A quadra do Círculo dos Trabalhadores Cristãos, ginásio na Vila Ema, zona leste de São Paulo, era um dos lugares preferidos de Fábio e Fernando na infância, no início da década de 1980. Foi lá que a dupla deu os primeiros passos no futsal, esporte que mais tarde influenciaria o futuro profissional dos dois.
Fábio tinha menos habilidade com a bola nos pés e acabou virando zagueiro. Fernando a tratava com mais carinho e construiu carreira como meia-atacante. Essa diferença acabaria determinante para fazê-los seguirem caminhos parecidos no futebol, mas com perfis diferentes.
Fábio se transformou em Carille, 45 anos, técnico do Corinthians, equipe na qual implementou um estilo marcador, aguerrido, parecido com o jeito que ele se comportava quando era jogador. Já Fernando Diniz, 46, treinador do São Paulo, está no início de uma trajetória no time tricolor no qual tenta executar o seu estilo, com toque de bola e futebol ofensivo.
Neste domingo, às 18h, no estádio do Morumbi, os dois vão se reencontrar no clássico pela 25ª rodada do Brasileiro.
Será a segunda vez que os amigos se enfrentarão. A primeira ocorreu no ano em que Carille estreou como treinador, em 2017, quando o Corinthians venceu o Audax por 1 a 0, pela 1ª fase do Paulista.
A equipe de Osasco foi a que deu projeção a Diniz. Em 2016, ele levou o clube à final do Estadual e terminou na segunda colocação, derrotado pelo Santos --empatou o jogo de ida por 1 a 1 e perdeu o duelo de volta, por 1 a 0.
Mesmo sem o título, o Audax de Diniz conseguiu feitos para se orgulhar. Além de eliminar o São Paulo, nas quartas de final, e o Corinthians, na semi, foi aplaudido pela torcida santista durante a entrega de medalhas, em reconhecimento ao futebol apresentado pelos jogadores.
Desde que saiu da equipe de Osasco, Diniz não conseguiu o mesmo sucesso. Ele ainda busca o primeiro título como treinador e teve passagens instáveis por Atlhetico-PR, onde ficou 6 meses, e Fluminense, 9 meses.
Na equipe são-paulina, ele acredita que seu plano de jogo terá mais chances de êxito. "O meu trabalho é para tirar o melhor dos jogadores. O DNA do São Paulo tem muito a ver comigo. O São Paulo do Telê [Santana]", disse durante sua apresentação, no dia 19 de setembro.
Para fazer os atletas renderem o máximo que podem, além do treinamentos, aposta em trabalhos de orientação psicológica. Ele é formado em psicologia e diz tentar humanizar a profissão do atleta do futebol. "O jogador não é uma máquina feita para só ganhar e dinheiro", afirma.
Carille não é adepto de técnicas de motivação ou psicologia. O foco de seu trabalho está no campo, nos treinos. No futebol, tem um estilo mais pragmático, com o qual tem se sobressaído.
À frente do Corinthians, conquistou um tricampeonato paulista (2017/2018/2019), além do Campeonato Brasileiro de 2017.
Atualmente, a equipe alvinegra é a quarta colocada do torneio Nacional, com 43 pontos, três a mais do que o quinto colocado, o São Paulo. Os dois rivais vêm de empates na última rodada, os alvinegros com o Athletico-PR, 2 a 2, e os tricolores com o Bahia, 0 a 0.
O treinador corintiano já ressaltou as características do amigo. Fez isso, inclusive, ao comentar sobre o início do trabalho de Jorge Sampaoli no Santos, em março deste ano. Apesar de reconhecer a qualidade do argentino, ele se irritava quando ouvia que o estilo dele era inovador para o futebol brasileiro.
"Por características, não deve ter 5% de técnicos que façam o que o Sampaoli faz. Mas [falar em inovação] é falta de respeito com o que o Fernando Diniz fez no Audax", afirmou.
Uma das marcas do amigo do corintiano no time de Osasco era a posse de bola. A equipe chegou à decisão do Estadual de 2016 como a que mais trocou passes certos, com 8.191 toques. O Santos, rival nas finais, era o terceiro da estatística, com 7.189. No segundo e decisivo duelo, mesmo derrotado, o Audax teve 68% de posse.
Na vitoriosa campanha do Brasileiro de 2017, o Corinthians teve um estilo oposto ao do Audax de Diniz. Era uma equipe que fazia um gol e passava o resto do jogo sofrendo pressão dos adversários. Tanto que, das 21 vitórias que teve na competição, 10 foram pelo placar mínimo. No Paulista daquele ano, também vencido pelos corintianos, 6 das 10 vitórias foram por 1 a 0.
Na campanha do vice Estadual, em 2016, o Audax venceu oito jogos e, em todos eles, marcou mais de um gol.
A mentalidade diferente de cada um deles não os impediu de manter uma amizade ao longo dos anos, mesmo com o distanciamento. Alegam a distância e a falta de tempo em decorrência de treinos e viagens para não se encontrarem.
Na adolescência, foram contemporâneos nas categorias de base do Juventus. Curiosamente, nunca se enfrentaram como atletas.
Neste domingo, estarão em lados opostos. Fábio tentará neutralizar o esquema ofensivo do amigo Fernando, que ainda pena para implementar seu estilo do São Paulo.
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