Motorista gravou atropelado ainda vivo, negou ajuda e escreveu: 'Mandei conhecer Lúcifer'

Em depoimento, Christopher Rodrigues, 27, negou intenção de atingir Matheus da Silva, 21; polícia deve concluir investigação até sexta

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São Paulo

Vídeo feito pelo motorista de aplicativo Christopher Rodrigues, 27, que atropelou e matou Matheus Campos da Silva, 21, e depois debochou do fato nas redes sociais, mostra a vítima ainda viva e ensanguentada sob o veículo.

"Comédia, vai roubar trabalhador?", questiona o atropelador na gravação. Balançando a cabeça e o indicador da mão esquerda, a vítima nega. "Não, não vai sair, não. Só com a polícia, chama a polícia", continua Rodrigues, se recusando a oferecer ajuda.

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Publicação feita por Christopher Rodrigues,27, em grupo no Facebook após atropelar e matar Matheus Campos da Silva, 21 - Reprodução

O caso ocorreu por volta das 17h30 da última terça-feira (25) região central de São Paulo. Segundo o boletim de ocorrência, a investida com um Ford Ka sobre Silva teria acontecido após a vítima supostamente tomar de outro condutor um celular, avaliado em R$ 800. Silva não tinha antecedentes criminais.

Em outras publicações feitas logo após o ocorrido, o motorista escreveu: "Menos um fazendo o L", em referência a eleitores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Ainda no dia do acidente, o motorista fez mais uma publicação no Facebook em que dizia ter mandado Silva "ir conhecer o tio Lúcifer".

O autor do atropelamento não apresentou advogado. Via redes sociais, a reportagem tentou contato com ele entre a noite deste domingo (30) e a tarde desta terça-feira (2), mas não houve resposta.


'Vai roubar trabalhador?', diz motorista a atropelado; ouça


Rodrigues afirmou à polícia que a colisão foi um acidente. Ele disse estar trafegando quando a vítima, correndo após o furto, surgiu em frente ao veículo, que não freou a tempo. No entanto, em suas redes sociais, o motorista publicou vídeos em que zombava da morte provocada.

O homem foi ouvido da última sexta-feira (28) no 5º Distrito Policial, no bairro da Liberdade, que investiga as circunstâncias dos fatos por meio de inquérito policial, que deve ser concluído até sexta-feira (5), segundo o delegado do caso, Percival Alcântara.

Inicialmente, o caso foi registrado como furto e morte suspeita ou acidental. Alcântara diz que seu intuito era esclarecer se o homicídio foi doloso, com intenção de matar, ou culposo, sem intenção.

A reportagem apurou que, por enquanto, a investigação aponta para a segunda hipótese. Não foram encontradas imagens da ocorrência, e as oitivas têm corroborado com a versão de algo impremeditado.

Na quinta-feira (4), a polícia deve ouvir duas peças-chave para a resolução do caso. O motorista que teria sido alvo de furto e uma passageira do veículo dele. O objetivo é apurar conduta do atropelador e se houve omissão de socorro.

Em seu depoimento, Rodrigues afirmou que a passageira teria chamado por socorro. "Se uma pessoa liga para o serviço atendimento, já basta para não ser considerado negligência", diz o delegado Percival Alcântara.

Rodrigues ainda pode ser punido pelas publicações que efetuou após o incidente, afirma o delegado.

As plataformas de transporte 99 e Uber baniram o motorista de seus sistemas, ressaltando repudiar qualquer forma de violência e aguardar o fim das investigações.

Omissão de socorro

De acordo com o artigo 13 do Código Penal, a omissão de socorro é levada em conta apenas em casos de homicídio culposo, ou seja, quando não há a intenção de cometer o crime. O advogado criminal Leandro Sarcedo explica que, nos casos em que o autor age com intenção de matar, entende-se que há que se falar em socorro, e a ausência de auxílio à vítima não é levada em consideração.

"Na omissão de socorro, ele se torna responsável na medida em que criou o risco da ocorrência do resultado, ou seja, a morte de alguém. Como, por exemplo, atropelar sem dolo e fugir", disse.

De acordo com o artigo135 do Código Penal, se a omissão de socorro resultar em uma lesão corporal grave, a pena é dobrada. Se a vítima morrer, a punição prevista é triplicada.

"No entanto, esta questão é bem lateral, pois, ao que parece, o que se discute [no caso] é se houve excesso doloso do homem que atropelou", afirma o doutor em direito penal da USP.

Colaborou Pedro Madeira

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