Há bastante tempo, ninguém mais pode se dizer desavisado, apanhado de calças curtas em um território envolto em sombras. Do batedor de carimbos até o mais alto lustra-botas, seja no palácio, seja em qualquer outro lugar, inclusive na imprensa, todos já sabem muito bem a quem servem e o que tudo isso representa.
Resta-nos perguntar: mesmo que não sejam nem de longe inocentes, como reagirão, no caso de demissão de Luiz Henrique Mandetta, aqueles do governo que ainda tentam vender um verniz de sensatez e seriedade?
É certo que, sob uma lupa rigorosa, o ministro da Saúde pode não ter tido um desempenho tão bom assim. Mas o simples fato de não agir como um paspalhão —a exemplo do colega de Esplanada que "cuida" da Educação— o torna quase um Oswaldo Cruz dos dias atuais.
No mês passado, esta Folha ponderou, em editorial, que o melhor a fazer na ocasião seria deixar Bolsonaro isolado, falando e fazendo asneiras sozinho, enquanto os capacitados lidavam com o novo coronavírus. Mas o presidente quer retomar o leme do seu navio-fantasma.
Nesta segunda-feira (6), noticiou-se que Mandetta seria, enfim, demitido. A simples ameaça gerou panelaços e mobilização de servidores em frente ao ministério.
De acordo com o Datafolha, uma robusta maioria popular aprova o trabalho do ministro e o isolamento social defendido pela pasta e pela quase totalidade da ciência e das lideranças mundiais.
Por temor da reação popular ou pressão de auxiliares, até o início da noite não havia confirmação de que Bolsonaro tenha tido peito para escantear o subordinado. O que se sabe é que esse Salomão dos trópicos conseguiu criar para si uma escolha de Sofia: ou mantém Mandetta e passa o recibo de sua completa desmoralização e perda de autoridade ou o demite —e põe sobre suas costas e nas dos apoiadores todo o peso da responsabilidade de tratar a vida e morte de milhões de pessoas com base em achismo de botequim.
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