Em 2009, Brasil, Rússia, Índia e China se reuniram para transformar em realidade o acrônimo criado oito anos antes pelo economista britânico Jim O’Neill quando se pôs a tratar da ascensão econômica dos quatro países que pareciam irromper com tudo na cena internacional. Em 2010, a África do Sul, ao se incorporar ao grupo, acrescentou o S à sigla que os identifica.
Os prognósticos sobre o destino do Brics nunca foram lá muito otimistas. Os especialistas não viam futuro para um bloco de nações separadas por continentes e tradições culturais, com escasso intercâmbio diplomático e sistemas políticos diferentes. Mas o grupo se institucionalizou, criou um banco, vitaminou seu intercâmbio comercial e adotou posições convergentes na ONU, como mostraram os cientistas políticos europeus Martin Binder e Autumn Payton.
Integrar-se ao Brics foi um dos pilares da política externa dos dois primeiros governos do PT. Voltou a ganhar estatura na agenda internacional de Lula 3, para quem a iniciativa é instrumento para uma "governança global mais equilibrada e representativa", como reiterou o presidente brasileiro em recente entrevista ao semanário sul-africano Sunday Times, de Joanesburgo.
Ocorre que hoje em dia são outras as circunstâncias e os desafios para a efetivação desse propósito legítimo. Afinal, desde a criação do bloco, a China, que já então ostentava a mais promissora das economias do grupo, avançou muito à frente dos parceiros. Cresceu a taxas robustas; diversificou sua produção; tornou-se figura de proa no comércio internacional; levou seus investimentos a todos os continentes. A ambição política de Pequim cresceu no mesmo compasso, chancelando sua metamorfose em potência que contesta e disputa com os Estados Unidos a hegemonia no planeta.
Resultado: tornou-se obsoleta a ideia de que o país comandado por Xi Jinping com mão de ferro é apenas o sócio mais abastado de um clube de países intermediários –o que já estaria de bom tamanho. A chamada República Popular tem tudo para ser a dona do pedaço, apta a conduzi-lo em benefício próprio.
Para Alissa Wang, cordenadora do Grupo de Pesquisa sobre Brics da Universidade de Toronto, no Canadá, o básico é saber se está em curso a transformação de um grupo não ocidental em outro antiocidental.
Para persistir no objetivo de chegar uma ordem internacional multipolar e representativa, o Brasil terá que aprender a construir nas relações com a China a mesma autonomia que mantém frente ao grande irmão do norte. O Brics é um dos lugares desse exercício político tão decisivo quanto sutil.
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