Sofia era o maior bebê da maternidade. Primeira filha, primeira neta, logo esqueciam quão grande e forte ela era e a cercavam de cuidados, como se pudesse quebrar a qualquer solavanco.
Quando ia passar o dia na casa do pai, a mãe se afligia. Qualquer espirro era motivo de preocupação. Mas Sofia cresceu ainda mais, sem sustos, tornou-se uma linda menina, quieta e luminosa.
Vendo-a colocar uma boneca para dormir, senti, pela primeira vez na vida, vontade de ter filhos.
Na escola, era boa aluna, fazia amigos, não dava trabalho. Parecia que se criava sozinha, disse uma vez a mãe.
A adolescência trouxe tempestades, mas a inteligência e compaixão de Sofia surpreendiam a todo momento. Filha de Karina Pastore e Marco Damiani, jornalistas de mão-cheia, escrevia muito bem e tinha um olhar sofisticado para a fotografia.
Graduou-se em gastronomia, fez uma pequena tatuagem de uma faca de cozinha no braço, trabalhou em vários restaurantes estrelados de São Paulo, mas descobriu que o que gostava mesmo era de lecionar.
Lidava com crianças pequenas com uma naturalidade impressionante, o que já era possível vislumbrar quando Maria, sua irmã 12 anos mais nova, nasceu.
Decidiu estudar pedagogia e começou a trabalhar como assistente de professora em uma escola bilíngue.
Apaixonou-se por Vinicius, chef de cozinha, e nasceu um menino que, aos cinco anos, é a mistura do que há de melhor em cada um dos pais.
Sofia sentia tudo intensamente, como se queimasse sem explicação. Era mesmo frágil, como temiam seus pais.
Morreu no último dia do ano da pandemia. Estava lendo Pablo Neruda, o poeta de "posso escrever os versos mais tristes esta noite. Pensar que não a tenho. Sentir que a perdi".
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