Veja o processo que transforma as ovas da tainha na cara bottarga
Karime Xavier/Folha Imagem |
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P�o, manteiga e bottarga,cria��o da chef de cozinha Ana Soares, do Mesa 3, em SP |
Todos os anos, cardumes de tainha deixam o estu�rio da Lagoa dos Patos, no Rio Grande do Sul, � procura de �guas mais quentes para a desova. Passado o defeso, quando a captura � proibida pelo Ibama, chegam ao litoral catarinense e, entre maio e julho, atraem os pescadores da regi�o, menos por sua carne e mais por suas ovas.
Alongadas e amarelas, as ovas v�m em par e se sobressaem na barraca de peixes. Com elas se faz a bottarga, nome dado � ova da tainha (muggine, em italiano) depois de salgada, lavada e seca -as ovas do atum que passam pelo mesmo processo tamb�m se chamam bottarga (di tonno).
� uma iguaria car�ssima, fatiada finalmente sobre massas e ovos, em pequenas quantidades, porque tem um gosto intenso e algo picante. "� um sabor de oceano, n�o tem necessidade de usar em grande quantidade. Recomenda-se colocar entre 10 g e 15 g em cada prato", diz Christian Katopodis, diretor da Lefkas (www.bottarga club.com), empresa que processa o ingrediente na praia da Gamboa, em Garopaba (SC).
"� uma tradi��o na minha fam�lia, porque no Mediterr�neo esse peixe � abundante", diz Katopodis, filho de gregos. "Quem a introduziu no mundo culin�rio foram os sardos. Mas sempre se usaram ovas de tainha no Mediterr�neo, desde a �poca dos fen�cios."
Na Sic�lia e na Sardenha, consideradas as principais produtoras e consumidoras de bottarga, as lascas costumam ser temperadas com lim�o e azeite e comidas com p�o.
A "gema" da tainha
No �ltimo ano, o quilo das ovas de tainha chegou a custar R$ 80 no mercado de Florian�polis. "Setenta por cento dos consumidores de tainha v�o � procura da ova", diz Osvani Gon�alves, presidente do Sindpesca (Sindicato dos Pescadores de Santa Catarina).
At� o final de julho, costuma-se encontrar ovas de tainha nas bancas de peixe paulistanas. Na �ltima semana, o quilo variava de R$ 40 a R$ 60. Se o valor da ova fresca j� � alto, depois de processada pode custar dez vezes mais. Em mercados gourmet, como o Santa Luzia, o quilo da nacional custa R$ 478. Assim, por uma "perna" de ova seca com 130 g pagam-se R$ 62, enquanto por uma ova fresca dupla, com 300 g, a reportagem da Folha pagou R$ 15 -rendeu uma bottarga com pouco mais de 200 g (leia mais � direita).
A desidrata��o e a secagem � um processo que demanda tempo e paci�ncia, mas que pode ser feito em casa com bons resultados. A receita? Cada um tem uma. H� quem prefira o sal grosso; outros, o refinado. H� quem misture um pouco de a��car ao sal, por achar que suaviza o sabor impetuoso das ovas. Outros dizem que desidrata��o se faz com sal -e s�.
Tradicionalmente, ela � seca ao sol, mas tamb�m � poss�vel conseguir uma bottarga saborosa secando-a no forno el�trico a uma temperatura baix�ssima (entre 50�C e 60�C) -veja na ilustra��o abaixo. O melhor � entender o princ�pio e variar as experimenta��es at� descobrir a que mais agrada.
Na "safra" passada, a chef Ana Soares, do pastif�cio e rotisseria Mesa III, fabricou suas pr�prias bottargas usando sal refinado e secando-as no forno � lenha. "Foram enfiadas um pouco demais no forno. T�m de ficar mais na beira", diz a chef.
Dessa vez, resolveu testar o sal grosso e o fino aromatizado. Chegou � conclus�o de que n�o � preciso p�r peso sobre elas. "S� precisa virar sempre", diz. "Acho que o sal grosso faz um trabalho mais violento. O fino n�o machuca. E tem que controlar o forno para n�o secar mais do que deve. � que nem ovo. Se cozinha violentamente, coagula de um jeito ruim."
Minha bottarga ficou com textura agrad�vel e macia
Escolhi as duas ovas mais gordinhas, frescas. Em casa, depois de lav�-las, tentei tirar o sangue de uma veia. Um produtor me ensinou a extrair o sangue manualmente, porque "deixa um amargor ruim". E avisou: "Com cuidado, a membrana � fr�gil e pode romper". Foi o que aconteceu com um dos pares. Desisti. Vai com veia mesmo. Lavei, sequei com papel, forrei uma vasilha com sal grosso, coloquei a ova, com todo o cuidado, mais sal, ova e sal.
Ficaram assim por 12 horas. J� mais firmes, foram lavadas, enxugadas e levadas ao forno quando a temperatura se estabilizou em 60�C. Deixei-as l� por 11 horas, virando-as no meio do tempo para secarem uniformemente. De amarela, a cor mudou para um alaranjado, transl�cido e com brilho. Ainda secam, penduradas na cozinha, dentro de um saco de tecido fino, de escorrer coalhada. Anteontem, a primeira foi aberta. N�o ficou salgada e, apesar de seca, tinha uma textura agrad�vel, macia. D� para fazer bottarga em casa? D�. Com R$ 40, produzi 500 g. Se v�o durar at� a pr�xima "safra" de tainha? Duvido muito...
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