Pelo visto vamos acabar criando uma subeditoria exclusivamente dedicada aos ETs nesta coluna, o que não me alegra nem um pouco, mas é a vida. Acho muito difícil que você tenha passado por esta semana sem ao menos esbarrar com a foto de um suposto alienígena mumificado, que o ufólogo mexicano José Jaime Maussan andou apresentando aos congressistas de seu país.
Diz Maussan que os restos mortais da criatura teriam sido achados no Peru; que ela teria morrido há cerca de mil anos; e que boa parte de seu DNA teria uma origem "desconhecida".
Nada disso faz o menor sentido, outras supostas "descobertas" de Maussan já foram derrubadas diversas vezes antes e não há razão nenhuma para achar que o destino da nova múmia será diferente. Tentemos, porém transformar esse portentoso limão mexicano-andino em uma limonada. Acontece que tem um jeito relativamente fácil de saber que um suposto ET defunto não é ET coisa nenhuma só de olhar para os ossos dele.
Para tornar as coisas mais interessantes, vamos deixar de lado o grande bode na sala: o fato de que o alienígena apresentado no México tem exatamente a carinha que se espera de todo ET ficcional desde o homônimo que popularizou a sigla —aquele do Spielberg, o de 1982. (Isso deveria bastar para acender todas as luzinhas do seu detector de bobagens intracraniano: por que cargas d’água Hollywood seria capaz de acertar a morfologia de um alien de verdade? Mas sigamos.)
Quem rejeita a lógica do parágrafo acima costuma jogar com a carta da "evolução convergente". OK, diz esse raciocínio, pode parecer estranho que um ser que evoluiu num sistema planetário totalmente diferente seja basicamente um ser humano baixinho e cabeçudo em sua estrutura corporal.
Mas veja bem, aqui mesmo na Terra temos vários exemplos de criaturas que surgiram a partir de linhagens evolutivas totalmente separadas e chegaram a soluções anatômicas bastante parecidas. Basta colocar lado a lado golfinhos e ictiossauros (répteis aquáticos da era dos Dinossauros que, vale frisar, não eram dinos), ou morcegos e pterossauros (répteis voadores de asas membranosas do mesmo período que também não eram dinossauros). Algo assim não poderia favorecer a evolução múltipla de "humanoides" Cosmos afora?
A resposta curta é "não sabemos, mas parece improvável". Ainda que a gente dê esse grande benefício da dúvida à ideia, porém, existe algo que a evolução convergente deixa muito claro. As supostas soluções "idênticas" dadas por organismos sem parentesco próximo aos desafios da evolução na verdade são só superficialmente iguais. O diabo mora nos detalhes.
Ictiossauros, por exemplo, revelam sua origem reptiliana pelo fato de que suas nadadeiras caudais estavam orientadas na vertical. Nadavam, portanto, batendo-as lateralmente, feito peixes. Já golfinhos (e baleias) têm nadadeiras caudais na horizontal e as movimentam de cima para baixo, como as minhas e as suas pernas quando caminhamos —em ambos os casos, estamos falando do que são, essencialmente, patas de mamíferos.
Os morcegos têm asas membranosas que se apoiam em versões muito alongadas de quase todos os dedos das patas dianteiras dos bichos. Já os membros alados dos pterossauros dependiam apenas do alongamento do quarto dedo das patas da frente.
E é claro que há muitos outros detalhes aí. Existe algum sinal, no ET andino-mexicano, de que um caminho paralelo típico da evolução convergente de fato foi seguido para construir naturalmente aquele esqueletinho mequetrefe? É claro que não.
Repito a máxima do meu outro texto recente sobre o tema: sim, vamos manter a cabeça aberta. Desde que não haja o risco de o cérebro cair para fora.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.