Ricardo Melo

Jornalista e apresentador do programa 'Contraponto' na rádio Trianon de São Paulo (AM 740), foi presidente da EBC (Empresa Brasil de Comunicação).

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Ricardo Melo

Os seis patetas

'Presidenciáveis' e oposição só pensam naquilo, e país que se lixe

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Seria incrível, não fosse tão degradante, ver o estágio a que desceu a chamada classe política brasileira e seus fiadores. Infelizmente, aqui não há exceções de importância.

O Brasil conta cerca de 4.000 mortes diárias causadas pela pandemia. Responde por 27% das mortes do mundo, num país com 2,7% da população global. A fome, sob o eufemismo “insegurança alimentar”, atinge metade dos brasileiros. Cidades como São Paulo organizam esquemas de emergência para...abrir covas e cemitérios verticais. Usam vans de transporte escolar para carregar caixões.

O martírio se renova a cada dia. Mas “eles só pensam naquilo”. E dá-lhe manifestos e discursos.

Os governadores tucanos João Doria (SP) e Eduardo Leite (RS), também pré-candidatos ao Planalto em 2022
Os governadores tucanos João Doria (SP) e Eduardo Leite (RS), também pré-candidatos ao Planalto em 2022 - Pedro Ladeira - 10.set.2018/Folhapress

Um dos mais calhordas foi o dos seis patetas. Nome aos bois: João Doria (PSDB, governador de SP); Eduardo Leite (PSDB, governador gaúcho); João Amoedo (presidente do Novo); Luiz Mandetta (DEM, ex-ministro da Saúde); Luciano Huck (???); Ciro Gomes (PDT).

Com estardalhaço e o cinismo habituais, suas excelências lançaram um “manifesto pela consciência democrática”. A pretexto de se distanciar do desastre, escreveram um texto em que não citam, em nenhum momento, o responsável de plantão pela demolição das liberdades, das conquistas sociais, da soberania –ele mesmo, Jair Bolsonaro.

Cinco dos signatários escondem que apoiaram ou se valeram do apoio do capitão expelido do Exército para exercer os cargos que ocupam. “Bolsodoria”, ministro do governo, alavanca em Minas Gerais, apresentador “global” —há lugar pra todo mundo que quiser travar o progresso do Brasil.

Destaque para o sexto, Ciro Gomes, um caudilho arrivista. Histriônico no linguajar, arrepiou carreira quando se tratou de impedir a vitória do miliciano chefe. Fugiu para Paris. De volta, quer dar lições de moral e ética. Provoca risadas, e nada além disso, quando quer disputar um lugar de oposição ao Jair Bolsonaro que ele ajudou a eleger.

Ciro passou por seis legendas pelo menos. Jamais conseguiu construir uma base de apoio. Seu “amigo do peito” é Tasso Jereissati, cardeal tucano da mesma cepa. Chega a ser ridículo vê-lo querer enfrentar Lula, líder do maior partido político do país. Quantas garrafas ele tem pra oferecer? Só se forem as de Coca-Colas que Jereissatti engarrafa a preço de banana no Nordeste.

Embora mais vistoso, o manifesto de não se sabe quantos empresários, economistas, colunistas, intelectualóides divulgado na mesma época navega no mesmo esgoto.

Passando uma peneira nos que o assinam, vai se perceber que boa parte apoiou Bolsonaro (cujo nome também não aparece no documento) e agora se manifesta inconformada com a dissolução do país.

Posar agora de estrangeiros desinformados em textos copiosos só convence aos reféns das redes Globo da vida e seus sucedâneos impressos e eletrônicos.

Como assim? Bolsonaro nunca escondeu seus instintos em 30 anos de baldeação no Parlamento. Na campanha em que escapuliu dos debates após uma facada mal explicada, sempre deixou claro que queria transformar o Brasil em capitania hereditária de sua turma a bordo do capital estufado e da mídia obediente.

Ah, e o PT? O PT não está bem na foto. Pelo contrário: está bem mal. A volta de Lula ao cenário político obviamente reacendeu uma chama no partido e remexeu o xadrez político. Mas o discurso dos dirigentes aponta no mesmo sentido: garantir uma candidatura em 2022. E até lá?

Pesquisas sucessivas mostram que as maiores vítimas do arrastão da pandemia são os mais pobres. Em São Paulo, a proporção chega a 80%. Com o novo auxílio emergencial de ínfimos R$ 250 mensais na média, a miséria vai se disseminar ainda mais. Daqui a 2022, será mais do que ano e meio de milhares de mortes diárias.

O Partido dos Trabalhadores, a oposição, não tem nada com isso? Pra que serve ter maioria na Câmara? Isso vale tanto para o PT quanto para os "presidenciáveis" boquirrotos que comandam importante fatia do tal centrão.

A saída imediata de Bolsonaro e sua quadrilha é a tarefa número um. Para ontem. Há mais de cem pedidos de impeachment engavetados no Congresso. A interdição também é possível.

Tenho pra mim que Bolsonaro já engavetou projeto de reeleição. Sua maior preocupação é a cadeia. As mudanças na cúpula das Forças Armadas e da Polícia Federal não passam de um esquema de blindagem contra a montanha de provas de estelionato, roubalheira e fraude dele e de sua famiglia.

O resto que se dane. Saúde sem dinheiro, vacinas a perder de vista, censo cancelado, educação às favas, economia à deriva, fome invadindo as calçadas.

Quantos mortos mais serão necessários para ejetar este miliciano imediatamente?

PS: no artigo anterior, troquei o nome de Auro Moura Andrade pelo de Ranieri Mazzilli. Peço desculpas. Foi um erro de cepa, não de vírus. Ambos sempre foram caudatários do autoritarismo ditatorial.

PS2: no mesmo dia em que o Brasil ultrapassou mais de 4.000 mortes, Araraquara (SP) não registrou nenhum óbito pela segunda vez. Reportagens assinalaram o fato, menos que o prefeito da cidade (mais de 240 mil habitantes) que impôs o lockdown saneador e tem salvado centenas de vidas é Edinho Silva, do PT.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.