está muito bem documentada a ação preventiva dos anticoncepcionais orais sobre o câncer do endométrio. Há redução de cerca de 11,7% no risco desse câncer. A proteção dura pelo menos 15 anos após a cessação do anticoncepcional.
O principal determinante do risco do câncer ovariano é a parição, cujo aumento decresce o risco do câncer. A explicação está associada à ovulação, pois o aumento do risco do câncer ovariano cresce em cada ovulação. E isso porque é no tecido em que o câncer se desenvolve que ocorre o impulso reparador da superfície ovariana lesada pela expulsão do óvulo. Dados indicam que o desenvolvimento dos folículos em que se formam os óvulos e que se rompem para a libertação desses é o principal determinante do câncer ovariano.
As pesquisas sobre o uso da pílula e o câncer mamário têm resultados confusos, mas de um modo geral é possível afirmar que as preparações comuns que reúnem estrogênio e progestogênio não protegem contra esse tipo de tumor. Tais misturas são planejadas para atingir dois objetivos bem definidos e relacionados: evitar a gravidez pela suspensão da ovulação e contrabalançar os efeitos da baixa do teor de estrogênio no sangue causada pela inação do ovário.
Alternativa útil nesses casos é representada pela ministração de estimuladores do hormônio liberador da gonadotrofina. Calcula-se que esse regime poderá reduzir o risco do câncer mamário em 31% quando usado por cinco anos, em 47% quando usado por dez anos e 70% quando por 15 anos.
O tamoxifen tem sido precioso adjuvante no tratamento do câncer mamário. Está provado que em muitos casos ele previne o aparecimento do tumor na outra mama. Acha-se atualmente em andamento nos Estados Unidos um ensaio de quimioprevenção pelo tamoxifen em mulheres com elevado risco de câncer mamário. Henderson e colaboradores avaliam que a droga fará desaparecer a lenta e continuada ascensão da incidência de câncer após os 50 anos.


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