Economista, diplomata e cientista social, dirige o BRICLab da Universidade Columbia em NY, onde � professor-adjunto de rela��es internacionais e pol�ticas p�blicas. Escreve �s quartas.
Relat�rio da OMC desnuda acanhamento comercial do Brasil
A Organiza��o Mundial do Com�rcio (OMC) publica nesta semana um relat�rio sobre a pol�tica comercial brasileira.
O documento tra�a an�lise abrangente da participa��o do Brasil no com�rcio global (em que representamos apenas 1% de tudo o que se compra e vende no mundo) e vice-versa —a soma de exporta��es e importa��es afigura t�o somente 25% de nosso PIB, o menor percentual dentre as 15 maiores economias do mundo.
Fernando Donasci - 14.set.2016/Reuters | ||
Cont�ineres no porto de Santos; com�rcio exterior no Brasil equivale a somente 25% do PIB nacional |
Como esperado, o informe disseca, por um lado, um pa�s ainda envolto nas velhas equa��es centro-periferia: um exportador de commodities e importador de bens de maior valor agregado. Por outro, o Brasil � corretamente retratado pela OMC com um sutil eufemismo tecnocr�tico: trata-se de uma "largely domestic-driven economy" (economia amplamente movida pelo mercado interno).
Lembrei-me, ao ler o relat�rio, de um velho dilema dos estrategistas de desenvolvimento econ�mico. Nos anos 1980, por exemplo, discutia-se seriamente se eram as exporta��es que conduziam ao crescimento econ�mico ou o contr�rio. Alinhados � primeira tese, agrupamos China, demais economias de �xito do Sudeste Asi�tico e pa�ses como Espanha ou Chile. � segunda, economias como R�ssia e mais notadamente o Brasil.
Nesse caso, vale lembrar que mesmo em tempos mais recentes a op��o preferencial pelo mercado interno por parte do Brasil foi cantada em prosa e verso como a grande responsável pela maneira quase incólume com que o pa�s teria supostamente passado pela "Grande Recessão" de 2008.
Isso levou muitos, no auge do renascimento nacional-desenvolvimentista dos anos Lula-Dilma, a concluírem que internacionalizar a economia brasileira via com�rcio exterior era um erro. N�o importaria, em tal compreens�o, a pequena ênfase que o Brasil buscou conferir à conquista de mercados externos.
Ora, nada mais errado. A China também atravessou a crise de cabeça erguida —e ostenta parte majorit�ria de seu PIB relacionado ao comércio exterior.
Num efeito xen�fobo indireto de nosso nacionalismo econ�mico, muitos foram levados a acreditar que a baixa participação do Brasil no comércio mundial e do comércio exterior no Brasil é fruto do protecionismo dos países mais ricos. Tal injustiça só poderia ser corrigida mediante negociações do tipo "governo-a-governo" em tabuleiros como as tratativas União Europeia-Mercosul ou a pr�pria OMC.
Sem dúvida, as negociações "governo-a-governo" são muito importantes. Produtos em que o país apresenta claras vantagens competitivas, notadamente no agroneg�cio, beneficiam-se em grande medida de regras mais justas no comércio internacional.
No entanto, há perguntas prévias, ainda mais importantes que o resultado dessas negociações. S�o quest�es que parecem emergir do relat�rio da OMC.
A primeira: ser� que o Brasil quer fazer do comércio exterior sua principal via de inserção na economia global?
A segunda: desejamos que o comércio exterior se torne nossa ferramenta privilegiada para a construção de poupança nacional e portanto de recursos para investir?
Claramente, o Brasil n�o tem respostas para essas perguntas. Se elas fossem positivas, a assimetria do comércio internacional não deveria representar "desculpa paralisante" para nosso esforço de comércio exterior.
Não se pode dizer que t�o somente acordos multilaterais tenham sido responsáveis pela decolagem rumo ao desenvolvimento de qualquer país nos últimos 40 anos.
Coréia do Sul, China e Chile acresceram suas rendas nacionais de maneira dramática sem esperar que "regras justas" fossem precondi��o para o desenho e implementa��o de sua estratégia comercial.
Centrar a estratégia de inserção comercial apenas na busca de um "final feliz" para as negociações pluri ou multilaterais fez o Brasil perder tempo e foco.
O pa�s jamais conseguiu ir al�m de noções simplistas, como a ideia de que "o mercado mundial pode ser interessante para o Brasil se barreiras protecionistas forem eliminadas", por questões como "qual nossa estratégia de promoção comercial mesmo num mundo protecionista?"
As lições da história econômica das últimas décadas ensinam claramente que aqueles países que buscaram a internacionalização tiveram mais êxito do que os atrelados dogmaticamente a seu mercado interno.
N�o estranha ent�o que o exame da OMC ressalte como essenciais desafios para al�m do com�rcio, como as mais do que urgentes reformas trabalhista, previdenciária e tributária. Além disso, porém, há um "quarteto" de prioridades, todas dependentes unicamente do Brasil.
Trata-se da facilita��o da legislação interna para abertura de empresas de vocação exportadora. Colocar ênfase nos aspectos logísticos de projetos a serem contemplados pelas PPPs. Promover formação de recursos humanos especializados, no âmbito do setor privado, para a promoção comercial no exterior e a atração de IEDs (investimentos estrangeiros diretos). E, claro, buscar o fortalecimento da presença das micro e pequenas empresa no com�rcio mediante consórcios exportadores.
Eis os primeiros —e elementares— passos para que o Brasil fa�a melhor figura em relat�rios de an�lise sobre o com�rcio internacional.
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