Saltar para o conte�do principal

Publicidade

Publicidade

 
 

marion strecker

 

26/07/2012 - 03h00

Desculpas para reca�das

Os dependentes em tecnologia t�m sempre mil desculpas para defender o v�cio. Falo por experi�ncia. Quando a gente fica cansado de olhares de censura, usa aparelho escondido ou procura outros dependentes para conviver sem repress�o.

Os profissionais v�o dizer que precisam ficar noite e dia dispon�veis. Hoje em dia, pega bem se intitular workaholic (viciado em trabalho) ou contar como vive com t�o poucas horas de sono e tantas doses de caf�. Ser� que algu�m fica mais inteligente ou criativo assim? Duvido. Cafe�na � sabidamente um alcaloide que causa depend�ncia. Quem precisa tomar caf� para raciocinar est� apenas provando sua depend�ncia.

Mas voltemos � tecnologia. M�es e pais v�o dizer que n�o desgrudam do celular para receber liga��es dos filhos, mesmo quando estes est�o ocupados na escola. Filhos v�o dizer que precisam falar com os pais, mesmo os que costumam ficar "sem bateria" ou "fora da �rea de alcance" justo quando s�o procurados.

A grande maioria dos dependentes elogia todos os benef�cios da vida on-line: fazer muitas coisas ao mesmo tempo, reduzir dist�ncias, ter acesso a mais informa��es, descobrir coisas novas, fazer mais contatos, expor-se para o mundo. Tudo isso � poss�vel. Mas, na vida real, quando a pessoa se torna um dependente, isso tudo se torna praticamente imposs�vel. Ao menos � essa a minha experi�ncia.

Checar e rechecar a cada minuto e-mails, not�cias e redes sociais pode ser algo angustiante e improdutivo. Vejo milhares de pessoas on-line, mas pouqu�ssimas pessoalmente. Tenho acesso � informa��o de toda a internet mundial, mas frequentemente n�o sei nem por onde come�ar, de tanta bobagem que me rouba o tempo. Posso me expressar livremente, mas sou obrigada a me deparar com coment�rios preconceituosos, mal informados e mal escritos de pessoas que nem conhe�o.

O lado B da internet � imenso. Mas qual � a linha que separa o uso produtivo, divertido, enriquecedor da pura depend�ncia, improdutiva, que traz sofrimento?

O Facebook, por exemplo, al�m de ser o maior ladr�o de tempo na internet do mundo --que o digam as empresas--, � um campo f�rtil, por�m minado, para o amor. Todo mundo dispon�vel ali, � dist�ncia de um clique. Um momento de solid�o e qualquer coisa pode acontecer.

Uma amiga desapareceu do Facebook e acaba de voltar. Perguntei o que houve. Ela contou que o marido � muito ciumento e que o Facebook p�s o casamento em crise. Respondi que ci�me e Facebook s�o incompat�veis.

Ponha-se na pele do marido, lendo os galanteios que ela deve receber. H� casais que deixam senhas abertas, para mostrar que n�o fazem nada errado. Essa amiga disse que, desta vez, fez um pacto de voltarem ao Facebook com a condi��o de n�o fu�arem nas coisas do outro, nem mencionarem com quem andam falando. Ela se pergunta se vai dar certo. N�o quis desanim�-la, ent�o me calei.

O problema em ficar distra�do ou simplesmente entretido na internet � a perda de tempo e a dificuldade de se aprofundar. O problema das mensagens curtas e r�pidas � que nos consomem um tempo enorme e raramente s�o profundas. O problema do excesso de informa��o � nossa dificuldade em selecionar, processar e reter o que importa.

Quem se preocupa com o futuro dos adolescentes hiperconectados de hoje teme a hip�tese de que eles possam deixar de desenvolver capacidade de pensar com profundidade e possam perder o traquejo social na vida real, al�m de ficarem dependentes das funcionalidades de seus eletr�nicos.

Quem n�o se preocupa com isso... bem ou n�o tem filhos ou acredita na capacidade de o c�rebro aprender a alternar tarefas profissionais e pessoais com rapidez e principalmente efic�cia. Defende que a sociedade vai ficar cada vez mais culta, pois ter� oportunidade de fazer pesquisas mais amplas e profundas, aproveitando a chamada "intelig�ncia coletiva" da internet, ou seja, a colabora��o.

Por dever de consci�ncia, �s vezes confiscamos os eletr�nicos da adolescente aqui em casa.

marion strecker

Marion Strecker � jornalista e cofundadora do UOL. Come�ou sua carreira como professora de m�sica e coeditora da revista Arte em S�o Paulo. � formada em comunica��o social pela PUC-SP. Trabalhou na Reda��o da Folha entre 1984 e 1996, onde foi redatora, cr�tica de arte, editora da 'Ilustrada', editora de suplementos, coordenadora de planejamento, coordenadora de reportagens especiais, rep�rter especial, diretora do Banco de Dados, diretora da Ag�ncia Folha e coautora do Manual da Reda��o. � colunista da Folha desde 2010. Pioneira na internet no Brasil, liderou a equipe que criou a FolhaWeb em julho de 1995 e foi diretora de conte�do do UOL de 1996 a 2011. Viveu em San Francisco, Calif�rnia, de julho de 2011 a julho de 2012, atuando como correspondente do portal. Mudou-se para Nova York, onde come�ou a escrever um livro sobre internet, previsto para sair pela Editora Record. Atualmente vive em S�o Paulo.

 

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da p�gina