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Rep�rter especial da Folha, foi correspondente nos EUA e escreve sobre pol�tica e economia internacional. Escreve �s sextas-feiras.
Mar� est� virando, afirma economista transg�nero sobre aceita��o social
Tive o privil�gio de entrevistar a economista americana Deirdre McCloskey, 75, na quarta-feira de manh�. Um dos primeiros assuntos que Deirdre levantou foi a elei��o de de Danica Roem para a Assembleia Legislativa do Estado americano da Virg�nia.
Danica derrotou um candidato que se chamava de "o maior homof�bico da Virginia" e apresentou leis proibindo pessoas transg�nero de usarem o banheiro relativo ao g�nero com que se identificam.
Jorge Araujo/Folhapress | ||
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A economista americana Deirdre McCloskey, da Escola de Chicago, em entrevista � Folha |
Deirdre disse que estava emocionada. "Foi uma vit�ria contra o populismo alimentado pelo �dio", disse. "Isso nunca teria acontecido na minha �poca."
Os Pecados Secretos da Economia |
Deirdre Mccloskey |
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Respeitada economista libert�ria que se doutorou pela Universidade Harvard e deu aula por 12 anos na Universidade de Chicago, Deirdre mudou de g�nero em 1995. Chamava-se Donald, era casado h� 30 anos e tinha 2 filhos.
Autora de 16 livros e mais de 300 artigos acad�micos, � reconhecida por suas posi��es pr�-mercado, bastante identificadas com a Escola de Chicago, mas tamb�m por seu ativismo na defesa de pessoas transg�nero.
Ela deu uma palestra no ciclo Fronteiras do Pensamento, nesta quarta-feira (8), e lan�ou o livro "Os pecados secretos da economia", pela Ubu Editora. Abaixo a �ntegra da entrevista:
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Como a senhora v� a pol�tica econ�mica do presidente Donald Trump —ao mesmo tempo em que ele quer eliminar regulamenta��es, algo que os livre-mercadistas defendem, ele vem impondo medidas protecionistas...
Deirdre McCloskey - � um desastre. Ele � um populista, como [o l�der russo, Vladimir] Putin, [o mandat�rio turco, Recep Tayyip] Erdogan e [o primeiro-ministro h�ngaro, Viktor] Orban.
Ele herdou desemprego baixo e crescimento de seu antecessor, Barack Obama. N�o fez nada de bom at� agora, o mercado continua subindo porque se pauta pelo futuro, pelas expectativas, e tem a esperan�a de que Trump vai eliminar muitas regulamenta��es que prejudicam as empresas.
Mas, de fato, ele vem eliminando regulamenta��es da era Obama que eram consideradas excessivas, n�o?
Ele tem se focado nas regulamenta��es ambientais e beneficiado a ind�stria do carv�o. Eu n�o acho isso inteligente. Dever�amos ter um imposto sobre emiss�es. O bom � que os EUA t�m um longo hist�rico de democracia, que n�o se restringe � presid�ncia.
Na Virg�nia, por exemplo, onde uma mulher transg�nero acaba de se eleger. Isso � maravilhoso, fiquei emocionada. Foi uma vit�ria contra o populismo alimentado pelo �dio. Ele [o oponente] ficava dizendo n�o votem porque ela � trans, e as pessoas n�o estavam nem a�, votaram porque ela prop�s consertar a Rota 28 [estrada na regi�o].
Seria poss�vel eleger uma mulher transg�nero em 1995, ano em que a senhora mudou de g�nero?
Isso nunca teria acontecido na minha �poca. Na verdade, houve uma mulher transg�nero eleita nos anos 90, mas ningu�m sabia que ela era trans. (Althea Garrison se elegeu em 1992 para a Assembleia de Massachusetts, mas n�o revelou que era transg�nero; um rep�rter de um jornal conservador a 'tirou do arm�rio' em uma reportagem no mesmo ano).
Mas a mar� est� virando. Os americanos est�o evoluindo muito nas quest�es sociais. Casamento gay era inconceb�vel 20 anos atr�s. Obviamente, h� as pessoas Taleban, os EUA s�o como um croissant, v�rias camadas diferentes. Algumas pessoas vivem na Oklahoma dos anos 50, outras vivem em Massachusetts de 2030.
Paul J. Richards - 26.jul.2017/AFP | ||
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Manifestantes protestam contra proibi��o de transg�neros nas For�as Armadas americanas em julho |
A senhora diz que a mar� est� virando, mas Trump reduziu prote��es para pessoas transg�nero (em agosto, anunciou que iria retomar a proibi��o de pessoas abertamente transg�nero servirem nas For�as Armadas)...
Trump � um oportunista, n�o est� nem a� se algu�m � transg�nero, s� quer agradar sua base de malucos no Oklahoma. E os militares desconversaram —disseram sim, presidente, vamos trabalhar nisso, e n�o t�m nenhuma pressa.
Mas a Suprema Corte vai examinar uma a��o que pode permitir a pessoas negarem servi�os por motivos religiosos, como um dono de estabelecimento que se recusou a fazer um bolo para um casamento gay......
Em rela��o � decis�o da Suprema Corte, n�o vejo nenhum problema. Se o confeiteiro se recusar a fazer o bolo do casamento gay, o cliente simplesmente vai no confeiteiro do lado.
� o livre mercado, v�rias empresas oferecem o servi�o. Agora, se o Estado nega prote��o a voc� a� � um problema, porque trata-se de um monop�lio, s� o Estado pode fazer isso, n�o h� op��es.
A senhora enfrentou preconceito por ser transg�nero?
N�o tenho como saber isso. Se uma pessoa chega para voc� e diz —e a�, seu "viado", � f�cil dizer que � preconceito. Mas se eu n�o consigo um cargo na Universidade Stanford porque uma pessoa se op�s, e essa pessoa tinha preconceito, apesar de n�o dizer, � imposs�vel saber.
� o problema enfrentado pelas mulheres, o telhado de vidro, � de vidro porque n�o conseguimos ver esse preconceito. Se um homem belisca seu traseiro, est� claro que foi um degradante para a mulher.
Mas se for mais sutil, n�o d� para saber. Quando mudei de g�nero, achei que ia perder um emprego e arruinar minha carreira. Isso n�o aconteceu. Mas n�o pensei que ia perder minha fam�lia para sempre.
A senhora nunca mais falou com eles?
Eu falei, mas eles n�o responderam. Tenho tr�s netos que nunca vi. J� chorei muito por causa disso. Gostaria que minha mulher tivesse escolhido o caminho do amor e continu�ssemos casados.
A senhora gostaria de continuar casada com ela?
Sim, Joanne � o amor da minha vida. Fui casada por 30 anos com ela e ainda a amo. A prop�sito, a transi��o n�o est� relacionada a sexo. Eu n�o tive nenhuma rela��o sexual desde que mudei de g�nero. Zero.
Sou assexuada, nesse sentido a opera��o [de mudan�a de sexo] n�o foi inteiramente bem sucedida. Mas isso n�o � um problema. Homens pensam sobre sexo a cada dez segundos. Mulheres pensam em amor. Eu penso em amor, afei��o, conex�o.
A senhora voltou a falar com sua irm�, que tentou intern�-la em cl�nicas psiqui�tricas quatro vezes por sua decis�o de mudar de g�nero?
Sim. Levou alguns anos, mas hoje n�s conversamos. Ela � bipolar e est� em tratamento. Ela achava que estava me salvando, pensava que eu tinha ficado louca.
Como a senhora acha que a desigualdade de renda deve ser combatida?
O que deve ser feito � garantir renda m�nima, algo que eu e voc� vamos pagar atrav�s de nossos impostos. O que n�o deve ser feito � estabelecer (e valorizar) o sal�rio m�nimo, que basicamente nos exime de responsabilidade e for�a os empregadores a pagar mais.
Isso s� aumenta o desemprego entre as pessoas mais pobres, mais jovens e menos qualificadas. Qualquer tipo de prote��o ao emprego, inclusive para pessoas transg�nero, � um desastre.
N�o tenho obje��o a garantir uma renda m�nima. Sou crist�, acho que eu e voc� temos obriga��o de ajudar os mais pobres. Embora, obviamente, isso possa levar algumas pessoas a escolher uma vida de �cio.
De qualquer jeito, � impratic�vel financeiramente assegurar renda para todo mundo, a n�o ser que voc� corte todos os subs�dios e prote��es que o Estado d�.
A desigualdade � o maior problema da atualidade?
M� distribui��o de renda n�o � importante. Fiz uma resenha de 50 p�ginas do livro do Piketty (O capital no s�culo XXI, de Thomas Piketty ). � um livro s�rio de um homem s�rio, mas ele est� equivocado e a ci�ncia est� errada. Por exemplo, ele ignora o capital humano. A maior parte da renda vem do capital humano, capital f�sico n�o � tudo.
Mas � fato que se tornou consenso dizer que a desigualdade � o maior mal do mundo...
Isso � uma besteira completa. O maior mal do mundo s�o a pobreza e a tirania, que est�o interligados. Sociedades livres crescem e prosperam. Sociedades tir�nicas n�o, com poucas exce��es, como Cingapura. Pessoas vivendo com US$ 2 por dia, esse � o maior problema, n�o a concentra��o de renda.
As pessoas recebem o quanto outras pessoas acham que elas valem. Se voc� � uma estrela do basquete, um artista famoso, voc� vai ganhar muito. Pode ser um menino negro, pobre, que saiu do Bronx e se tornou um jogador de futebol bem sucedido, ganhando US$ 6 milh�es por ano. N�o vejo problema nisso.
Desde que eles recebam o que outras pessoas acham que eles valem, esse � o incentivo certo para atrair pessoas para a medicina, o empreendedorismo...
Mas existe uma percep��o de que as pessoas deveriam compartilhar sua riqueza...
Claro, e � por isso que eu n�o gosto da Liliane Bettencourt (bilion�ria francesa, herdeira da L'Oreal). Ela criou um fundo filantr�pico com apenas metade de 1% da sua riqueza. Isso � um fundo de rela��es p�blicas, � filantropia do Trump. Andrew Carnegie, por exemplo, doou toda sua riqueza. Ele podia ter deixado seus parentes na Esc�cia milion�rios at� a sexta gera��o, mas preferiu fazer filantropia.
A senhora se define uma libert�ria crista e, como tal, o que acha de prote��es do estado para minorias como as pessoas transg�nero?
Acho que igualdade de direitos � o objetivo correto, mas intervir em negocia��o salarial para garantir igualdade � um erro. E sou contra cotas e prote��es para minorias, acho que isso cria o tipo de rea��o que levou ao Trump.
Minha ideia de universidade � a de Chicago, onde eu lecionei por 12 anos. L�, voc� entra se for inteligente. N�o existe esse sistema p�ssimo de Harvard e Yale, onde o que conta � ter ex-alunos na fam�lia, ser atleta ou ter um pai que vai construir um pr�dio para a universidade.
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