São Paulo, domingo, 10 de abril de 2005

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É TUDO VERDADE

Longa retrata a vida de artista goiano

Em "Arte Bruta", Walter Carvalho reencontra o "primitivo" Moacir

TEREZA NOVAES
DA REPORTAGEM LOCAL

Em abril de 1988, os irmãos Walter e Wladimir Carvalho percorriam o Planalto Central. Produziam "Paisagem Natural", filme sobre a beleza local no qual repetiam a dobradinha fotógrafo e diretor, iniciada em "O País de São Saruê", de 1971.
Decidiram fazer uma pausa para comer num povoado entre a Chapada dos Veadeiros e Alto Paraíso (GO). "Entramos numa vendinha, e, sobre o balcão, havia um desenho muito original, que chamou a minha atenção. Não era uma cópia. O dono do lugar me disse onde morava o artista, e fui até lá conhecê-lo", lembra.
Walter encontrou Moacir, tema do documentário "Moacir - Arte Bruta". Artista "primitivo" ("na falta de palavra melhor para defini-lo", justifica Walter), o homem negro, esquizofrênico, de 28 anos, habitava uma choupana de palha.
"Havia desenhos por todos os lados, mas nenhum na parede, mesmo porque nem havia paredes. Tudo aquilo que me interessava, enquanto ele dizia: "Leve, leve". Acabei comprando alguns."
Esse primeiro contato foi registrado pela câmera fotográfica de Walter, seu "bloquinho de anotações". Ele foi embora sabendo que queria transformar em filme a história de Moacir.
Dezesseis anos se passaram até o reencontro entre os dois. Nesse tempo, Walter se consagrou como diretor de fotografia, trabalhou em mais de 25 longas -entre eles, "Lavoura Arcaica" e "Central do Brasil"- e co-dirigiu "Janela da Alma".
Em 2003, muita coisa havia mudado no vilarejo de construções esparsas, que ganhou status de cidade, batizada de São Jorge. A condição de Moacir também havia melhorado: passou a viver numa casa de alvenaria, com paredes ornamentadas por seus desenhos.
Moacir não se lembrava da visita de Walter. As fotos, feitas anos antes, foram fundamentais para estabelecer um novo contato.
O registro fotográfico acabou se tornando importante também para a narrativa do documentário. Moacir mostra a localização de sua antiga casa e repete a mesma pose ao lado das irmãs.
São as entrevistas com pessoas da comunidade e com os familiares, mãe, pai e irmãs, que vão apresentando Moacir; é revelada uma incrível sabedoria da vida.
Penetrar na vida de Moacir durante os seis dias que duraram as filmagens exigiu um bocado de delicadeza. "Ele é muito arredio e tem crises. Às vezes, fica uma semana sem comer nem falar. Fica amuado, como se diz."
Por isso o diretor optou por uma equipe "mínima", de cinco pessoas. "Dentro da casa ficavam só eu, o técnico de som, o fotógrafo e o assistente. Trabalhamos com muito cuidado", relata.
Para o longa, Walter promoveu uma reunião entre Moacir e o artista Siron Franco. "Siron é goiano, e há algum viés que os une. O trabalho de Siron de alguma maneira fala com o de Moacir", diz.
Siron já conhecia a obra de Moacir e havia organizado uma exposição dele em uma universidade em Goiânia. "Queria ver o que aconteceria no encontro entre um pintor "primitivo" e um "erudito'", revela o diretor.
No encontro, os dois fazem um desenho em dupla. "De repente, Siron pega um papel e o convida para brincar, o desenho dele abraça o de Siron", conta.
"O desenho ficou comigo. Todos os que foram feitos no filme eu comprei, é uma forma de pagar a ele pela generosidade de me receber. Ele não tem essa noção, mas eu tenho", explica o diretor.


Moacir - Arte Bruta Direção: Walter Carvalho
Quando: hoje, às 18h, no MIS


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