Jornalista, assina coluna com informa��es sobre diversas �reas, entre elas, pol�tica, moda e coluna social. Est� na Folha desde abril de 1999. Escreve diariamente.
Cinquent�o, Marcelo D2 diz que seu maior desejo agora � "n�o morrer"
Uma fuma�a perfuma a sala de estar de Marcelo D2 em um in�cio de tarde. Poderia ser de maconha: o cantor de rap � usu�rio declarado e defende a legaliza��o da planta desde 1995, quando ficou conhecido como vocalista do Planet Hemp (literalmente, Planeta Maconha). Mas o cheiro no ar � de incenso.
*
D2 tamb�m � outro. Desde ent�o, lan�ou nove �lbuns de est�dio, seis em carreira solo. Ganhou vinte anos a mais de idade. Tinha um filho. Agora tem quatro. Al�m de Stephan, 24, que tamb�m � rapper, � pai de Lourdes, 17, Luca, 15, e Maria Joana, 13. "Minha ca�ula t� com 13, cara. T� foda", diz, aos risos, ao rep�rter Jo�o Carneiro. O cantor completa 50 anos em novembro.
*
"Quando meus filhos ficam me sacaneando, dizendo 'Porra, tu t� velho!', eu falo que eu sou � jovem h� mais tempo. Porque eu me sinto novo, t� ligado?". Mas o marco de meio s�culo tem feito D2 "pensar sobre a vida pra caralho". Por isso, o �lbum "Amar � para os Fortes", previsto para o segundo semestre, demorou mais. Sair� quatro anos depois do �ltimo -o dobro da m�dia na carreira.
*
Para o novo projeto, D2 se cercou de jovens. Um deles � o fot�grafo Wilmore Oliveira, 28, que dividir� com o cantor a dire��o de um curta-metragem do disco, todo filmado no celular. As m�sicas, juntas, formar�o o �udio do filme. A dupla vem a S�o Paulo no domingo (30) para falar sobre a parceria durante o Music Video Festival, no MIS.
*
"Eu acho que hoje em dia as pessoas veem a m�sica muito mais do que ouvem(interrompendo) Pera�, deixa eu tirar isso daqui, t� me dando alergia." Depois de apagar o incenso e coloc�-lo do outro lado da sala, D2 retoma: "As pessoas veem m�sica no YouTube, no telefone. Mas o ato de ouvir o �lbum completo t� se perdendo muito".
*
Ele resiste a disponibilizar os seus discos solo nas plataformas de streaming -s� os dois �ltimos est�o no Spotify. � que D2 n�o aceita as condi��es propostas pela gravadora para colocar as m�sicas no servi�o. "Pra que eu quero meus discos l� se eu n�o ganho nada? S� pra todo mundo ouvir? Quem quer ouvir d� um jeito, baixa pirata."
*
"Nos anos 1990, os diretores art�sticos mandavam nas gravadoras. A gente discutia sobre arte pra fazer um disco. Nos anos 2000, o marketing assumiu. A� [a discuss�o] era quem fazia a melhor capa pra vender. Depois que as gravadoras foram acabando, o jur�dico assumiu. A�, fudeu."
*
Tamb�m n�o gosta de ficar restrito a uma s� forma de express�o. "Rap n�o � a coisa mais importante da minha vida, � s� uma parte. Eu fa�o rap, eu fa�o arroz, eu fa�o caf� da manh�", diz. Para o trabalho "Amar � para os Fortes", fez curso de roteirista e criou o coletivo Mulato, que inclui, al�m de Wilmore, outros fot�grafos e artistas pl�sticos.
*
"A maioria [das obras] aqui s�o de amigos meus", afirma ao mostrar a cole��o de arte que preenche quase todas as paredes da casa. "Tirando o Picasso, n�?". Quando o rep�rter mostra incredulidade, D2 aponta para um pequeno desenho emoldurado e explica: "Comprei num leil�o, na internet. � um estudo dele, tem 120 c�pias iguais. Um dos melhores dinheiros que j� gastei".
*
O ar muda quando Wilmore termina de apertar o baseado que preparava durante a conversa, sob encomenda de D2. O cantor se surpreende quando v� que o amigo usa, em vez de um isqueiro, um ma�arico de cozinha para acender o cigarro. "Caralho, mano! Vai tacar fogo na casa!"
*
"� porque eu trouxe um 'dab', que � um �leo de THC que tem que esquentar com isso", explica Wilmore. "Voc� fuma essa porra e fica o resto do dia no sof���", completa D2, prolongando o "�" e se esparramando na poltrona.
*
"Legalizar n�o � liberar geral. N�o deveria ser assim nem com �lcool, sabe qual �? Tu v� gente bebendo em qualquer lugar. Devia ser mais controlado." E conta que tem evitado beber porque n�o tem uma boa rela��o com o �lcool, "que tamb�m � droga".
*
"As m�sicas do Planet Hemp n�o eram s� sobre maconha". A ideia, diz, era "puxar o limite da liberdade de express�o, que naquela �poca era t�o questionada." Os integrantes da banda chegaram a ser presos por apologia �s drogas, em 1997.
*
A forma��o do grupo vai ser narrada no filme "Legalize J�", de Johnny Ara�jo e Gustavo Bonaf�. O longa, produzido pela Academia de Filmes e previsto para o segundo semestre, foca a rela��o de D2 com Skunk, com quem fundou a banda. "Ele botou o sonho dele [de ser m�sico] no meu colo e eu falei: 'Vou sonhar isso a�'". Skunk morreu em 1994, v�tima da Aids, antes do lan�amento do primeiro disco.
*
Lourdes, filha de D2, irrompe pela porta da frente: "Pai, olha isso! S�o 200 quest�es. Pras f�rias!", exclama, levando uma apostila at� o cantor. Ele folheia o calhama�o e avalia: "T� f�cil. J� tem nota?". "Tem, mas eu n�o vou te falar", responde Lourdes, que logo sobe para o quarto. "Tenho que estudar."
*
N�o interfere na rela��o dos filhos com as drogas, "desde que [o uso] seja saud�vel. N�o sou eu que vou falar pra usar ou n�o usar. Tenho o papel de pai, de aconselhar. [Fumar maconha] faz parte da descoberta. Como pai, n�o participar disso seria uma falha."
*
O cantor deixa escapar um bocejo. Da cozinha, algu�m oferece caf�. Wilmore, o rep�rter e o fot�grafo aceitam. D2 agradece. "Tr�s, por favor!"
*
O assunto volta a ser a passagem do tempo. "Voc� vai envelhecendo e fica um pouco mais sensato, mais tolerante. Tem coisas que eu achava intoler�veis e que hoje eu entendo. Eu entendo que o mundo � assim, t� ligado?
*
Revela o maior desejo para os pr�ximos 50 anos: n�o morrer. E enumera, rindo, as tr�s "regras do rol�": "N�o se apaixone; n�o seja preso; n�o morra". Pouco depois, outro aroma forte preenche o ar da sala. Dessa vez, � s� o caf�.
Livraria da Folha
- Cole��o "Cinema Policial" re�ne quatro filmes de grandes diretores
- Soci�logo discute transforma��es do s�culo 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD re�ne dupla de cl�ssicos de Andrei Tark�vski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade