Descrição de chapéu Interior de São Paulo

Alta aprovação no ITA leva estudantes de todo o país a escolas do Ceará

Depois de São Paulo, Ceará teve o maior número de selecionados no instituto; colégios recrutam 'crânios' e incentivam olimpíadas

Beatriz Jucá
Fortaleza

O Ceará tornou-se um celeiro para gênios das exatas de todo o país. No estado que historicamente lidera proporcionalmente as aprovações em um dos vestibulares mais difíceis do país —o ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica)—, escolas particulares garimpam os melhores alunos, oferecem de bolsas a alojamento, incentivam a competição em olimpíadas e formam turmas especializadas para o exame.

No último vestibular, o Ceará foi responsável por um terço das aprovações no ITA, ocupando 56 vagas. Ficou atrás apenas de São Paulo, estado mais populoso do país, que aprovou 67 candidatos para o instituto, cuja sede fica em São José dos Campos (SP), no interior paulista.

selfie de homem jovem branco de cabelo curto, barba e óculos à frente de fachada com letreito do Instituto Tecnológico da Aeronáutica
O mineiro João Victor Canedo, aprovado no ITA; ele conseguiu uma bolsa de estudos no Ari de Sá, um dos colégios de Fortaleza procurados por estudantes - Arquivo pessoal

Cada vez mais estudantes e famílias se mudam para o Ceará em busca da expertise. Embora a fórmula hoje seja replicada em outras escolas, são dois grandes colégios particulares de Fortaleza, com mensalidade média de R$ 3.000, os principais responsáveis pelas aprovações: Farias Brito e Ari de Sá.

Em ambos, o número de alunos de fora já supera o de cearenses e há uma verdadeira "comunidade de crânios".

"Lá todo mundo tem o mesmo objetivo. O nível é alto e é possível tirar dúvidas com os próprios colegas", diz Marcello Ryaj, o primeiro lugar do vestibular passado.

Paraibano, ele deixou João Pessoa e se mudou para Fortaleza graças a uma bolsa ofertada pelo Farias Brito depois de um teste e dos resultados em olimpíadas de ciências.

A rotina de estudos nas turmas voltadas ao ITA pode se estender das 7h30 às 22h durante a semana e inclui aulas aos sábados e simulados aos domingos, o que pode trazer desafios psicológicos.

Por isso, os colégios dizem implementar projetos de combate ao estresse e acompanhamento psicológico.

"[No primeiro vestibular] acabei passando mal e não consegui passar", diz Marcello. No ano seguinte, ele reduziu o ritmo de estudos e conseguiu a aprovação.

No Ceará, a preparação pode começar bem antes do terceiro ano. A partir do segundo ciclo do ensino fundamental, os alunos são convidados a participar de olimpíadas, com aulas preparatórias no contraturno.

No ensino médio, a carga horária passa a ser mais direcionada para matemática, física e química, com foco na seleção do IME (Instituto Militar de Engenharia) e do ITA.

"São meninos que se tornam autodidatas pela capacidade de aprender em função do desenvolvimento do raciocínio lógico", explica o diretor de ensino do Farias Brito, Marcelo Pena.

O ecossistema para aprovação inclui materiais didáticos próprios, conteúdos que não costumam estar no currículo normal e professores especializados no exame. Leonardo Bruno, supervisor de turmas IME/ITA do Ari de Sá, explica que velocidade também é crucial na prova. "O aluno tem que ser capaz de resolver questões difíceis em dez minutos", diz.

Diretor de ensino e inovações educacionais do SAS Plataforma de Educação, Ademar Celedônio diz que as escolas ensinam matérias como cálculo diferencial, vistas apenas na graduação, porque perceberam que elas ajudam na celeridade dos alunos.

O presidente Lula (PT) participa de lançamento da Pedra Fundamental do novo campus do ITA em Fortaleza, em janeiro; unidade será a primeira fora de SP - Ricardo Stuckert - 19.jan.2024/PR/Divulgação

O método de ensino especializado e o recrutamento de alunos de alto rendimento tornaram Fortaleza um hub de aprovação.

"A gente se inspira na Biblioteca de Alexandria", afirma o diretor superintendente do Farias Brito, Tales de Sá Cavalcante. "Era um centro de excelência e de pesquisa que recrutava os gênios da humanidade. Eles davam um jeito de fornecer hospedagem e livros para que aquele time de excelência ficasse reforçado."

Foi em busca desta "comunidade de crânios" que Endy Lume Okamura deixou parte da família em Campo Grande (MS) e se mudou com a mãe para Fortaleza depois de conseguir uma bolsa no Farias Brito.

"A comunidade que eles têm de olimpíadas é muito legal. Você tem discussões de problemas quando está lanchando com o pessoal que não era possível aqui em Campo Grande", conta.

A escola tem um projeto específico voltado para universidades estrangeiras, e Endy viu a possibilidade de realizar o sonho de ingressar no MIT (Massachusetts Institute of Technology), uma das universidades mais difíceis dos Estados Unidos. Neste ano, ela foi aprovada e ganhou uma bolsa.

Apaixonado por matemática desde criança, o mineiro João Victor Canedo também cruzou o país em busca da expertise cearense para o ITA, com uma bolsa no Ari de Sá. "Os primeiros momentos no colégio foram um pouco mais difíceis de me adaptar porque a rotina é intensa", relembra ele, aprovado na terceira tentativa.

Werisleyk Logam Barbosa, que hoje cursa o ITA, fez parte do grupo de bolsistas cearenses no Ari de Sá pelo desempenho olímpico. "Conheci um novo mundo. Sentia mais gosto em estudar", diz o estudante, que já participou de ao menos 20 competições.

O Ceará se prepara para receber a primeira sede do instituto fora de São Paulo, e o Governo do Ceará criou um curso preparatório voltado para alunos de escolas públicas, com apoio pedagógico dos dois colégios.

A expectativa é que, agora, mais estudantes busquem o estado para se preparar. "É como se fosse um time de futebol onde um craque é sempre bem-vindo", diz o diretor do Farias Brito.

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