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CASO NACIONAL
Perícia de anotações de lucros fictícios mostra que letra é de ex-funcionário da KPMG e então diretor do banco
Laudo revela papel de auditor na fraude
FREDERICO VASCONCELOS
da Reportagem Local
Documentos anexados como
provas no processo do Banco Nacional confirmam o envolvimento
de ex-funcionários da KPMG Peat
Marwick nas fraudes e reforçam a
suspeita de conivência da auditoria externa do banco.
Um desses documentos é um
formulário de contabilidade, manuscrito a lápis, com cálculos dos
dividendos (benefícios distribuídos aos acionistas) sobre os lucros
fictícios do banco no segundo semestre de 1990.
O impresso tem o timbre da
KPMG. No cabeçalho, ao lado da
inscrição da firma de auditoria, o
espaço destinado a "cliente" foi
preenchido com o nome do Banco
Nacional.
Perícia grafotécnica comprovou
que os cálculos e a assinatura no
formulário foram produzidos pelo
punho de Antônio Luiz Feijó Nicolau, então diretor de Obrigações
Corporativas do Banco Nacional.
Feijó é ex-funcionário da
KPMG, tendo auditado o próprio
Nacional nos anos de 1985 e 1986.
Ele ingressou no banco em 1987 e
era subordinado a Clarimundo José de Sant'Anna, denunciado como mentor da fraude do Nacional.
Sant'Anna foi o único a confessar
o crime.
Feijó foi acusado de elaborar balanços forjados. Entre as suas atribuições, figurava o relacionamento com os órgãos reguladores e
com o auditor independente do
banco, Marco Aurélio Diniz Maciel, sócio da KPMG.
João Luís Aguiar de Medeiros e
Celso Cintra Mori, advogados da
KPMG, ouvidos pela Folha, negam que Maciel tenha sido conivente ao avalizar os balanços com
resultados fictícios do Nacional
(leia entrevista nesta página).
Medeiros e Mori também refutam a hipótese de promiscuidade
entre ex-funcionários da KPMG e
a auditoria externa do banco. Eles
alegam que desconhecem os documentos com timbre da KPMG
que estão nos autos.
O documento e a íntegra do laudo pericial n� 39.373 (exame grafotécnico) estão nas folhas 2.662 a
2.672 do processo n�
96.0026382-5, do Nacional.
A Folha foi autorizada a consultar os seis volumes dos autos principais, na 4� Vara da Seção Judiciária do Estado do Rio de Janeiro.
Não foram permitidas cópias do
laudo e do formulário.
Balanços falsos
O cálculo dos dividendos não é o
único documento firmado por
Feijó em formulários da KPMG.
Ele também usou papéis com
timbre da KPMG para alterar registros de contas -inflando artificialmente o ativo (patrimônio) do
banco- e para rascunhar balanços forjados.
Para isso, Feijó contou com a
ajuda de outro ex-funcionário da
KPMG, Márcio Rômulo Pereira,
especialista em auditoria, que ingressou no banco em 1990.
Essas irregularidades aconteciam, segundo denúncia do Ministério Público Federal, com a
omissão de Maciel, auditor da
KPMG, que avalizou a regularidade dos balanços fraudados.
Os procuradores Silvana Góes e
Rogério Nascimento denunciaram Feijó e Pereira, por gestão
fraudulenta e formação de quadrilha, no processo que alcança
ex-controladores e administradores do banco dos Magalhães Pinto.
Maciel foi denunciado como
co-autor do crime de gestão fraudulenta (ele não está entre os acusados de formação de quadrilha).
Segundo o Ministério Público
Federal, o auditor da KPMG "foi
denunciado porque seu comportamento está diretamente vinculado à ação criminosa imputada aos
demais participantes".
Ordens superiores
Ao ser reinquirido na Polícia Federal, Feijó disse que "a função de
auditoria externa era revisar as demonstrações financeiras e notas
explicativas (itens do balanço) que
eram elaboradas na Diretoria de
Obrigações Corporativas". Ou seja, na sua diretoria.
Durante o segundo depoimento,
foram apresentados a Feijó resumos e rascunhos, manuscritos em
papel da KPMG, relativos a lançamentos do balanço de 1988.
Está nos autos: "Perguntado se
reconhece como de sua autoria o
rascunho do fechamento do balanço em 15 de janeiro de 1989,
produzido em papel próprio da
KPMG, (Feijó) respondeu que,
embora tenha manuscrito tal documento, que ora lhe é exibido,
não é de sua autoria, pois o manuscreveu para atender solicitação superior".
Ele disse que "não se recordava
de quem tinha passado tais informações".
Contas fictícias
Feijó foi denunciado como responsável pela alteração de procedimentos contábeis do Nacional
para manter 652 contas correntes
fictícias, agrupadas sob o código
"Natureza 917".
Essas contas foram originadas
de empréstimos não pagos por pequenas empresas e mantidos como se fossem créditos normais,
com vencimentos alterados para
permitir o acréscimo de juros e
correção.
Auxiliado por Pereira, Feijó calculava os valores a serem acrescidos nos saldos das chamadas contas "917", que inflaram o balanço, gerando um passivo a descoberto (dívidas sem cobertura) no
total de R$ 9,3 bilhões.
Segundo a denúncia, "os dados
falsos relativos às contas "Natureza 917" sempre estiveram acessíveis ao auditor (Maciel), porquanto figuravam no Sistema Nacional de Contabilidade, instrumento natural de avaliação da auditoria externa".
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