Desempregado migra para SP e mora na rua por emprego em a��o de Doria
Havia dois anos que Ant�nio Roberto da Concei��o, 47, tinha perdido o emprego de gari em Maragogipe, a 53 km de Salvador, na Bahia.
Em uma pesquisa na internet com a palavra-chave "trabalho", ele chegou at� uma not�cia na qual o prefeito Jo�o Doria (PSDB) prometia empregar 20 mil moradores de rua at� o fim do ano por meio do programa Trabalho Novo.
Voltado aos sem-teto que vivem em S�o Paulo justamente para diminuir a popula��o de rua da capital, o programa da gest�o tucana tem atra�do desempregados de outras cidades e Estados, que veem nas promessas do prefeito uma chance de recoloca��o no mercado de trabalho. As vagas s�o de cerca de um sal�rio m�nimo e incluem registro em carteira.
Para isso, por�m, o desempregado migrante precisa se transformar em morador de rua. Aqueles que desembarcam na capital se submetem a dormir por um tempo nas ruas at� serem encaminhados a um abrigo da prefeitura e entrar na fila por uma vaga oferecida pelo programa.
A Folha percorreu nos �ltimos dias locais para atendimento de moradores de rua na capital e encontrou pelo menos 14 pessoas que se mudaram recentemente a S�o Paulo ap�s terem ouvido falar das vagas de emprego oferecidas pela gest�o Doria.
Foi o que fez o gari. Ele deixou os bicos de pescador e rodou 1.900 km em um �nibus com a esperan�a de sair da fila do desemprego em S�o Paulo. "Morei algumas semanas na rua antes de ser encaminhado para um abrigo. Como o clima era pesado, procurava sempre dormir perto de alguma base da pol�cia ou em locais movimentados", diz Concei��o, que vive desde o in�cio de julho em um abrigo municipal na regi�o de Santana, na zona norte.
A busca por uma vaga chegou ao fim ap�s dois meses, quando foi selecionado para trabalhar na lavanderia do CTA (Centro Tempor�rio de Acolhida) da Barra Funda, na zona oeste, onde ganha R$ 1.200, o dobro de seus vencimentos como gari na Bahia.
Nas pr�ximas semanas, ele planeja se mudar para a casa que acabou de alugar por R$ 400. "Quero trazer o resto da minha fam�lia para participar do programa."
Ao menos outros oito conterr�neos da pequena cidade no interior baiano seguiram o mesmo percurso e rumaram para S�o Paulo em busca de emprego com ajuda da prefeitura. Dois j� foram selecionados para vagas do programa ap�s passarem um per�odo curto nas ruas antes de conseguirem vaga em abrigo.
Para se tornar eleg�vel �s vagas disponibilizadas pelo Trabalho Novo, os participantes devem estar abrigados em algum equipamento da prefeitura. N�o podem, por exemplo, estar morando nas ruas –esse um pr�-requisito para conseguir vaga nos albergues.
Al�m disso, os interessados devem passar por um processo de capacita��o de uma semana. Segundo a Secretaria de Assist�ncia e Desenvolvimento Social, de fevereiro a novembro, 1.502 pessoas foram contratadas por meio do programa, e 2.978 foram capacitadas e ainda aguardam por uma vaga. Entre os que conseguiram o trabalho, 135 foram depois desligados.
Para o secret�rio de Assist�ncia Social, Filipe Sabar�, essa migra��o de pessoas para S�o Paulo n�o afeta o programa. "O acolhimento � oferecido a quem est� na rua, n�o importa se por um dia ou por quatro anos", afirma.
Al�m disso, ele ressalta que � esperado no fim do ano o aumento de migrantes que se transformam em sem-teto por causa das doa��es de Natal. "Isso s� mostra a gravidade da crise que o pa�s est� passando. S�o Paulo ainda � um destino visto como boa oportunidade de emprego."
'CRIAN�A NA SELVA DE PEDRA'
Desempregado e rec�m-separado, Darlei Belinelli J�nior, 38, decidiu viajar a S�o Paulo h� cerca de dois meses para tentar um trabalho assim que soube da promessa de vagas de Jo�o Doria (PSDB). Sem dinheiro nem para o transporte, conta que andou por 20 dias entre Londrina, no Paran�, e a capital paulista.
Quando chegou, sem ter para onde ir ap�s a maratona de 540 km, lembra que foi parar na Esta��o da Luz, no centro de SP, onde pretendia aguentar alguns dias na cal�ada at� ser recolhido pela prefeitura para um abrigo.
Como a esta��o � pr�xima da cracol�ndia, entregou-se ao v�cio em �lcool e drogas. Ap�s uma "noite horrenda", quando diz ter ficado com medo das drogas, decidiu pedir ajuda para se internar.
Passou 40 dias em processo de desintoxica��o como participante do programa anticrack da prefeitura.
"Eu me senti como uma crian�a na selva de pedra. Agora minha esperan�a � arrumar trabalho", diz J�nior sobre sua vinda a S�o Paulo.
Ele espera conseguir um emprego em que possa usar sua experi�ncia em lavanderia industrial acumulada durante os dois anos em que viveu na Irlanda. Com cidadania italiana, J�nior espera se estabilizar novamente antes de voltar para a Europa. "Quem sabe daqui algum tempo consigo ir de f�rias para l�."
Eduardo Anizelli/Folhapress | ||
Ant�nio da Concei��o, 47, que deixou a Bahia em busca de emprego oferecido em programa de Doria |
DIPLOMA
As drogas tamb�m acabaram interferindo nos planos de Gilmour Ramos, 40. H� sete meses em S�o Paulo, partiu de Guararema, no interior paulista, de olho na chance de sair do desemprego devido � promessa de Doria.
Como morou durante dez anos nos EUA e tem diploma em letras, planejava dar continuidade �s aulas de ingl�s que ministrava no interior.
Ele lembra que, no come�o, chegou a dividir o aluguel com um amigo em Taipas, na zona norte, e dar algumas aulas do idioma, mas o v�cio em drogas o levou de vez para a cracol�ndia, poucas semanas depois.
"Lembro que estava no metr� indo dar aula quando pesquisei 'cracol�ndia' no celular. Vi que estava perto e resolvi ir at� l� para dar uma olhada. Fui e n�o sa� mais de l� por um tempo", afirma.
Depois de gastar todo o dinheiro que tinha e trocar at� a roupa e os t�nis que usava por pedras de crack, Ramos decidiu que queria largar o v�cio. Foi acolhido em um dos cont�ineres instalados pela gest�o Doria na regi�o central para dar cama e refei��es aos usu�rios de drogas.
H� cerca de tr�s semanas ele conseguiu retomar a rota que havia tra�ado para si quando saiu de Guararema e se mudou para um abrigo na Barra Funda. Ele se prepara para passar pelo curso de capacita��o do Trabalho Novo na pr�xima semana.
�NIBUS
A espera pelo est�gio preparat�rio tamb�m faz parte dos dias do eletricista Valter dos Santos, 54, que partiu de Ponta Grossa (PR) para SP por causa do Trabalho Novo.
Sem emprego formal h� quase tr�s anos, encarou viagem de quatro dias em seis �nibus intermunicipais para economizar na passagem. No caminho, chegou a trocar servi�os de eletricista por pratos de comida. Lembra que percorreu a maior parte do trajeto com apenas R$ 15 no bolso.
"[Quando cheguei a SP] uma assistente social disse que eu tinha o perfil do projeto do Doria e me encaminhou para um centro de acolhida", diz ele, que tem feito consertos pela vizinhan�a do abrigo enquanto espera por uma vaga fixa de emprego.
Vindo h� dois meses de Campinas, no interior de SP, o ajudante de pedreiro Rener da Silva Santos, 30, foi contratado para trabalhar em limpeza hospitalar por uma empresa participante do programa. Ele veio para a capital ao ser informado por uma amiga sobre as vagas da prefeitura.
"Com a crise, os bicos que eu fazia diminu�ram", lembra ele, que mora em um centro de acolhimento da zona leste.
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O CAMINHO DO TRABALHO NOVO
Como funciona o programa de Doria para empregar moradores de rua
Abordagem na rua
Sem-teto � abordado por agentes da prefeitura e, caso queira, � levado a um albergue
Registro no programa
Ele � cadastrado no Trabalho Novo –para isso, � preciso estar acolhido em regime de 16 ou 24 horas
Treinamento no albergue
Faz um curso de uma semana; em caso de v�cio ou dist�rbios, h� acompanhamento assistencial antes
Fila do emprego
Entra na lista de espera por vagas, criadas por meio de conv�nios entre prefeitura e empresas
Trabalho
Passa por per�odo de experi�ncia de 3 meses, at� ser contratado com registro em carteira
Acompanhamento
Caso tenha dificuldades para se adaptar, � acompanhado por assistentes sociais nos albergues
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