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13/11/2002 - 06h00

Eric Hobsbawm lan�a seu olhar sobre o s�culo 20

SYLVIA COLOMBO
Editora-adjunta de Ilustrada da Folha

Eric Hobsbawm, 85, se define como uma raridade estat�stica. Nascido no ano da Revolu��o Russa (1917) -e comunista convicto desde a adolesc�ncia-, o historiador viu ser constru�da diante de seus olhos quase toda a hist�ria do s�culo que chama de "mais extraordin�rio e terr�vel" da trajet�ria da humanidade.

A autobiografia "Tempos Interessantes", que chega ao Brasil, comp�e-se do que para ele s�o lembran�as pessoais, mas, para grande parte do restante das pessoas, j� virou assunto de livros escolares.

Entre outras passagens, lembra-se, por exemplo, do "frio dia de inverno" em que Hitler chegou ao poder, assim como da Crise dos M�sseis de Cuba, em 62, durante a qual se deu seu casamento.

O livro refaz sua trajet�ria intelectual ao mesmo tempo em que descreve suas in�meras andan�as por um planeta em transforma��o. Por sorte ou intui��o, Hobsbawm muitas vezes esbarrou na pr�pria hist�ria, como quando entrou ilegalmente na Espanha e foi parar numa cidade tomada pelos anarquistas (Puigcerd�) em plena Guerra Civil. Ou quando visitou uma Col�mbia cindida pelo conflito pol�tico, nos anos 60, e em que se formavam as guerrilhas marxistas que dariam origem �s Farc (For�as Armadas Revolucion�rias da Col�mbia).

"Enfeiti�ado" pela Am�rica Latina desde a Revolu��o Cubana, Hobsbawm aqui esteve pela primeira vez na d�cada de 60. Voltaria muitas outras, sempre atento �s esquerdas do continente.

Esteve com Salvador Allende no Chile, perambulou pelos Andes com o pensador peruano Jos� Maria Arguedas ("Os Rios Profundos"), torceu pela queda do PRI (Partido Revolucion�rio Institucional) no M�xico e, por fim, apostou suas fichas no PT brasileiro como esperan�a para a esquerda latino-americana.

Otimista com a vit�ria do petista Lula � Presid�ncia do Brasil, Hobsbawm, por�m, v� motivos para lamentar. "N�o foi como n�s pens�vamos", diz. O historiador defende que a revolu��o "esperada, e em tantos pa�ses necess�ria", n�o aconteceu e n�o acontecer� agora na Am�rica Latina.

Instado, h� anos, a justificar as raz�es pelas quais ainda acredita no comunismo, diz que o livro n�o � uma explica��o. "A hist�ria poder� julgar minhas opini�es pol�ticas -e na verdade em grande parte j� as julgou." Prefere dizer que "Tempos Interessantes" � uma mensagem para um mundo que cr� precisar mais do que nunca de historiadores c�ticos.

Leia abaixo a entrevista que o historiador concedeu � Folha, de Londres, por telefone.

Folha - O sr. diz que a Am�rica Latina foi muito importante em sua forma��o. Acha que seria um historiador diferente se nunca tivesse posto os p�s aqui?

Eric Hobsbawm -
O fato de o continente ser um fant�stico laborat�rio de transforma��es hist�ricas foi muito marcante para minha trajet�ria intelectual. Tenho certeza de que os historiadores do futuro podem aprender tanto sobre a hist�ria com a Am�rica Latina como Darwin aprendeu sobre o homem, tamb�m a partir da Am�rica Latina, devido � extraordin�ria riqueza social e biol�gica deste continente.

Folha - O sr. diz que o surgimento do PT no Brasil e a queda do PRI no M�xico foram as duas esperan�as de transforma��o pol�tica na Am�rica Latina depois da Revolu��o Cubana. O que o sr. achou da vit�ria do PT nas elei��es?

Hobsbawm -
O PT � uma for�a nova na hist�ria do Brasil. O fato de ter se firmado nacionalmente e se ampliado a partir de seu n�cleo inicial de trabalhadores caracteriza a unicidade de seu sucesso. Ao contr�rio de muitos partidos trabalhistas europeus, mostrou que tem potencial para ser um partido nacional sem deixar de ser o partido dos pobres. Se isso vai transformar a pol�tica no Brasil, ainda n�o se pode dizer. No caso do PRI, infelizmente, provou-se que nem sempre a morte do velho significa o nascimento do novo.

Folha - O sr. conheceu Lula pessoalmente. O que diria a ele agora?

Hobsbawm -
N�o creio que ele tenha tempo para falar comigo hoje, mas lhe diria que sua vit�ria � um dos poucos eventos do come�o do s�culo 21 que nos d� esperan�a para o resto deste s�culo.

Folha - O sr. ainda acredita numa revolu��o na Am�rica Latina?

Hobsbawm -
N�o no sentido de uma ruptura em que uma popula��o assuma uma mudan�a pol�tica de peso. A Am�rica Latina foi "revolucionada", n�o � o mesmo continente que conheci, mas isso n�o veio de baixo. Uma mudan�a popular ainda pode acontecer, mas n�o ser� mais pela revolu��o, talvez por meios democr�ticos.

Folha - O que acha que guiar� os intelectuais do s�culo 21?

Hobsbawm -
A familiaridade com as teorias da era da revolu��o das comunica��es e com a cultura globalizada. Acho, e espero, que a heran�a dos debates da Guerra Fria seja esquecida em nome de algo mais importante. Mas, infelizmente, suspeito que os jovens no s�culo 21 ser�o menos politizados, pois ter�o menos expectativas em rela��o ao Estado.

Folha - Seu livro e "Koba the Dread", de Martin Amis, foram lan�ados na mesma �poca. O dele denunciou crimes do stalinismo. O seu � a hist�ria de um homem que sempre acreditou no projeto socialista. Os dois livros se op�em?

Hobsbawm -
O livro de Amis n�o prop�e uma vis�o do s�culo 20. Foi escrito por um homem que nunca pensou muito sobre o assunto e n�o sabia nada sobre ele at� recentemente. N�o � um livro original e se baseou apenas em literatura de segunda m�o. Amis tem pouco entendimento sobre hist�ria e sobre a R�ssia.

Mas entendo que pessoas como eu, que prestaram pouca aten��o aos horrores do stalinismo, devem dar boas-vindas a qualquer den�ncia desse tipo. Sei que deveria ter dado mais aten��o a essas coisas do que fiz no passado.

TEMPOS INTERESSANTES - UMA VIDA NO S�CULO 20
Autor:
Eric Hobsbawm
Editora: Companhia das Letras (S�o Paulo, 2002)
Pre�o: R$ 45 (461 p�gs.)

 

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