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13/03/2004 - 07h34

Giuseppe Ungaretti retorna a seu "nada inexprim�vel"

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MARCELO COELHO
colunista da Folha

Entre a flor que se colheu e a flor que nos foi dada, disse o poeta Giuseppe Ungaretti (1888-1970), est� "o inexprim�vel nada". Os versos desse poema curt�ssimo, que est� em seu livro "A Alegria", poderiam simbolizar as dificuldades de toda tradu��o po�tica. Por mais exata que seja a semelhan�a entre o poema original e a tradu��o, entre a flor colhida e a flor ofertada, h� sempre um "nada inexprim�vel", intervalo de tempo e espa�o, a separ�-las.

Em italiano, o poema de Ungaretti � assim: "Tra un fiore colto e l'altro donato/ l'inesprimibile nulla". Na tradu��o integral de "A Alegria", feita por Geraldo de Holanda Cavalcanti (Record, 2003), lemos: "Entre uma flor colhida e outra ofertada/ o inexprim�vel nada". A rima, que n�o existia no original, talvez soe um tanto f�cil; mas o efeito dos versos sobre o leitor resulta imediato.

J� o poeta Haroldo de Campos (1929-2003), em sua tradu��o, preferiu evitar a rima: "Entre uma flor colhida e o dom de outra/ o nada inexprim�vel". O poema se torna mais complexo, talvez, j� que "o dom de outra" sugere uma flor ainda futura; pensamos na possibilidade de que uma flor venha a ser dada mais tarde, e n�o numa j� recebida.

Seja como for, a poesia de Ungaretti sempre d� a impress�o de que, quanto mais curta e sint�tica, maior a sua for�a sugestiva, e maior o abismo que abre para o leitor. Ainda em tradu��o de Haroldo de Campos, eis outro poema, agora da d�cada de 50, que parece duplicar o anterior: "Daquela estrela � outra/ a noite se encarcera/ em turbinosa vazia desmesura. // Daquela solid�o de estrela/ �quela solid�o de estrela".

"Daquela Estrela � Outra" � tamb�m o t�tulo do belo livro organizado por L�cia Wataghin para a Ateli� Editorial, que re�ne tradu��es de Ungaretti feitas por Haroldo de Campos e Aurora F. Bernardini, al�m de ensaios curtos sobre a obra do poeta italiano. Um deles, escrito pelo pr�prio Campos em 1984, comenta admiravelmente o poema das estrelas, aproximando-o dos versos do rom�ntico Giacomo Leopardi (1798-1837) e do simbolista St�phane Mallarm� (1842-1898).

Se os poemas de "A Alegria" j� s�o conhecidos do leitor brasileiro, merece especial destaque o fato de que a colet�nea bil�ngue inclui, na �ntegra, um outro livro de Ungaretti --"A Dor", com poemas escritos entre 1937 e 1946.

Traduzidos por Aurora F. Bernardini, correspondem a um per�odo terr�vel na vida do poeta: n�o s� a guerra, mas a morte do seu irm�o e do seu filho conferem aos versos um peso quase insuport�vel. Sonoridades lit�rgicas, exclama��es pat�ticas, refer�ncias ao imagin�rio crist�o e � paisagem brasileira (o poeta morou no Brasil de 1936 a 1942) se alternam com o conhecido poder de Ungaretti para a extrema s�ntese.

A essa concis�o, e a essa enorme dor, parecem referir-se os seguintes versos de "Tudo Perdi": "A vida mais n�o �,/ Detida no fundo da garganta,/ Que uma rocha de gritos".

N�o � preciso dizer mais.

Avalia��o:

Daquela Estrela � Outra
Autor:
Giuseppe Ungaretti
Tradu��o: Haroldo de Campos e Aurora F. Bernardini
Editora: Ateli� Editorial
Quanto: R$ 54 (230 p�gs.)
 

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