Buscando preparar os atletas brasileiros para os Jogos de Tóquio-2020, o Comitê Olímpico do Brasil (COB) fechou uma parceria com a Vita Care, organização do Instituto Vita, para prestação de assistência médica.
A contratação, no entanto, não passou por concorrência e está sendo questionada pelo comitê de conformidade, órgão vinculado ao conselho de ética da entidade.
Um parecer desse comitê enviado ao presidente do COB, Paulo Wanderley, e ao diretor-geral, Rogério Sampaio, afirma que o processo de escolha da Vita Care, uma organização sem fins lucrativos, teria descumprido o manual de compras da entidade e pode ser questionado pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
Por isso, recomenda não só o cancelamento do acordo e também que a organização fique suspensa de qualquer licitação da entidade por dois anos.
A cobrança pelos serviços ocorreria a cada exame realizado, por exemplo R$ 400 por consulta e R$ 140 por sessão de fisioterapia. O COB afirma que, até o momento, nenhum trabalho foi feito pela Vita Care referente a esse contrato.
Segundo o questionamento do comitê de conformidade, datado do fim de dezembro de 2019, a seleção das empresas que apresentaram propostas realizou-se informalmente pela área médica/técnica da entidade, sem cumprir o rito de processo seletivo designado pelas suas normas.
Questionado, o COB disse que cumpriu as regras do manual de compras, que prevê a dispensa de processos seletivos em certos casos, dentre os quais essa contratação se encaixaria.
Um memorando do COB de janeiro de 2019, que valida juridicamente a escolha da Vita Care, argumenta que o fato de a organização não possuir fins lucrativos e ter como objetivo “a prestação de serviços médicos especializados a atletas” tornaria desnecessária a concorrência.
O documento também expõe as propostas de prestação de serviço de outras três entidades: o hospital Albert Einstein, a Life Square Health Center e a Ultra Sport Science, e faz uma comparação de preços entre elas.
Em nota, o COB declara também ter consultado o Instituto Cohen, o HCOR Medicina Esportiva e o INA Instituto do Atleta, mas não ter recebido resposta. Por isso, fez um "comparativo de preços entre as opções técnicas consideradas ideais para o tratamento de atletas".
Após a publicação da reportagem, a assessoria de imprensa do Instituto Cohen procurou a Folha para negar essa informação. "Informamos que em nenhum momento isso aconteceu, não houve nenhum contato oficial do COB", afirmou Moises Cohen, diretor responsável pelo instituto.
O comitê de conformidade ressalta que o médico Breno Schor, que prestou serviços ao COB de 2012 a 2018 (os últimos 11 meses como celetista), é também sócio-fundador do Vita Care, o que poderia ser entendido como um conflito de interesses e influenciado a escolha.
O COB argumenta que, quando do início do contrato (1º de abril de 2019), o médico já não era empregado da entidade. Na visão do comitê de conformidade, o fato de ele ser funcionário na data de início do processo de seleção já seria o suficiente para indicar possível parcialidade.
De acordo com os questionamentos, que é assinado pelo presidente do órgão, Bernardino Santi, e pelos conselheiros José Vidal e Alexandre Mellão, Schor ainda teria representado o COB de forma irregular e com anuência do diretor de esportes, Jorge Bichara, "o que evidencia a prática de inquestionável assédio moral em relação ao Dr. Roberto Nahon".
Responsável pela área médica, Nahon foi questionado pelo comitê e disse não ter sido consultado para a contratação da Vita Care, nem saber da suposta atuação de Schor. Ele afirma que tampouco tem participado das decisões administrativas da área.
Já o COB declarou que "todos os temas da área médica eram de conhecimento do Dr. Roberto Nahon" e que desconhece "quaisquer contribuições dessa natureza" por parte de Schor.
O intuito da contratação da Vita Care seria suprir uma carência na assistência médica a atletas, sobretudo na cidade de São Paulo (a sede do COB fica no Rio de Janeiro), com foco na preparação tanto para os Jogos Pan-Americanos de Lima, em 2019, quanto para a Olimpíada de Tóquio, que começa em 24 de julho deste ano.
Um membro do conselho de administração do COB requisitou que o assunto fosse tratado na próxima reunião do colegiado, que também é presidido por Paulo Wanderley.
Em resposta, a diretoria da entidade informou que o comitê de conformidade pulou uma etapa e que antes disso precisa submeter seu questionamento a todos os membros do conselho de ética.
"Vale ressaltar que o COB é constantemente auditado pelo TCU e segue as orientações para evoluir no seu processo de contratações, prezando sempre pela melhor gestão de seus recursos", finaliza a entidade.
Em nota, o Instituto Vita ressaltou que a Vita Care é uma organização sem fins lucrativos, que cumpriu as exigências do COB e que está tomando as providências necessárias para esclarecer os fatos. "Informa, ainda, que o Dr. Breno Schor é um dos fundadores do Vita Care. Em sua atividade profissional, ele foi contratado pelo COB até julho de 2018, período não coincidente com a contratação do Vita Care".
A reportagem não conseguiu localizar o médico para comentar o caso.
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