Quatro em cada mil adolescentes ser�o mortos antes de atingir os 19 anos
Fabio Rossi/Ag�ncia O Globo | ||
Parentes de menino de 15 anos v�tima de tentativa de roubo em �gua Santa, no Rio |
No Brasil, a cada mil adolescentes de 12 anos, 3,65 ser�o assassinados antes mesmo de completar os 19.
� o que aponta o IHA (�ndice de Homic�dios na Adolesc�ncia), m�trica elaborada pelo Unicef, o Observat�rio de Favelas e a Secretaria Nacional de Promo��o dos Direitos da Crian�a e do Adolescente, do governo federal.
A medi��o � feita com dados de 2014, os �ltimos dispon�veis, e considera apenas as 300 cidades do pa�s com mais de 100 mil habitantes.
Isso significa que, se o panorama continuar o mesmo, ser�o 43 mil adolescentes mortos entre 2015 e 2021. � o maior �ndice desde o in�cio da s�rie hist�rica, iniciada em 2005, que teve IHA 2,8.
"N�o h� nada mais grave que a morte violenta dessa camada da popula��o, em termos de custo societ�rio. A gente perde muitos anos de vida, de produtividade, e h� um dano muito grande n�o s� aos adolescentes, mas �s pessoas do seu entorno", explica o soci�logo Ign�cio Cano, membro do Laborat�rio de An�lise da Viol�ncia da Uerj.
"� um indicativo da viol�ncia que segue e continua at� os 29, faixa de alta letalidade. Se a gente n�o consegue conter a viol�ncia na adolesc�ncia, a gente vai conviver com altas taxas de mortes."
O IHA � calculado por munic�pio, com informa��es sobre mortes do Minist�rio da Sa�de e aponta fatores de risco. A chance de um adolescente negro ser assassinado, por exemplo, � tr�s vezes maior do que a de um jovem branco.
Uma das explica��es � o fator socioecon�mico, diz a especialista em prote��o � crian�a do Unicef, Fabiana Gorenstein. "H� uma concentra��o de pessoas negras entre a parcela mais vulner�vel da popula��o, que acabam desassistidas", explica ela, que aponta ainda para o racismo.
Al�m disso, a chance de um menino ser assassinado � 13,5 vezes maior do que a de uma menina, e ser morto por arma de fogo � seis vezes mais f�cil do que por outros meios.
"Mostra um certo machismo exacerbado, de querer resolver tudo com o uso da for�a", diz o soci�logo Thiago de Holanda, do Comit� Cearense pela Preven��o de Homic�dios na Adolesc�ncia.
REGI�ES
O crescimento do IHA no pa�s pode ser explicado por um aumento no �ndice do Sudeste (que vem subindo ap�s um per�odo de queda at� 2011) e, principalmente, do Nordeste, que chegou a 6,5 –enquanto o Sul tem taxa 2,3. No come�o da medi��o, em 2005, o Norte tinha o menor IHA, 2,01, e Nordeste, o maior, 2,64.
O aumento expressivo da letalidade no Nordeste tem a ver com o r�pido crescimento demogr�fico daqueles Estados, aponta Cano.
Cear� t�m as taxas mais preocupantes e � nos bairros mais pobres de Fortaleza, a capital com pior IHA, onde se mata mais (leia abaixo).
"Nesses locais voc� tem os conflitos interpessoais agravados pelo mercado de armas, coirm�o do mercado de drogas", diz o deputado estadual Renato Roseno (PSOL), tamb�m do Comit� Cearense pela Preven��o de Homic�dios na Adolesc�ncia.
Destoa no Sudeste, que tem baixo IHA, o Esp�rito Santo, terceiro Estado que mais mata seus adolescentes, com taxa de 7,8. A regi�o metropolitana da capital, Vit�ria, concentra os piores �ndices: na Serra, chega a 12,7, seguido por Vila Velha (10,3), a pr�pria Vit�ria (7,7) e Cariacica (7,3).
O secret�rio de Direitos Humanos, Julio Pompeu, diz que, como os dados s�o de 2014, n�o refletem a��es mais duras do Estado a partir de 2015, mas assume que "o Esp�rito Santo � violento".
"Essas mortes est�o concentradas em pouqu�ssimos lugares. E boa parte dos assassinatos se deve a disputas por causa de tr�fico. Aqui voc� tem traficantes jovens, com alto grau de letalidade", afirma.
"Houve um aumento da atividade policial, o que acarretou uma diminui��o no n�mero de mortes, mas s� enfrentamento n�o � suficiente", diz ele, que elenca tr�s frentes de atua��o para reduzir a letalidade: redu��o da evas�o escolar, gera��o de emprego e renda e fomento de atividades culturais.
O Estado de S�o Paulo tem o terceiro �ndice mais baixo do pa�s, de 1,6, acima apenas de RR (1,4) e SC (0,9). Na capital paulista, o IHA � 2,2.
Gorenstein, do Unicef, prop�e quatro solu��es para a letalidade dos adolescentes. A primeira � dar aten��o � infraestrutura das periferias. "Essas comunidades s�o absolutamente desprovidas de servi�os b�sicos. E quando ficam reconhecidas pelos altos �ndices de homic�dios, a� � que os servi�os n�o v�o mesmo."
Al�m disso, prop�e �nfase na educa��o, uma vez que, segundo ela, "h� uma rela��o direta entre abandono escolar e o risco de ser v�tima de homic�dio", diz. Por fim, o fomento a pol�ticas de seguran�a, como treinamento de policiais e controle de armas, e prote��o a fam�lias e amigos dos jovens mortos e em risco.
CEAR� L�DER
"Eu escutei o tiro que matou meu filho". Essa frase foi a mais ouvida pelos pesquisadores que foram a campo entender por que se mata tantos jovens no Cear�, Estado com o pior �ndice IHA (8,71) –Fortaleza tamb�m lidera o ranking entre as capitais, com 10,74.
Lucimar (nome fict�cio) foi uma das m�es que contou ter escutado o filho de 17 anos morrer. Ela relatou que estava com o marido em casa, na periferia de Fortaleza, assistindo TV por volta das 21h, quando ouviu o barulho. Ao sa�rem, viram o filho ca�do –ele conversava na cal�ada com um primo.
A investiga��o do assassinato, ocorrido em 2015, n�o avan�ou. Lucimar at� hoje n�o sabe por que o filho foi morto, mas h� duas teorias elaboradas pela fam�lia: ci�me do ex-marido da ent�o namorada do rapaz ou ele ter sido confundido com um parente que estava sendo amea�ado de morte por envolvimento em roubo de carga.
"H� uma permiss�o para matar porque n�o h� uma responsabiliza��o por muitas das mortes. Metade delas aconteceu pr�ximo da casa das v�timas, a at� 500 metros, o que mostra que o problema vai muito al�m de envolvimento com tr�fico", disse o soci�logo Thiago de Holanda, 35.
Ele coordenou o relat�rio e pesquisa produzidos pelo Comit� Cearense pela Preven��o de Homic�dios na Adolesc�ncia, da Assembleia Legislativa, em parceria com a Unicef e o governo do Estado.
Na pesquisa foram entrevistadas 146 fam�lias que tiveram adolescentes assassinados em 2015, em Fortaleza e outras cidades cearenses, como Juazeiro do Norte e Sobral.
Ela concluiu que a facilidade de acesso �s armas acaba tornando bairros mais vulner�veis um o�sis para assassinatos por diversos motivos –n�o s� envolvimento com drogas, mas crimes passionais e at� d�vidas banais. Isso faz com que essas mortes normalmente ocorram mais pr�ximo das casas das v�timas.
A pesquisa indicou que 44% dos homic�dios de adolescentes ocorreram em 17 dos 119 bairros de Fortaleza –locais em geral com estrutura mais prec�ria.
CONCENTRA��O
Segundo a pesquisa, 98% dos adolescentes mortos no Cear� eram do sexo masculino. A maioria estava longe da escola havia seis meses e muitos tinham trabalhos informais.
O cruzamento de dados mostrou semelhan�as no perfil dos mortos. A maioria das m�es engravidaram muito jovens e abandonaram a escola cedo, o que facilita a forma��o de fam�lias desestruturadas e vulner�veis aos crimes. Outro ponto: a maioria (73%) relatou que as v�timas j� haviam sofrido viol�ncia policial.
Essa rela��o conflituosa chegou ao auge na madrugada de 12 de novembro de 2015, quando ocorreu a maior chacina da hist�ria de Fortaleza, no distrito de Messejana, regi�o sudeste da cidade. Dos 11 mortos, nove eram adolescentes –44 policiais militares foram acusados do crime.
O relat�rio final do comit� apresenta 12 recomenda��es para tentar inibir os homic�dios de adolescentes no Cear�, entre eles a qualifica��o urbana de locais onde mais ocorrem os assassinatos, apoio e prote��o �s fam�lias de v�timas de viol�ncia, media��o de conflito e prote��o aos amea�ados e forma��o de policiais na abordagem aos jovens.
Se houvesse media��o de conflitos em regi�es violentas talvez Luziara Rodrigues, 16, e Carolina Moraes, 23, estivessem vivas. Elas entraram com outras amigas num �nibus em 16 de setembro na Barra do Cear�, rumo a uma festa. Uma discuss�o come�ou, provavelmente porque as duas foram identificadas como moradoras de bairro com grupo rival, e elas acabaram torturadas e mortas –sete pessoas j� foram detidas acusadas de participa��o.
REDU��O
A Secretaria de Seguran�a P�blica Social e Defesa do Cear� informou que os dados IHA coletados s�o de 2014, mas que em 2015 e 2016 houve redu��o nos n�meros de homic�dios -n�o foram apresentados dados para compara��o.
O programa Pacto por um Cear� Pac�fico foi criado em 2015 e, segundo a secretaria, articula projetos que atuem no controle da evas�o escolar, no acompanhamento de jovens egressos do sistema socioeducativo para a reconstru��o de suas trajet�rias com suporte �s fam�lias e com projetos para preven��o de gravidez precoce. H� tamb�m foco em projetos para qualifica��o profissional de jovens e investimento em escolas de tempo integral.
Sobre as estrat�gias de combate a homic�dios de maneira geral, a secretaria informou que o Cear� tem um dos maiores �ndices de elucida��o desse tipo de crime no pa�s -22%, ante a m�dia nacional de 8%.
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