São Paulo, Domingo, 21 de Novembro de 1999
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CELSO PINTO
Os dólares para o BC intervir

O Banco Central calcula que poderia gastar até US$ 4,6 bilhões em intervenções no câmbio neste mês e US$ 3,9 bilhões em dezembro, os dois meses mais críticos em termos de fluxo de dólares. Por que não intervir com mais vigor no mercado?
Em abril, bastou o BC, junto com o FMI, anunciar que teria até US$ 8 bilhões para gastar no segundo trimestre no câmbio para valorizar o real. A cotação do dólar, que havia chegado perto de R$ 2,20, caiu até perto de R$ 1,65.
Agora, apesar do anúncio de uma ampla margem de intervenção, a cotação continua próxima a R$ 1,95. Para quem acha esse nível razoável, basta lembrar a conta feita pelo banco CSFB-Garantia. Tomando o câmbio real (descontada a inflação) do primeiro semestre de 94 como base, a R$ 1,95 o real está 25% abaixo daquele nível. Quer dizer: se o primeiro semestre de 94 indicava um nível de câmbio competitivo, então o real está 25% mais desvalorizado do que seria necessário.
A verdade é que, no segundo trimestre, o BC fez mais do que apenas anunciar que tinha US$ 8 bilhões para o câmbio. Como lembra um trabalho do ex-presidente do BC Affonso Celso Pastore, o governo gastou cerca de US$ 3 bilhões dos US$ 8 bilhões para ajudar a conter o câmbio.
Desta vez, o BC está muito mais cauteloso nas intervenções, até agora, mínimas. O mercado, por sua vez, está mais prudente em apostar na valorização do real, porque não sabe ao certo se o "bug do milênio" levará, de fato, a uma forte escassez de dólares em dezembro. Em abril, a aposta no real era mais clara.
O excesso de prudência, por enquanto, não se justificou. O mercado internacional continua aberto e a alta de juros americana sob controle. A margem de intervenção até dezembro parece mais do que suficiente para a travessia, sem comprometer o piso de reservas líquidas acertado com o FMI.
É uma situação totalmente distinta da do segundo trimestre, quando o mercado externo estava fechado para o Brasil e o buraco externo parecia assustador. Em outubro, um dos piores meses em termos de fluxo de obrigações externas, as contas do BC mostram que o buraco no mercado de câmbio foi de exatos US$ 578 milhões. Neste mês, por enquanto, o saldo é positivo.
Quer dizer, toda essa pressão sobre o câmbio se explica por um desequilíbrio pequeno na oferta de dólares. No regime anterior de câmbio, para tentar, inutilmente, defender o real, o BC chegou a gastar até US$ 1,8 bilhão num único dia. A timidez atual do BC só faz sentido se houver dúvidas se as contas externas, de fato, vão melhorar a partir de janeiro.
Nas contas do BC, as amortizações, que chegarão a US$ 9,1 bilhões neste trimestre, cairão para US$ 3,8 bilhões no primeiro trimestre de 2000. A margem de intervenção do BC no câmbio, por sua vez, é calculada em US$ 6 bilhões em janeiro, US$ 5,1 bilhões em fevereiro e US$ 3,1 bilhões em março.
O déficit externo em conta corrente, nos 12 meses encerrados em outubro, chegou a US$ 25,5 bilhões, uma queda de US$ 8,1 bilhões em relação a dezembro, antes da desvalorização. O investimento direto externo, nos 12 meses até outubro, chegou a US$ 29,4 bilhões, ou seja, cobriu com folga o déficit externo.
A balança comercial, em dez meses, melhorou US$ 5,7 bilhões. A tendência é "animadora", como diz a Funcex. A quantidade exportada ("quantum") subiu 17% em outubro, comparado a outubro de 98. No ano, ela é positiva em 3,3%, sendo que, nos semestre que encerra em outubro, comparado ao semestre anterior, o aumento é de 5,4%.
O índice de "quantum" já é 13% superior à média de 98. Mais importante: o "quantum" dos manufaturados, embora ainda apresente queda de 1,5% no ano, vem crescendo sem parar. A tendência do índice da Funcex aponta para uma forte alta, que já supera os últimos três anos.
Os preços de exportação acumulam queda de 12% no ano, mas, desde abril, já bateram no piso. Em outubro, a queda nos preços foi menor e, pela primeira vez no ano, o índice do mês superou o do mês anterior.
As importações ampliaram a queda em outubro (18,3%), em relação a outubro de 98, apesar da recuperação econômica. O que reforça o argumento dos que atribuem a queda nas importações não só à recessão, mas também, e de forma mais permanente, à substituição de importações.
Em resumo, existem boas indicações no fluxo de capitais e investimentos e sinais graduais mas persistentes de melhora na balança comercial e na conta corrente. E há dólares para suprir uma escassez temporária, se o BC quiser usá-los.



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