Kathrine Switzer, 70
Kathrine Switzer, 70: Primeira mulher da Maratona de Boston revolucionou o esporte
Elise Amendola/Associated Press | ||
Kathrine Switzer cruza a linha de chegada da maratona de Boston |
Resumo Primeira mulher a correr a Maratona de Boston com uma inscri��o oficial, Kathrine Switzer, 70, voltou a disput�-la 50 anos depois em 17 de abril de 2017. Em 1967, ela foi perseguida pelo diretor da prova, que tentou agarr�-la e tirar o n�mero 261 de suas costas. A imagem de Kathrine sendo acossada tornou-se ic�nica e transformou-a em uma conhecida defensora da igualdade de direitos entre homens e mulheres. As mulheres s� come�aram a correr oficialmente a Maratona de Boston em 1972.
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Em 1967, eu n�o estava tentando ser diferente, apenas queria correr algumas boas milhas. Eu estava treinando bastante e estava me sentindo muito bem. A cada dia corria um pouco mais. Tr�s semanas antes da Maratona de Boston, completei 21 milhas [cerca de 33 quil�metros; atualmente a prova tem 42 quil�metros] com o meu t�cnico, Arnie Briggs, que desmaiou. Logo ele, que dizia que mulheres n�o conseguiriam participar de maratonas por serem muito fr�geis.
No dia da prova, 19 de abril, estava confiante. Cheguei usando top, shorts, batom: estava feminina e queria estar bonita. Mas ent�o ficou frio, come�ou a chover e os competidores vestiram todas as roupas que tinham � m�o. Coloquei cal�as e blusa de moletom, fiquei desapontada e parecida com todos os demais.
Ao lado de outros 700 competidores, estava empolgada. Tinha na minha cabe�a que n�o seria a primeira mulher a completar a maratona, at� porque outra havia feito isso no ano anterior [Roberta "Bobbi" Gibb, sem inscri��o oficial]. Eu s� queria correr e mostrar a todos que as mulheres eram capazes, sim, de participar da prova at� o fim.
Nas primeiras milhas, estava me sentindo feliz. E ent�o, no caminh�o onde ficava a imprensa, os jornalistas come�aram a provocar o diretor da prova, Jock Semple, dizendo coisas como "tem uma garota na sua corrida". Ele se irritou e passou a me perseguir.
"Saia da minha prova", ele berrava, e tentava arrancar o n�mero das minhas costas. Meu t�cnico come�ou a gritar para que me largasse. Semple insistiu, e ent�o meu namorado acertou-o com o ombro, ele caiu e foi deixado para tr�s.
As milhas seguintes foram vergonhosas e assustadoras para mim. Eu me sentia mal por ter sido exposta daquele jeito. Mas n�o poderia deixar que dissessem que as mulheres eram muito fracas para chegar at� o fim de uma maratona, ou que quer�amos mas n�o conseguir�amos. Precisava alcan�ar a linha de chegada.
O come�o de minha vida como corredora se deu quando eu tinha 12 anos de idade. Meu pai [o coronel do Ex�rcito Homer Switzer] transformava tudo em uma competi��o. Era assim que ele conseguia que eu fizesse tarefas. "Duvido que voc� consiga cortar a grama mais r�pido que eu", e eu ia l� e acelerava o passo para cumprir o que quer que ele pedisse o mais r�pido poss�vel. Assim ele me incutiu um esp�rito competitivo.
Uma volta na minha casa dava mais ou menos uma milha, e era em torno dela que eu treinava corrida. Cada volta a mais na casa era um cintur�o da vit�ria. Cada milha significava um passo a mais a caminho do empoderamento.
Nessa �poca, ainda adolescente, estava lendo J.D. Salinger, e.e. cummings, T.S. Elliot. Por inspira��o neles, assinava K.V. Switzer quando escrevia algo. Aos 20 anos, aluna de jornalismo na Universidade de Syracuse, usava essa alcunha em meus textos. No formul�rio de inscri��o para a maratona, foi assim que coloquei meu nome, e isso fez com que ningu�m percebesse que se tratava de uma mulher. Mas n�o tive a inten��o de me passar por um homem em nenhum momento.
Desde aquele dia, correr virou uma carreira para mim. Disputei a Maratona de Boston mais oito vezes, ganhei a de Nova York (1974). Sou comentarista da Maratona de Boston na televis�o h� 37 edi��es consecutivas.
Quando estava com 62 anos, participando de eventos sobre corrida e empoderamento feminino, diversas mulheres da minha faixa et�ria come�aram a me contar suas hist�rias de supera��o, ou seja, como elas venceram a depress�o; como escaparam de relacionamentos abusivos; como tomaram controle das pr�prias vidas -tudo isso por meio da participa��o ativa em corridas, muitas delas organizadas pela minha ONG, 261 Fearless ["destemida", em ingl�s]. 261 � o n�mero que estava na minha placa de identifica��o em 1967, e que o diretor da prova tentou arrancar.
Ouvindo-as, comecei a ficar com inveja, e decidi que deveria voltar a correr. Participei, ent�o, das maratonas de Atenas, Berlim, Nova Zel�ndia, entre outros percursos longos pelo globo. Anos depois, em 2017, resolvi que participaria uma vez mais da Maratona de Boston, 50 anos depois de t�-la completado pela primeira vez. Fiquei curiosa para saber se seria capaz de chegar ao final dela depois de tanto tempo.
O choque de diferen�as foi extremo. Fui homenageada e dei o tiro de largada. Na linha de sa�da, milhares de mulheres ao meu lado. N�o havia gritos de desincentivo ou mesmo amea�as; s� havia apoio. Centenas de pessoas levaram cartazes com meu n�mero, o 261.
Os 50 anos entre as minhas participa��es foram revolucion�rios. As sociedades mudaram com as transforma��es feitas pelas mulheres. Organizei uma corrida no Brasil no final da d�cada de 1970 da qual mais de 10 mil delas participaram. Hoje, h� mais mulheres que homens correndo nos Estados Unidos. A corrida foi transformada nas �ltimas d�cadas. Ela foi, e � cada vez mais, uma celebra��o da liberdade das mulheres para as novas gera��es.
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